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Cotidiano

Papo de domingo: Uma israelense à brasileira

Jovem se muda para o Brasil aos 9 anos com seus pais e hoje, aos 22, mora sozinha em São Paulo. Ela conta como foi sua adaptação

Pedro Henrique Fonseca

Publicado em 26/01/2014 às 02:05

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As mulheres de Israel são obrigadas a servir o exército do País pelo período de dois anos. A obrigação também serve para os homens. Depois desse período, as mulheres trabalham para arrecadar dinheiro e dessa forma tirar um ano viajando pelo Mundo e assim que voltam a Israel decidem que profissão seguir. Uma jovem, de 22 anos, nascida na cidade de Petah Tikva, localizada no Distrito Central de Israel, fez o caminho oposto às mulheres da sua idade. Aos 9 anos, Eden Frydamn Mantel se mudou para o Brasil com sua família. O nome da jovem é uma homenagem ao Jardim do Éden, local onde ocorreram os eventos narrados no Livro do Gênesis, que retrata como Deus criou Adão e Eva.

A mudança ao país tupiniquim ocorreu por conta do trabalho do pai da jovem. “Na época, ele trabalhava em uma empresa brasileira e vivia fazendo ponte aérea, passando bastante tempo longe da gente. A minha avó materna já estava morando em Salvador e portanto decidimos ficar por lá”, conta Eden.

Anos após a chegada ao Brasil, a jovem ficou sozinha no País, já que seus pais retornaram a Israel em julho passado. Eden nessa época já morava em São Paulo. “Eles decidiram que era a hora de voltar para casa. Esperaram meu irmão se formar na escola e ir para universidade americana”.

Em entrevista ao Diário do Litoral, a israelense detalhou um pouco da vida no Brasil, as dificuldades vividas no País e sobre o conflito Israel-Palestina.

Eden Frydamn Mantel se mudou para o Brasil aos 9 anos com seus pais (Foto: Arquivo Pessoal)

Diário do Litoral – Quais foram as principais diferenças sentidas por você na mudança?

Eden Frydamn Mantel – Foi bastante difícil, principalmente no quesito amizades e língua. O choque cultural também foi grande. Estudava numa escola pública, junto com o filho da nossa empregada. Em Salvador, fui para uma escola particular, totalmente elitizada. Em Israel, eu vivia rodeada de amigos, desde a espera do ônibus até o horário da janta. Cheguei em Salvador falando no máximo 10 palavras em português, lembro que duas delas eram laranja e mãe. Além da língua totalmente diferente, eu não tinha o relógio do ano, o tênis da moda ou o corte de cabelo da estação, requisitos básicos para uma menina se enturmar.

Diário do Litoral – Como foi a adaptação ao Brasil?

Eden – Não foi fácil. Demorou uns dois anos para eu estar totalmente adaptada, enturmada e feliz com a mudança. Nesse tempo, muitos dias eu voltava da escola completamente desolada, querendo voltar para Israel.

Diário do Litoral – Para você que é israelense, como é morar no Brasil?

Eden – Atualmente, sinto que é minha casa, não só fisicamente, mas também no coração. Hoje me identifico muito mais com os códigos brasileiros, a cultura e os costumes. Sinto falta da família, da comida e de muitas particularidades de Israel, mas gosto muito de viver no Brasil.

Diário do Litoral – Quais são as principais diferenças para você entre os países?

Eden – Acredito que a principal seja a história. Israel e seu povo passaram por inúmeras ameaças e até hoje enfrenta diariamente o amedrontamento do amanhã. O país não tem a paz existente no Brasil. As pessoas vivem em torno da proteção do seu país, começando pelo exército obrigatório tanto para homens quanto mulheres.

Diário do Litoral – Como é viver no Brasil e ter seus pais morando em Israel?

Eden – Para mim está sendo tranquilo, claro que às vezes bate uma saudade mais forte, de abraçar, de beijar eles, ainda mais em datas especiais ou festas religiosas. Mas hoje, com as tecnologias, a distância diminui.

Diário do Litoral – O conflito Israel x Palestina sempre foi assunto recorrente no mundo, como são as coisas hoje?

Eden – Israel aprendeu a viver com esse conflito, que fortaleceu e uniu sua população. Essa divergência não influência no crescimento do país, que tem uma das maiores rendas per capita do mundo e um contínuo avanço tecnológico. A quantidade de atentados diminuiu expressivamente depois da construção do muro e da cerca nas fronteiras com Gaza e Cisjordânia.

Hoje a população se sente mais segurada. A vida aqui continua normalmente, cada um seguindo a sua rotina, sem dar grande espaço para o conflito, que há muitos anos faz parte do povo de Israel. Porém, o desejo da população ainda é chegar a uma solução final, para que possamos viver em paz com eles de uma vez por todas.

*Em abril de 2014, o muro que separa os dois países completa 12 anos e é conhecido como a “barreira de separação”, que teve sua construção ordenada pelo falecido primeiro-ministro Ariel Sharon.

Diário do Litoral – Você pensa em voltar para a Israel?

Eden – Penso e acho que sempre vou ter isso na cabeça, pois toda a minha família, tanto pelo lado paterno como materno, estão lá. Mesmo estando muito bem no Brasil, tenho um amor muito grande por Israel e acredito que nunca descartarei essa possibilidade.

Diário do Litoral – Quais as diferenças entre os costumes dos países?

Eden – As principais são a educação escolar e pessoal. O sistema escolar é excelente em Israel, oferecendo boa educação a todos os jovens, sem exceção. Porém, existe uma grande carência na parte da educação pessoal e boas maneiras. As pessoas têm dificuldades em olhar no olho do outro com respeito, sendo grosseiras e impulsivas. Já no Brasil ocorre o contrário. O sistema de educação não funciona, as escolas públicas têm uma péssima estrutura e muitos jovens não frequentam a escola. Mas, por outro lado os brasileiros são muito educados, respeitam os mais velhos, falam “por favor, obrigado, com licença, desculpa”. E é inexplicavelmente bonito para quem vê de fora.

Diário do Litoral – Hoje, o que você faz no Brasil, que não faria em Israel?

Eden – Vivendo no Brasil, eu segui o caminho da maioria, quando me formei na escola segui para a universidade, diferente do que eu faria se morasse em Israel. Lá, as meninas que terminam o ensino médio seguem para o exército e servem por dois anos. Logo depois, trabalham um tempo para juntar dinheiro e com essa quantia viajam por alguns meses, antes de focar no que realmente querem seguir. A universidade só vem depois. Com certeza se eu não tivesse me mudado para o Brasil, teria saído do exército e minha vida tomaria um rumo completamente diferente.

Atualmente, Eden cursa Negócios de Moda na Universidade Anhembi Morumbi, em São Paulo. “O mercado de moda em Israel é muito grande. Se eu voltasse, com certeza faria uma pós em administração ou marketing e seguiria na minha profissão de formação”. Perguntada ao respeito da obrigação de servir o exército, Eden afirma que cada situação é analisada pelo país. “Aqui eles olham cada caso em particular, depende da idade, dos motivos de não ter servido, das condições físicas e psicológicas. Mas, somente quando eu voltar poderei saber qual será a situação”.

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