Sacos de grãos de soja da Rumo, encontrados pela Polícia, na Fazenda da Cactos em São Vicente / Divulgação
Continua depois da publicidade
A manifestação do dentista e jornalista Bruno Scalpelli Quiqueto, que usou a Tribuna Cidadã da Câmara de Santos, no início do mês, para denunciar suposta falta de fiscalização de emendas parlamentares destinadas ao Centro de Apoio e Recuperação de Dependentes de Drogas – Cactos é bem mais grave e já envolve até a polícia. Quiqueto e alguns diretores estão sendo impedidos de frequentar a sede da entidade por conta das denúncias.
A Cactos é uma entidade sem fins lucrativos, mas que recebe subsídios públicos para atendimento de dependentes químicos em tratamento. Conforme boletim de ocorrência (BO): DT8027-1/2025, de 13 de março último, registrado como furto numa operação para apurar denúncia do Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP) referente a maus-tratos e furto de energia elétrica, uma força-tarefa policial vicentina se deslocou para fazenda mantida pela Cactos, na Estrada do Paratinga, e descobriu sacos estocados de 60 quilos grãos de soja.
Continua depois da publicidade
A Secretaria de Saúde de São Vicente já havia detectado em inspeção que a fazenda não possuía documentos e nem alvará. As atividades relacionadas ao atendimento a pacientes estavam inclusive suspensas desde maio de 2024 e, mesmo assim, a Cactos teria recebido valores em emendas de vereadores da Câmara de Santos.
Os policias encontraram seis ocupantes do imóvel, mas nenhum soube informar a procedência da carga. Em contato com a empresa RUMO (empresa ferroviária de transportes de cargas) foi constatado que a carga ali armazenada era de propriedade dela.
Posteriormente, foi verificado que havia um veículo no local que era utilizado por duas das seis pessoas incluídas no BO. Numa breve revista no porta-malas do veículo, foram encontrados grãos de soja condizentes com os encontrados no galpão. “Este fato motivou a ligação do veículo com o transporte da soja ali existente. Diante dos fatos, todos foram qualificados e conduzidos ao plantão policial para a coleta de depoimentos e soja foi restituída a empresa RUMO”, escreveram os policiais no BO.
Os policiais, acompanhados de profissionais da Secretaria de Saúde de São Vicente, foram recepcionados pelo supervisor do local (que estaria operando de forma irregular), mas que o ocupantes declararam que estavam no local por terem problemas com álcool e drogas, alguns com jogos de azar, e que para morar seria exigida a assinatura de um termo de voluntariedade.
Continua depois da publicidade
A Secretaria de Saúde fez um relatório, publicado em abril último, destacando alimentos vencidos, falta de geladeira, de responsável técnico, condições sanitárias precárias, falta de medicamentos e prontuários dos poucos internos que estavam na fazenda.
Ainda na fazenda, a perícia da Polícia Científica deslocou-se até a instalação onde fica a ligação de energia da Cactos e ainda descobriu ligação irregular, caracterizando furto de energia elétrica da RUMO, que tem um pátio de manobra em frente à fazenda.
De acordo com Bruno Quiqueto, no final do ano passado, a Cactos teria recebido R$ 311 mil por meio de emendas legislativas santistas sem ter um único usuário em atendimento. Conselheiro municipal de Saúde e ex-voluntário da Cactos, o dentista revelou ainda que um veículo, na ordem de R$ 140 mil, foi adquirido com verbas das emendas e estaria sendo usado pelo vice-presidente da Cactos sem transportar nenhum interno. Há até vídeos que comprovam a informação sendo veiculados nas redes sociais.
Continua depois da publicidade
O denunciante alerta de existem cinco inquéritos abertos. Um no Ministério Público do Trabalho – Santos (001080.2024.02.003/8), outro no Ministério Público Criminal – Santos (Notícia de Fato nº 2517.0000150/2025 – de falsificação de assinatura), um terceiro no Ministério Público – Santos (2472.0000785/2024 - patrimônio público, um quarto no Ministério Público - São Vicente (nº 2472.0000752/2024 - regularização da fazenda) e o quinto no Ministério Público Criminal - São Vicente (0444.0003416/2024 - maus tratos, exercício ilegal, apropriação indébita).
Há ainda um boletim de ocorrência (2346540-20.2024.040286, processo 1526028-67.2024.8.26.0590), registrado no 3º Distrito de São Vicente. “A força tarefa resultou em mais duas denúncias (notícias de fato), uma no Ministério Público Federal (MPF) por indícios de trabalho análogo à escravidão e outra no MPT”, informa o dentista na Tribuna da Câmara.
Outro fato agravante da denúncia é que há uma decisão judicial, de 23 de março último, assinada pelo juiz Fernando de Oliveira Mello, da 8ª Vara Cível de Santos, anulando uma assembleia de aprovação de balanço de 2023 da Cactos por constatar fraude.
Continua depois da publicidade
“Esse balanço foi, inclusive, utilizado para que a entidade continuasse a receber emendas”, afirmou Quiqueto, em entrevista ao Diário após o pronunciamento na Câmara, oportunidade que o dentista entregou cópias tudo que denunciou à Reportagem.
A diretora-presidente da Cactos, Márcia Fontoura Prado, esteve na mesma Tribuna e disse que há cerca de dois anos foi criada uma campanha para difamar a entidade e perseguir os atuais diretores. Reforçou que a instituição vem respondendo a todas as denúncias e questionamentos às autoridades.
“Esse grupo entrou com diversas ações na Justiça que aos poucos estão sendo julgadas. Temos comparecido a todas as intimações e audiências, sempre com o propósito de esclarecer todas as dúvidas”.
Continua depois da publicidade
A Reportagem encaminhou à Cactos os questionamentos apontados pelo denunciante (Quiqueto), para que a diretora-presidente da entidade se manifestasse e apresentasse documentos e provas que contrariassem às denúncias, mas ela não atendeu e nem as mandou, indicando apenas o advogado da entidade.
Procurado, o advogado da Cactos, Octavio Rolim, disse que até o momento a Direção não foi intimada oficialmente por nenhum órgão investigativo por ações eventualmente praticadas. “Contudo, adiantamos que, caso aconteça, iremos não só colaborar com as apurações, como averiguar a origem e veracidade das denúncias, sobretudo para fins de responsabilização caso caluniosas”, disse o advogado.
Rolim enfatiza que a Cactos é uma instituição séria e que muito colabora com a sociedade no que diz respeito ao amparo e reabilitação de dependentes químicos ao longo dos seus 30 anos de existência muito colabora com a sociedade no que diz respeito ao amparo e reabilitação de dependentes químicos.