X

Cultura

Documentário celebra o auge de Pelé, mas também expõe fraquezas do Rei

"Pelé", com pouco menos de duas horas de duração, estreia na plataforma Netflix na próxima terça-feira (23). A produção resgata o auge da carreira do ex-jogador do Santos entre as Copas do Mundo de 1958 e 1970, e é dirigida por David Tryhorn

Folhapress

Publicado em 21/02/2021 às 15:40

Comentar:

Compartilhe:

A-

A+

O documentário é um registro relevante principalmente para as gerações mais novas / Divulgação/Santos FC

Pelé chega a um amplo salão, vazio, onde no centro está posicionada uma única cadeira de madeira. Ele se dirige a ela, senta-se e, uma vez acomodado, despreza o andador que o ajudou a caminhar até ali. Coloca o aparato de lado com um movimento brusco, como se não gostasse de ser visto com ele.

É uma das primeiras imagens de um documentário que, apesar de celebratório, expõe o Rei do Futebol a alguns temas e questões que ele não se acostumou a enfrentar. As dificuldades de locomoção recentes, por exemplo, escancaradas no andador e na cadeira de rodas. E a política, que o acompanhou praticamente por toda a vida, ainda que ele nunca tenha gostado de falar a respeito.

"Pelé", com pouco menos de duas horas de duração, estreia na plataforma de streaming Netflix na próxima terça-feira (23).

A produção, realizada pelo braço audiovisual da agência Pitch International e dirigida por David Tryhorn, resgata o auge da carreira do jogador entre as Copas do Mundo de 1958 e 1970, período que compreende os três primeiros títulos mundiais da seleção brasileira, todos com a presença do Atleta do Século.

O documentário é um registro relevante principalmente para as gerações mais novas, que talvez não tenham assistido ao filme Pelé Eterno (2004), mas hoje, com acesso à Netflix, poderão ver grandes imagens do Rei em campo, todas elas muito bem tratadas -a Copa do Mundo de 1966, inclusive, é exibida a cores.

Diversos ex-companheiros, personalidades do futebol e figuras ilustres de outras áreas concedem depoimento à produção. Entre os jornalistas, Roberto Muylaert, José Trajano, Paulo César Vasconcellos e Juca Kfouri falam sobre a trajetória do Rei. O cantor Gilberto Gil e a deputada Benedita da Silva (PT) retratam o ídolo do futebol como um emblema do Brasil negro. "Ele se transforma no símbolo da emancipação do brasileiro", diz Gil, sobre o significado do craque nas conquistas da seleção a partir do Mundial de 1958.

Mas Paulo Cezar Caju, campeão do mundo ao lado de Pelé em 1970, vai na contramão dos elogios ao simbolismo e pontua que sempre criticou o companheiro por sua falta de posição sobre temas políticos e sociais, como o racismo.

Diretor e produtores tentam tirar de Pelé as impressões pessoais de um personagem que esteve sempre cercado pela política e seus atores. Aparece no documentário o aperto de mão com o general Emílio Garrastazu Médici, presidente do Brasil à época do tricampeonato mundial, quando o país viveu seu período de maior repressão durante a ditadura.

"Com a ditadura, mudou alguma coisa para você?", pergunta o diretor, David Tryhorn.

"Não, o futebol continuou o mesmo. Para mim, pelo menos, não mudou nada", responde Pelé que, mais adiante, é perguntado sobre o conhecimento que tinha dos abusos cometidos pelo governo nos anos de chumbo. "Se eu dissesse que não sabia, estaria mentindo. Mas era difícil saber o que era verdade e o que era mentira."

No processo de pesquisa e entrevistas, Tryhorn admite que sabia da dificuldade de arrancar do Rei do Futebol, entrevistado e biografado inúmeras vezes, algo que ele nunca tenha dito na vida. "Era importante que a gente continuasse insistindo. Ele deveria ter feito algo mais. Poderia ele ter feito mais alguma coisa [na ditadura]?", questiona o diretor.

David Tryhorn considera como um dos trunfos de seu documentário as cenas em que Pelé frequenta um churrasco com seus ex-companheiros de Santos. Simplesmente por se tratar de um momento em que ele não é visto como embaixador ou garoto-propaganda de nada.

De camiseta, Pelé chega ao local de cadeira de rodas. Ao contrário da insatisfação que mostra com o andador no início, esbanja bom-humor com os seus amigos de outrora. Edu, que atuou ao lado do camisa 10 no Santos, brinca: "Vai dar um cavalo de pau", tirando um sorriso de todos, inclusive de Pelé.

Entre uma entrevista e outra, além das imagens de episódios da história do Brasil que se entrelaçam com sua carreira, um vasto material de arquivo leva ao telespectador alguns dos gols mais fantásticos do Rei, até mesmo os marcados em amistosos. Registros que se tornaram motivo de discussão recente em razão dos números alcançados por Lionel Messi e Cristiano Ronaldo nos ditos jogos oficiais.

O documentário não quer deixar margem para dúvidas. Em uma inscrição que surge na tela, aparece o total de gols marcados por ele: 1.283. Mas não é possível ouvir Pelé sobre o tema. A obra não aborda essa questão.

Como forma de promover o material, a Netflix convidou jornalistas para uma entrevista com o Rei, mas ele não se sentiu bem na data acordada. O compromisso foi adiado para o dia seguinte, quando houve novo cancelamento.

Já haviam sido previamente vetadas, pela equipe que gerencia a imagem de Pelé, perguntas sobre a polêmica dos jogos oficiais e também a respeito da morte de Maradona, em novembro do ano passado. Assuntos abordados apenas nas redes sociais do ex-jogador, mas não em entrevistas. 

 

Apoie o Diário do Litoral
A sua ajuda é fundamental para nós do Diário do Litoral. Por meio do seu apoio conseguiremos elaborar mais reportagens investigativas e produzir matérias especiais mais aprofundadas.

O jornalismo independente e investigativo é o alicerce de uma sociedade mais justa. Nós do Diário do Litoral temos esse compromisso com você, leitor, mantendo nossas notícias e plataformas acessíveis a todos de forma gratuita. Acreditamos que todo cidadão tem o direito a informações verdadeiras para se manter atualizado no mundo em que vivemos.

Para o Diário do Litoral continuar esse trabalho vital, contamos com a generosidade daqueles que têm a capacidade de contribuir. Se você puder, ajude-nos com uma doação mensal ou única, a partir de apenas R$ 5. Leva menos de um minuto para você mostrar o seu apoio.

Obrigado por fazer parte do nosso compromisso com o jornalismo verdadeiro.

VEJA TAMBÉM

ÚLTIMAS

São Vicente

São Vicente sofrerá interdições por conta de obras da Sabesp; veja as datas

Agentes de trânsito estarão no local, reforçando a sinalização

EDUCAÇÃO

Rogério vai propor a Lula que Instituto Federal seja no Escolástica

Prefeito tentou transformar espaço em escola cívico-militar durante Governo Bolsonaro, mas proposta não teve êxito

©2024 Diário do Litoral. Todos os Direitos Reservados.

Software

Newsletter