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Sindical e Previdência

Navio Raul Soares - Memórias do Cárcere Flutuante

Humilhação: Sindicalistas foram libertados e presos novamente

Publicado em 30/10/2013 às 11:29

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Uma cena humilhante e histórica que vem sendo contada nos últimos 50 anos, envolveu 16 presos do navio-prisão que foram libertados e no mesmo instante presos outra vez.

O Juiz da 2ª Vara Criminal de Santos, Antônio Ferreira Granda, concedeu habeas-corpus para 16 presos que deixaram o navio por volta das 21 horas de um determinado dia. O advogado dos sindicatos dos portuários, Eraldo Franzese, acompanhava o grupo de sindicalistas presos, todos felizes diante da iminência de serem libertados. Tanto é verdade, que levaram consigo seus pertences.  Foram colocados na sala do então capitão dos Portos, Júlio de Sá Bierrenbach, de quem ouviram a pergunta se alguém tinha queixas contra o tratamento recebido.

Não houve nenhuma resposta, pois a vontade de ir para casa era muito grande. O capitão chamou a imprensa, mandou que os fotografassem e saíssem. Em seguida tornou para os presos: "Quero comunicar que vocês estão soltos e que agora, que estão em liberdade, estou dando nova voz de prisão, pois se saíram do processo da Aeronáutica, ainda não enfrentaram o da Marinha. Estou abrindo novo inquérito". E deu ordem para que os soldados os conduzissem de volta ao navio.

Muitos choraram de tristeza e ódio.

Operação resfriamento - Os presos do Exército, sob ordens do tenente-coronel Sebastião Alvim, eram submetidos a longos períodos de permanência dentro de uma geladeira. O nipônico Tomochi Sumida, absolutamente enfraquecido pelos maus tratos, era internado na geladeira todas as sextas-feiras: de duas em duas horas soldados armados de metralhadoras abriam a porta para que entrasse ar e voltavam a fechá-la.
Ida ao banheiro: sempre um ato de vergonha e humilhação

A ida ao banheiro, segundo relata o autor na página 86 de seu livro, era um ato de vergonha e humilhação para os presos. "Isso foi uma das coisas mais indignas que vi no navio-presídio. O homem, para fazer suas necessidades fisiológicas, era sempre acompanhado por um guarda armado de metralhadora. A porta permanecia aberta e o guarda em pé, no corredor, com sua metralhadora apontada para o preso sentado no vaso sanitário".

O Juiz da 2ª Vara Criminal de Santos, Antônio Ferreira Granda, concedeu habeas-corpus para 16 presos que deixaram o navio por volta das 21 horas de um determinado dia (Foto: Divulgação)

Durante o banho, água era desligada

Em sua obra, Nelson Gatto diz ter conhecido e convivido por pouco tempo com o médico Thomas Maack, e fala dele com admiração por ter suportado tantas adversidades, mesmo sendo professor da USP e médico.

Um dos episódios por ele relatado é referente ao dia em que o médico pediu permissão para tomar um banho fora do horário pré-determinado para isso, pois as celas, devido a umidade dos colchões, cheiravam a mofo e estavam cheios de pulgas e percevejos, e seu corpo coçava bastante e pedia um banho.

Ele menciona em sua obra que houve a autorização, e a exemplo do que já havia ocorrido com outros presos, ele foi conduzido ao banheiro coletivo, imundo e fedorento, num dia que fazia muito frio. Tão logo Thomas Maack se ensaboou, a água gelada, que jorrava de um cano, foi desligada sob a informação que ninguém podia tomar banho sem ordens expressas do tenente Ariovaldo.

Maack teve que voltar para sua cela, com os olhos lampejando de raiva, sob a mira de metralhadoras e com o corpo todo cheio de sabão.

O médico em sua visita a Santos, disse que isto era uma rotina no navio. Os oficiais, tentando ganhar a confiança de alguns presos, recomendavam que esses fossem tratados com consideração e se quisessem tomar um banho, mesmo sob forte vigilância, isso seria permitido. Só que a permissão era exatamente para zombar e humilhar as pessoas, que voltavam para as celas todas cheias de sabão. "Essa era apenas uma das muitas humilhações dentro do navio-prisão", disse o médico.

Sobre outros episódios, com sua participação, narrados no livro, ele diz que não se lembra com exatidão, mas reforça a tese de que as humilhações e atentados contra a dignidade humana era uma rotina, o que fez muitos presos ficarem doentes e outros a terem problemas mentais.

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