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Cotidiano

Centro de Detenção Provisória de São Vicente tem nova vítima

É a 18ª morte no equipamento estadual; homem estava na lista dos que deveriam receber assistência médica fora da unidade

Carlos Ratton

Publicado em 18/06/2021 às 07:00

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Defensoria havia avisado sobre falta de assistência e celas insalubres / Divulgação

Enquanto o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJE-SP) aguardava a Direção do Centro de Detenção Provisória (CDP) de São Vicente enviar uma série de informações referentes a situações degradantes dos presos do local e que atentam contra os Direitos Humanos, um preso acometido de tuberculose faleceu no equipamento provisório do Estado em 24 de abril último. A denúncia é da Defensoria Pública do Estado de São Paulo.

É o 18º que morre no equipamento do Governo do Estado, que abriga pessoas que ainda sequer foram julgadas e condenadas. Por questões legais, o nome do preso foi preservado pela Reportagem. O defensor Mateus Moro não se conforma com o ocorrido, pois o homem estava na lista dos que deveriam receber assistência médica fora da unidade prisional, conforme pedido feito pela Defensoria em março, quando o órgão fez uma inspeção na unidade vicentina.

"É inaceitável e bárbaro. Em março, fizemos uma inspeção, detectamos e elencamos vários casos semelhantes. Tem tratamento de tuberculose grátis pelo SUS (Sistema Único de Saúde) e as pessoas não o fazem porque a unidade prisional não providencia. Essa pessoa que morreu estava na lista que enviamos ao Judiciário quando pedimos tratamentos urgentes. Tal morte precisa ser investigada pelo Ministério Público (MP) e pela Polícia Civil para confirmar a negligência", afirma.

Moro atenta para uma realidade social bastante conhecida de muitos brasileiros, principalmente em vulnerabilidade social. "Pessoas pobres, miseráveis e, em sua maioria, negra e sem escolaridade, são tratadas como pessoas matáveis. Isso é triste. Enquanto a gente segue fazendo inspeções que já somam 27 em todo o Estado durante a pandemia, os poderes - Judiciário, Legislativo e Executivo - seguem alheios a essa realidade", finaliza.

SITUAÇÃO.

A situação do CDP vicentino vem sendo acompanhada pelo Diário, que já publicou sete reportagens, sendo a primeira em 11 de abril e a última em 25 de maio último, conferidas no www.diariodolitoral.com.br.

A juíza Luciana Viveiros Corrêa dos Santos Seabra havia solicitado informações à Coordenadoria de Unidades Prisionais da Região do Vale do Paraíba e Litoral (Corevali). À Direção do CDP foi pedido o seguinte: lista das mortes ocorridas este ano, incluindo dois suicídios e os procedimentos de apuração; esclarecimentos sobre controvérsias relacionadas a casos de Covid-19; sobre a comida servida; o eventual racionamento de água; a distribuição de kits de higiene; período de banho de sol; as reformas de celas e banheiros; infestação de pragas e outras questões relacionadas ao ambiente prisional.

À Corevali, a magistrada pediu o número de atendimentos médicos e profissionais que atuam na unidade vicentina; qual a verba destinada à alimentação dos presos; se há verba para reforma de celas e banheiros e previsão de transferência em função da superlotação do local.

CIDH.

Em 13 de maio último, com apoio da Comissão de Assuntos Penitenciários da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São Vicente, um grupo de mulheres realizou, em frente ao Fórum de São Vicente, um ato de protesto sobre a situação dos presos. A OAB Vicentina está corroborando com o trabalho da Defensoria que, recentemente, incluiu o CDP numa lista encaminhada à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).

A intenção da Defensoria é que o órgão da Organização dos Estados Americanos (OEA) reconheça que os direitos dos presos estão sendo desrespeitados em 21 presídios e imponha mudanças urgentes. Em março, no CDP de São Vicente, a Defensoria se deparou com 1.676 presos provisórios da unidade. O CDP vicentino só comporta 842 presos. Ou seja, está 199,04% acima do limite permitido.

Segundo levantado na ocasião, 17 detentos haviam morrido enquanto aguardavam julgamento. Nessa conta macabra, incluiu-se um homicídio e dois suicídios. Foi detectado ainda comida estragada e racionada, falta de medicamentos, de assistência médica, abusos de força e inúmeros outros problemas.

A Defensoria quer que a CIDH realize uma audiência pública temática, que reuniria especialistas de toda a América Latina para discutir o tema. Caso aceite a denúncia e a realização de audiência, os governos paulista e brasileiro terão que dar explicações sobre o que vem ocorrendo.

Toda a situação do CDP vicentino se encontra no relatório final do Núcleo Especializado de Situação Carcerária da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, formado por Moro (coordenador) e as defensoras Amanda Grazielli Cassiano Diaz e Gabriele Estábile Bezerra. O relatório está entre outros 14 enviados conjuntamente à CIDH.

ESTADO.

A Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) informa que todos os óbitos são devidamente apurados, sendo que a grande maioria se deu por causas naturais, tendo os presos recebido a devida assistência de saúde, inclusive com encaminhamento para a rede hospitalar em casos emergenciais. O detento em questão foi atendido pelo médico da unidade e estava em isolamento, seguindo o protocolo para pacientes que testam positivo para tuberculose.

A SAP ainda revela que Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJE-SP) se manifestou, no último dia 10, pelo arquivamento da denúncia formulada pela Defensoria contra o CDP de São Vicente. "A juíza Luciana Seabra diz que a unidade presta o atendimento médico da melhor forma possível e reforça o parecer do Ministério Público, que já havia pedido o arquivamento do caso", afirma a SAP.

Finalizando, garante que o CDP conta com equipe médica completa e, em casos de atendimentos mais complexos, os reeducandos são encaminhados para atendimento externo. A pasta reafirma a oferta adequada de condições de saúde, higiene, alimentação e estrutura em todo o sistema prisional.

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