Cotidiano

IML no Litoral de SP entrega laudos incompletos e prejudica investigações

Centenas de laudos foram emitidos sem informações essenciais durante operações policiais; médico-legista é réu por improbidade administrativa

Luana Fernandes Domingos

Publicado em 30/04/2025 às 15:15

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Entre junho de 2023 e abril de 2024, o IML de Praia Grande era o único da região habilitado a realizar exames cadavéricos / Reprodução/Google Maps

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O Instituto Médico Legal (IML) de Praia Grande, no litoral de São Paulo, tem entregue laudos necroscópicos incompletos, comprometendo a elucidação de casos de mortes violentas e gerando prejuízo a investigações policiais na Baixada Santista. As informações são do jornalista Tulio Kruse, da Folha de S. Paulo.

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A situação veio à tona com o caso de João Lucas Pereira de Oliveira Muniz, 21, morto a tiros por policiais militares durante a Operação Verão, em março de 2024. A família contesta a versão policial, segundo a qual ele estaria armado. No entanto, o laudo do IML, entregue onze meses após a morte, apresentou graves omissões: não descrevia medidas do corpo, características dos ferimentos, vestimentas, nem fornecia fotos ou croqui da trajetória dos disparos.

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A mãe do jovem, Regina Pereira de Oliveira, 53, relata a frustração: “O que eles fizeram, na verdade, não é um laudo. É simplesmente uma cópia do boletim de ocorrência.”

Médico-legista não realizou os exames

O documento foi assinado pelo médico-legista Riscalla Brunetti Cassis, que, à época do caso, já era réu por improbidade administrativa. Segundo registros do próprio IML, ele havia deixado de entregar centenas de laudos — ao menos 591, conforme relatório de setembro de 2022.

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Mesmo após cobranças internas, o médico não compareceu a reuniões nem apresentou justificativas. Em depoimento à Corregedoria da Polícia Civil, o médico-legista Guilherme Zanutto Cardillo, chefe de Riscalla, admitiu que muitos laudos foram redigidos apenas com base em atestados de óbito e boletins de ocorrência, devido à ausência de anotações, fotos e registros formais dos exames.

Operações policiais ampliaram a crise

A crise no IML se agravou com o aumento da demanda durante duas operações policiais de alto impacto, como a Operação Escudo, que ocorreu em julho de 2023) e deixou 28 mortos oficialmente registrados. E a Operação Verão, de janeiro a abril de 2024, que fez 56 mortos, considerada a mais letal desde o Massacre do Carandiru.

Durante esse período, a unidade de Praia Grande era a única da região habilitada a realizar exames cadavéricos, concentrando toda a carga de trabalho.

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Investigações comprometidas e pedidos de exumação

A advogada da família, Keila Mota, avalia a possibilidade de solicitar a exumação do corpo de João Lucas, após o Ministério Público pedir o arquivamento do caso. “O Estado matou o filho dela, o Estado não fez o exame que deveria fazer, e agora o Estado quer arquivar a investigação. São três violências extremas”, afirmou.

Outros casos também foram afetados pela lentidão do IML. Há investigações de homicídio que esperam laudos há mais de 18 meses. Famílias de vítimas de acidentes de trânsito também relataram prejuízos, inclusive na liberação de seguros DPVAT.

Defesa do médico-legista alega problemas de saúde

A defesa de Riscalla Cassis afirma que o médico enfrentou problemas de saúde, incluindo um quadro de burnout e crises de ansiedade, além de dificuldades técnicas no sistema do IML. Segundo o advogado Erick do Carmo, o médico teria tentado regularizar a situação produzindo até 50 laudos por dia.

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“Em nenhum momento houve intenção de prejudicar investigações ou omitir informações relevantes”, declarou o defensor em nota.

SSP afirma que denúncias estão sob apuração

A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP), sob gestão de Tarcísio de Freitas (Republicanos), confirmou que o médico está atualmente afastado por questões médicas. A pasta também declarou que os laudos obedecem às normas internas da Polícia Técnico-Científica, que preveem a coleta e o arquivamento de informações como fotografias, croquis e anotações em casos de afastamento de peritos.

“As denúncias apresentadas contra o perito são apuradas, sob sigilo, pela Corregedoria da Polícia Civil”, disse a secretaria.

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