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Guarujá

Mães denunciam APAE por maus tratos a crianças em Guarujá

Grupo de mães criaram grupo no whatsapp para combater supostos maus tratos

Carlos Ratton

Publicado em 18/12/2019 às 07:12

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Rapaz de 15 anos, portador de Transtorno do Espectro Autista (TEA), de forma moderada, teria sido vítima de tapas de uma auxiliar / Reprodução

Familiares de crianças especiais ingressaram com um pedido de investigação no Ministério Público (MP) e na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) contra a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) do Guarujá por maus tratos. O caso chegou também à polícia, por intermédio do Boletim de Ocorrência 1196/19, e na Prefeitura, por uma audiência pública.

O advogado Renato Cardoso, que já foi ouvidor do Município, é o defensor de alguns casos, entre eles o de um rapaz de 15 anos, portador de Transtorno do Espectro Autista (TEA), de forma moderada. Ele teria sido vítima de tapas de uma auxiliar. Depois, também teria sido jogado com violência em sua cadeira escolar pelo fato de simplesmente ter levantado sem autorização. A mãe do adolescente só foi perceber o que estava ocorrendo após o menor ter reações estranhas em casa. Passou a chorar, reclamar, dormir na hora de sair para ir à escola. Também perdeu o apetite e falava que não queria voltar à APAE.

Em setembro último, o menino reclamou que foi chutado e empurrado para fora da instituição, indicando inclusive, o local onde teriam ocorrido as agressões. A diretora da APAE teria sido procurada pela mãe do menino. Ela chegou a ser convocada para uma reunião em que lhe garantiram que o caso seria apurado por conta de câmeras de monitoramento do local. No entanto, nada foi feito.

A mãe do jovem disse à Reportagem que quando ela e o marido foram reclamar e requisitar as gravações, falaram que as câmeras apresentaram defeitos e não havia registro algum. "Na volta das férias, foi me relatado que meu filho foi jogado na cadeira porque queria conversar com um colega. Depois disso, começou a mudar o comportamento e se negar a frequentar a APAE. Ele mencionava muito o nome de outra criança e disse que queria jogar uma bomba na entidade. As marcas do corpo somem, as da mente, não", finaliza, alertando que o nome da instituição é proibido em sua casa.

GRUPO.

Renato Cardoso, que já ingressou com denúncia também de mais outra criança, diz que pelo menos mais três mães o procuraram. Elas chegaram a formar um grupo de whatsapp intitulado "Batalhando Pelos Filhos" para trocar informações sobre as agressões sofridas. Ele revela que o ocorrido afronta garantias às crianças previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), na Constituição Federal, na Declaração Internacional dos Direitos da Criança e Adolescente da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU).

"Vale ressaltar que elas já haviam procurado a Delegacia de Defesa da Mulher e registraram boletins de ocorrência antes de mim. Algo que as revoltou foi o fato da Direção da APAE não tomar nenhuma providência para afastar as funcionárias acusadas, limitando-se a dizer que confiam em suas profissionais. Peço para que apurem responsabilidades e impeçam que outras crianças sejam submetidas a agressões ou qualquer outra conduta degradante", afirma Cardoso, que pede agilidade na apuração dos fatos.

UM BICHO.

"As agressões ao meu filho começaram desde as primeiras semanas de frequência na APAE. Em um dia, ele saiu chorando, alertando que foi agredido. Percebi uma mancha roxa em seu braço e ele não parava de chorar. Pedi explicações, mas negaram as agressões e meu filho continuou a apresentar manchas. Ele chegou a perder o controle a ponto de ter um surto em frente a médica. Também relatou sobre uma criança amarrada. Foram meses de terror. Meu filho tinha uma vida social normal e se tornou um bicho, reproduzindo as agressões sofridas na APAE. Até a confiança em mim ele perdeu", relata a mãe.

A mãe continua seu relato: "todo trabalho que eu e minha família fizemos para ele ter uma vida normal foi 'por água abaixo'. Coisas que ele gostava de fazer já não interessam mais. Está difícil estabelecer uma rotina. Prefiro meu filho em casa, tendo carinho e amor, do que nessa entidade que deveria promover esses sentimentos. Infelizmente, os que lidaram com meu filho não tinham preparo para atender um autista. Ele quase foi internado. Então, resolvi procurar meus direitos. A Direção da APAE ainda me disse que eu não teria provas", finaliza.

OUTRAS MÃES.

O Diário obteve o depoimento de várias mães. Desde agosto, outro menino foge da APAE. A mãe disse que ele se tornou agressivo e também não quer mais retornar à escola. "Ele vem regredindo muito. Eu sugeri ficar com ele na aula, mas me foi negado alegando que mexeria com a rotina. Hoje, ele chora apenas em ouvir o nome da APAE. Depois de três meses, ele me relatou que tapavam sua boca e batiam. Eu prometi a ele que não o levaria mais", revela a mãe.

Outra disse que seu filho apresentou manchas roxas nos ombros, braços a até nos joelhos. "Ele começou a ficar bastante agitado, com crises de agressividade, que eu nunca havia visto. Passou a não querer entrar na van. Sei de outras mães que não se manifestam com medo de represálias".

A Prefeitura de Guarujá ficou sabendo da situação e iniciou uma investigação. Por intermédio da Portaria Interna 032/19, o secretário-adjunto de Educação, João José de Oliveira Pecchiore, assinou a constituição de uma comissão, formada por quatro servidores, para apurar os fatos levantados numa audiência pública. A Administração coloca em dúvida a qualidade do atendimento e coloca até a manutenção do convênio em jogo.

A comissão tem o objetivo de restabelecer o atendimento de qualidade na APAE de Guarujá, "de acordo com o plano de trabalho apresentado na assinatura do convênio com a Prefeitura", explica em nota. Até ontem, a Prefeitura não havia chegado a qualquer conclusão sobre o que foi denunciado pelas mães na audiência.

CONFIRMOU.

Consultada pela Reportagem, uma profissional da área da saúde, que preferiu não se identificar, confirmou a reação de crianças especiais que sofrem violência, revelando que se isolam, ou ficam agressivas e agitadas e que seria difícil provar uma agressão, a não ser que uma psicóloga comportamental colabore com as investigações e emita um parecer.

APAE.

Apesar da quantidade de mães alagando os mesmos problemas e a coincidência na reação dos filhos, por meio do advogado Valberto Almeida de Souza, a APAE alega falta de provas e que as acusações são falsas, criadas com fim exclusivo de prejudicar a entidade. "Não apresentam qualquer tipo de prova que sustente suas alegações", afirma o advogado, alertando que a instituição há mais de 10 anos atende, mensalmente, mais de 240 pessoas portadoras de deficiências intelectuais. "Portanto, presta relevantes serviços e não merece sofrer injustas acusações", completa.

Por fim, o advogado da instituição desqualifica o advogado que defende as mães e ainda ameaça: "O patrocinador dos denunciantes, sabedor da obrigatoriedade da obediência ao devido processo legal, não quer esperar o resultado do seu pedido de investigação, para depois procurar a Imprensa, procedimento que nos leva a duvidar de suas reais intenções. Temos provas contundentes contra essas falsas acusações, conhecemos suas motivações e já sabemos quem está por trás delas. Tomaremos todas as medidas cabíveis contra tais pessoas", sustenta o representante da APAE.

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