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Olhar Filosófico

Arte, artista e artimanha

Quando uma criança apronta, pratica um ato de rebeldia, desconfia e afronta uma ordem, dizemos, muitas vezes, que ela é “arteira”! Pois bem, se por um lado tal adjetivo possa parecer e ter a finalidade de descrever uma visão negativa de arte, por outro, mas paradoxalmente dentro do mesmo sentido, só nos mostra a potencialidade afirmativa da criação artística.

A arte, independentemente de sua linha ou conjunto ideológico de posicionamento, tem, inicialmente, três fatores que me parecem cruciais para a composição de sua existência e reforça a sua importância para a existência humana como um todo: a necessidade de expressão cravada nas células de todo organismo (vivo) humano, a construção de um sentido suportável frente a um mundo e a um universo espantoso e misterioso e, não menos importante, o trabalho ao mesmo tempo lógico, caótico e criativo, sustentado pelo talento, pela matéria e pele espírito do artista.

A arte parece, assim, se fundar na necessidade de mostrar o ser daquilo que somos, podemos e desejamos num silêncio repleto de universo e vice-versa.

A arte cria deus, deuses, monstros e quimeras e os des-cria também. Ela é o mais próximo que temos daquilo que sinalizamos pelo nome de liberdade. A arte é desafio, mudança e assombro, ainda que possa ser fabricada em série e vendida como objeto do mercado para enfeitar paredes de consultórios, cadernos, meias e guarda-chuvas, encher estantes para demonstração de um saber inexistente ou servir como calço para mesa daqueles que se servem de tudo, menos de si mesmos.

A arte des-limita e expande o que a realidade nos nega numa primeira olhada. Ela é fruto do egoísmo necessário que quando efetivado pelas veias do artista vira produção coletiva, numa contradição que dá sentido, produz a des-ordem e nos leva a caminhar de (ou ao) encontro do objeto provocador. Como canta Raul Seixas sobre o seu fazer, “O que eu como a prato pleno/ Bem pode ser o seu veneno/ Mas como vai você saber sem tentaaar? (...) Eu sou ista, eu sou ego/ Eu sou ista, eu sou ego/ Eu sou egoísta, eu sou, eu sou egoísta/ Por que não, por que não?/ Por que não, por que não?”

O artista é fruto do tempo, filho da história presente, mas não se conforma, mas não se confirma no agora, se atira de dentro para fora no além-de-si mesmo.

Claro que não julgo a qualidade da arte, do produto construído ao sacrifício da interpretação, mas, também, não deixo de dizer existem artistas e artistas. Não menores ou maiores, mas risíveis ou notáveis. Embora produzam arte, afinal a matéria artística é em parte palpável e objetiva, uns criam ou aprofundam a mudança de paradigmas, outros reproduzem sons, ruídos, pinceladas e técnicas como quem descasca uma batata ou corta uma cebola, sem inventividade e preso à invasão bárbara da (inexistente) mão invisível do mercado que tudo consome para cuspir em seguida, fingindo ser espírito do tempo.

Platão, em muitas de suas obras, zombou do artista por entendê-lo um falsificador da realidade já um tanto ofuscada e com apenas sombras da verdade acerca a beleza. Já Aristóteles defendeu a arte como o complemento da natureza das coisas, entendendo a estética como uma lógica do belo inerente à visão do talento humano. No século XVIII, o filósofo e poeta alemão Friedrich Schiller, defendeu a arte como o meio de excelência para a educação moral, política e elevação do humano.

Estamos pobres de arte e artistas, não! Mas não deixamos de estar empobrecidos daquele olhar de rebeldia que nos move para o enfrentamento necessário entre gozos e tristezas, tragédias e belezas daquilo que somos quem podemos ser, dos sonhos que podemos ter, como diz Humberto Gessinger.

Na cultura do imediato desejo incorporado nas imagens do aleatório, onde tudo parece ser obra do acaso, você tem fome de quê? Como do Olimpo já nos gritaram os Titãs: “Bebida é água/ Comida é pasto/ Você tem sede de quê?/ Você tem fome de quê?/ A gente não quer só comida/ A gente quer comida, diversão e arte/ A gente não quer só comida/ A gente quer saída para qualquer parte”.

Ainda que arte não seja tudo, tudo não deixa de gritar por arte! Quem tem olhos de ver, veja!

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