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Guarujá

Comunidade caiçara luta para manter casas na Guarujá-Bertioga

Advogado diz que o DER quer derrubar casas de pescadores, mas faz vistas grossas para edificações de marinas e loteamentos

Carlos Ratton

Publicado em 23/07/2022 às 07:00

Atualizado em 23/07/2022 às 12:58

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Claudio Silva dá como exemplo o que o DER pretende fazer com o imóvel de 1916 localizado à beira de estrada e que pode ser demolido / Nair Bueno/ DL

"Eu queria entender o que o Departamento de Estradas de Rodagem (DER), do Governo do Estado de São Paulo, quer dizer quando coloca numa ação demolitória de casas de pescadores artesanais, que se encontram à Rodovia Ariovaldo de Almeida Viana (SP-61), conhecida como Guarujá Bertioga, há mais de quatro décadas, a palavra estética? As casas simples enfeiam o percurso e a construções das marinas embelezam? É isso?"

Esse é apenas um dos questionamentos que o advogado Cláudio Luís da Silva, que defende a permanência de, até agora, cinco famílias que fazem parte da comunidade caiçara que reside na região conhecida como Rabo do Dragão, em Guarujá que, como outras e, até pequenos comerciantes, estão tendo que se defender para não serem jogados na rua, ou melhor, na beira da estrada, sem direito algum. Até uma construção de mais de 100 anos e considerada histórica, pode vir abaixo.

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"A grande maioria dos moradores vivem da pesca artesanal e não teriam como sobreviver longe de suas habitações. Essas ações começaram a proliferar em 2019. A razão é a promoção de uma verdadeira limpeza étnica. Querem deixar a região elitizada, de nível financeiro alto. Eles não incomodam as marinas e loteamentos de luxo. Querem acabar com a cultura caiçara e permitir que o canal Bertioga só seja acessível a lanchas e grandes embarcações, que visam somente o lazer e ainda afetam negativamente o meio ambiente", dispara Silva.

O advogado cita o caso de uma moradora que paga Imposto Territorial e Predial Urbano em Guarujá e teve sua área invadida pelo próprio DER. "Agora, querem derrubar a casa dela. A casa que eles querem destruir uma construção de 1916 com laudo juntado pelo próprio órgão. O poder das marinas é tão grande que uma ação contra uma delas teve a petição inicial rejeitada pela Justiça, apesar do princípio ser o mesmo", afirma.

O advogado vai apelar para órgãos nacionais e até internacionais para defender a população originária do Rabo do Dragão. Para ele, não tem sentido Guarujá, uma ilha, ser cortada por uma estrada estadual. "Existe um pedido de municipalização pendente desde 2018, que não sai da gaveta dos governos estadual e municipal. Se o DER obtiver sucesso, vai deixar não só moradores, mais vais destruir dezenas de comerciantes também estabelecidos ao longo da estrada que já totalmente urbanizada.

O advogado informa que, para piorar, empresa que faz o laudo técnico para o DER alegando que se trata de uma estrada e não de uma área urbana, é sempre levada pelo próprio órgão. Portanto, um verdadeiro conflito de interesses. "E a empresa ainda junta uma proposta de recuperação ambiental da área. Ou seja, ainda vai lucrar com a retirada dos caiçaras", denuncia.

O advogado já acionou a SOS Mata Atlântica e também está acionando a escritório da Organização das Nações Unidas (ONU) na área dos Direitos Humanos. "É muito grave que, num estado democrático de direitos, isso esteja ocorrendo. Principalmente por uma autarquia estadual. Colocar no ação a palavra estética é grave. Os caiçaras estão lá muito antes da rodovia. É uma aberração o que está ocorrendo", finaliza.

LUTA.

A luta pela municipalização da rodovia que liga Guarujá a Bertioga pelas margens do canal de Bertioga não é nova. O Diário já fez inúmeras reportagens alertando que o que seria serviço simples e corriqueiro, vira um verdadeiro martírio burocrático sem necessidade.

Para zelar pela segurança de motoristas e moradores, a Secretaria de Operações Urbanas de Guarujá já teve que emitir um ofício para o DER para fazer a simples troca de seis lâmpadas queimadas nos postes localizadas na rodovia, que é praticamente uma via urbana dentro de Guarujá.

O Governo do Estado já recebeu indicação formal para municipalizar por intermédio da deputada Monica da Bancada Ativista (PSOL), a pedido do secretário geral da Associação dos Moradores e Amigos da Cachoeira da região do Rabo do Dragão, Sidnei Bibiano Silva dos Santos, que vem lutando incansavelmente pela conquista.

A municipalização está parada em alguma gaveta do Palácio dos Bandeirantes. O pedido de Monica atinge os 22,5 quilômetros da estrada, ligando a área urbana até a balsa que dá acesso ao município de Bertioga. A deputada justifica que toda a estrada possui características urbanas, com serviços de correios, transporte público, coleta de lixo, iluminação, mas tudo de forma bastante precária, necessitando ampliar a infraestrutura para famílias que lá residem por mais de 70 anos.

Bibiano já havia adiantado que a Prefeitura de Bertioga conseguiu autorização para iluminar a Rodovia Estatual Mário Covas, a Rio Santos e a Mogi Bertioga, o que abre jurisprudência pra que Guarujá também consiga. "Mas parece que o DER e o Governo Estadual não colaboram com Guarujá", acredita.

Bibiano acredita ainda que municipalização poderia ampliar os serviços públicos e o crescimento econômico da região. "Vai possibilitar reconhecimento como uma comunidade urbana, apesar de ainda necessitarmos de aprimoramento de prestação de serviços e mais infraestrutura. Municipalizar é uma questão de cidadania", explica, revelando que cerca de 30 mil pessoas seriam beneficiadas com a medida.

DER

O DER não explicou porque a demolição se dará somente com imóveis de pescadores e pequenos comerciantes, nem porque no processo existe a palavra 'estética', entre outras questões.

Resumiu apenas informando que estão ocorrendo ações judiciais de reintegração de posse na SP-061 referente a processos antigos, de mais de uma década atrás.

"Os imóveis foram construídos irregularmente sob a faixa de domínio do DER e em área não edificante, conforme descrito no Decreto-Lei nº 13.626".

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