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Cotidiano

Da terra à merenda: agricultura familiar muda destino de famílias em Itanhaém

A zona rural de Itanhaém possui uma história de apogeu, declínio e retomada que merece destaque

Agência Brasil

Publicado em 23/04/2018 às 19:00

Atualizado em 19/04/2021 às 15:03

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Maximino Gonçalo de Jesus é conhecido como Mussu / Rodrigo Montaldi/DL

“Hoje a gente ganha a vida com dignidade”, afirma Maximino Gonçalo de Jesus, conhecido como Mussu. O mini trator que há pouco arava o solo descansava em meio a plantação de maracujá e um boné gasto e sujo de terra protegia do sol os olhos do homem que aprendeu ainda jovem em Jequié, na Bahia, a arte de plantar e colher. Um homem da roça, como ele mesmo se denomina, que encontrou no incentivo à atividade rural, por parte da Prefeitura de Itanhaém e do Governo Federal, um caminho para sustentar sua família.

Ali, naquele pedaço de terra da Zona Rural de Itanhaém, além de banana, palmito e maná-cubiu (uma fruta exótica oriunda da Amazônia) sai também uma considerável parte da riqueza econômica e ao mesmo tempo imaterial de Itanhaém: produtos orgânicos frutos da agricultura familiar, que além de garantir o sustento de famílias do campo, leva para a mesa de centenas de alunos da rede municipal de ensino alimentos de qualidade e sem o uso de agrotóxicos na plantação.

A Lei nº 11.947, de 16 de junho de 2009, determina que no mínimo 30% do valor repassado a estados, municípios e Distrito Federal pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) deve ser utilizado na compra de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar e do empreendedor familiar rural ou de suas organizações. Em Itanhaém, o índice é seguido à risca. A produção do setor agrícola é de 102,27 toneladas ao ano e a maior parte da distribuição da produção é de Banana, seguida por chuchu, alface, mandioca e palmito pupunha.

A zona rural de Itanhaém possui uma história de apogeu, declínio e retomada que merece destaque. Ocupada por anos por grandes fazendas produtoras de banana, o espaço foi arrendado - após o abandono dessas plantações - para pequenos agricultores em 2005, após o Governo Federal identificar e incentivar os pequenos produtores rurais.

“A criação do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) alavancaram a agricultura familiar e orgânica, além de abrir a oportunidade de plantação de outros gêneros alimentícios, que antes eram desperdiçados ou alvo de atravessadores, que compravam lotes inteiros de alimentos por preços irrisórios e muito abaixo do valor de mercado”, conta Thais Muraro, diretora do departamento de agricultura da Prefeitura de Itanhaém.

Foram as mudanças no cenário da agricultura familiar em Itanhaém que fizeram Marcos Gonçalves de Jesus retornar a cidade e partilhar da paixão pelo campo com o pai, o senhor Mussu. “Tinha o sonho daquele menino de interior de ir para São Paulo ganhar a vida e fiquei por lá alguns anos até Itanhaém começar a participar desses programas. Meu pai me chamou para voltar e ajudar ele, pois assim conseguiríamos o selo de agricultura familiar e nesse retorno descobri uma paixão que não conhecia antes de sair daqui”, conta.

Hoje é ele quem preside a Associação dos produtores rurais de Itanhaém (Amibra), que dentre outras ações executa, todos os sábados, a Feira da Agricultura Familiar  da cidade, que aproxima o rural e o urbano e garante mais uma fonte de renda para a população do campo. A feira funciona todos os sábados, das 8h30 às 16 horas, no estacionamento do Paço Municipal, localizado na Avenida Washington Luiz, 75, no Centro. O espaço vende frutas, verduras e legumes com ênfase na agricultura orgânica. Também estão disponíveis derivados artesanais como bolos, pães, sucos, além de pescados.

Dignidade

“Além de ir para o banco de alimentos e para a merenda, o incentivo à agricultura familiar por parte da Prefeitura de Itanhaém e a criação da feira nos ajudou também com as vendas diretas. Hoje temos clientes nas cidades vizinhas e até mesmo fora da Baixada Santista. Nossa vida mudou radicalmente”, afirma Antônio Isaías.

O amigo José Viana destaca que a região é forte no plantio de hortaliças, mas que a terra é boa para qualquer tipo de alimento. “Tudo o que a gente planta a terra produz”, conta.

Hoje a Prefeitura trabalha no apoio aos produtores e na implantação de melhorias como o processamento mínimo antes da venda. “Coisas simples como fatiar a couve antes da venda e que terão um impacto importante para o consumidor final. Esses produtores possuem o Selo de Identificação da Participação da Agricultura Familiar (Sipaf) que tem um valor social muito grande e cria uma relação de confiança com o comprador”, finaliza Thais.

Mulher Rural

Dona Maria José Penha, de 75 anos será uma das primeiras 13 mulheres do Brasil a receber o Selo Mulheres Rurais da Secretaria de Agricultura.

Banco de alimentos combate desperdício

Combater o desperdício, enfrentar a fome a ao mesmo tempo incentivar a agricultura familiar. A ação do Banco de Alimentos de Itanhaém garante melhoria na qualidade de vida de pessoas em situação de vulnerabilidade social.

Funciona assim: parte dos alimentos é adquirida pelo governo diretamente dos agricultores familiares, assentados da reforma agrária, comunidades indígenas e demais povos e comunidades tradicionais.  A compra pode ser feita sem licitação e cada agricultor pode acessar até um limite anual e os preços não devem ultrapassar o valor dos preços praticados nos mercados locais.

Outra parte vem da coleta urbana: são alimentos descartados dos supermercados e hortifrútis por estarem amassados ou com alguma avaria que impossibilite a sua venda lucrativa. Eles são destinados para o banco de alimentos, onde o que vem da zona rural é alocado em cabines específicas e o que vem dos mercados passa por uma triagem criteriosa. O que está próprio para o consumo é imediatamente destinado para a formação de estoques estratégicos e distribuição à população necessitada.

“O conceito do banco nasceu para combater o desperdício em todas as suas esferas. Dessa forma, além do reaproveitamento dos alimentos que seriam desperdiçados no comércio, até mesmo o nosso lixo orgânico é destinado para criadores de animais e serve como adubo”, conta a coordenadora Luciana Rodrigues.

Na visão da gestora de segurança alimentar Luciana Melo, os ganhos são intersetoriais. “O meio ambiente agradece, pois não há circulação de caminhões de outras cidades e a economia também, pois o dinheiro circula pela cidade. Os alimentos são destinados para unidades de ensino e saúde, fortalecendo essas áreas também”, conta.

Um dos maiores destaques em Itanhaém foi a adequação do cardápio, por meio do trabalho em conjunto com o Banco de Alimentos e o setor de Alimentação e Nutrição da Prefeitura. Unindo os produtos da agricultura familiar, que fazem parte da cultura gastronômica local, foi reformulado o cardápio oferecido aos alunos, refletindo no hábito alimentar, com ganhos nutricionais e, consequentemente, no rendimento escolar.

“Meu filho sempre fala para os amigos na hora do intervalo que foi a mãe dele que separou aquela comida. É gratificante demais trabalhar para evitar o desperdício e também colocar todo o amor de mãe na separação do que as crianças vão comer”, conta Eliane Bastista, que trabalha há sete anos no banco.

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