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Com a experiência de quem conheceu Neymar nas categorias de base do Santos, a psicóloga Sonia Román se desespera quando assiste a alguns jogos da Seleção Brasileira na Copa do Mundo. Não chega a chorar, como fizeram alguns jogadores em situações de extremo estresse, porém se revolta com a postura do técnico Luiz Felipe Scolari no comando da equipe.
“É claro que o Felipão precisa trabalhar o emocional dos meninos, e ele não entende nada disso. Que loucura é essa?”, comentou Sonia, em uma conversa por telefone com a Gazeta Esportiva. “O trabalho dos psicólogos esportivos está sendo atropelado. Chega o Felipão e dá um vídeo motivacional mostrando desgraças... É um perigo. Não dá para entender. Quando alguém está muito motivado, o hino gritado e as palavras de ordem não servem como incentivo. Isso é uma aceleração física, do sistema nervoso, e não um fator motivacional. Existe uma distorção. Se você está com medo, como reagirá com um Paulinho batendo no seu peito e te acelerando?”, argumentou.
O assunto mexe tanto com Sonia Román que ela tem disponibilizado vídeos na internet com as suas opiniões. Também interrompeu o seu almoço na cidade de Santos para conceder essa entrevista. E não se importou com o fato de Neymar dizer que as consultas com a psicóloga Regina Brandão, chamada às pressas por Felipão para controlar as emoções da Seleção Brasileira, terem sido as suas primeiras experiências com uma profissional da área.
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“É normal. Como o Neymar é emocionalmente muito forte, ele acha que todo o mundo é igual. Talvez seja um erro. A maioria deles precisa de amparo psicológico, sim”, comentou Sonia, que trabalhou durante uma década nas categorias de base do Santos, tendo atendido também Diego e Robinho. Com Neymar, a quem chama de “xodó”, o apego foi tamanho que o atacante escreveu a seguinte declaração para o livro “Estou mais leve”, lançado por ela em 2011: “Sonia Román, uma pessoa maravilhosa que sempre nos ajudou. Agradeço a você por tudo que fez por mim e por todos os atletas que passaram pelo Santos. Que Deus abençoe a sua vida e te ilumine por onde você andar. Beijos”.
Hoje no Barcelona e distante da psicóloga que o atendeu na adolescência, Neymar diz aprovar e sair mais leve das consultas com Regina Brandão. Sonia Román gostou de ver o seu antigo paciente andar de bicicleta na Granja Comary no mesmo período em que a Seleção Brasileira voltou a contar com o amparo da psicologia. “Não sei se isso já é coisa da Regina porque não estou lá. Mas pode ser um bom sinal. Ele e os demais devem relaxar para alcançar a motivação ideal. É preciso desmotivar um pouco, mas não além do necessário”, comentou.
Até mesmo para Sonia, no entanto, Neymar já está suficientemente motivado para a Copa do Mundo. “Ele é um craque, alguém especial. Não precisa de muita coisa. Se eu estivesse lá, só trabalharia com o Neymar a questão da tolerância. Ele tem uma estrutura muito boa, estável, mas fica bravo quando está muito marcado e não o deixam jogar. O choro dele é um choro de nervosismo, de desespero por estar lutando e não conseguindo chegar aonde quer porque existe uma barreira do outro lado”, identificou.
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A primeira psicóloga de Neymar avisou que o mesmo raciocínio não se aplica ao restante da equipe. “Os meninos estão apresentando um comportamento a cada jogo”, lamentou Sonia. “O Júlio César é tão perfeccionista que se cobrou para redimir um erro de quatro anos atrás, como se aquilo fosse uma mancha, o que não é. O ser humano não erra? Ele está trazendo toda uma ansiedade para si. Já o Thiago Silva chora porque tem medo de errar. Não se sentiu seguro para bater um pênalti. Pensou: ‘E se eu errar?’. O Hulk é a mesma coisa. Ouvi ele dizendo que deve errar bastante nos treinos para não errar no dia do jogo. Isso não é verdade. É mais um sinal de estresse”, analisou.
Com ponderações minuciosas, a psicóloga parece se sentir como Neymar quando está diante de uma defesa bem armada como a do Chile. “Vejo o Felipão dando a mesma palestra motivacional para um grupo todo, como se todos ali fossem iguais”, criticou mais uma vez. “Ficar de longe percebendo tudo isso, sabendo que é fácil arrumar algumas coisas, é torturante”, definiu Sonia Román, na condição de mais uma torcedora da Seleção Brasileira.