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Cotidiano

Continuam as buscas por desaparecidos em Itaoca

Famílias inteiras desapareceram nas torrentes formadas pela tromba dágua que atingiu o município

Pedro Henrique Fonseca

Publicado em 15/01/2014 às 20:04

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Famílias inteiras desapareceram nas torrentes formadas pela tromba dágua que atingiu o município de Itaoca, no Alto Ribeira, a 343 km de São Paulo, entre a noite de domingo, 12, e a madrugada de segunda-feira, 13. No final da tarde desta quarta-feira, 15, a Defesa Civil e a Polícia local contabilizavam 13 mortos e 13 desaparecidos, elevando para 26 o número de possíveis vítimas. O corpo de Iago Henrique da Mota, de 4 anos, um dos desaparecidos, foi encontrado no rio Ribeira, em Iporanga. Familiares foram chamados e o reconheceram. O corpo de um desconhecido que está no Instituto Médico Legal (IML) de Registro pode ser o de Luciano Rodrigues dos Santos - a família chegaria durante a noite na cidade para a confirmação. Havia informação de mais pessoas tidas como desaparecidas à espera de checagem.

Sentado numa rocha, o operador de máquinas Adriano Santos Cardoso, de 20 anos, tinha o olhar perdido em direção ao ponto onde ficava a casa de sua mãe, Silvana dos Santos, de 38 anos. A casa desapareceu no turbilhão que virou o córrego Guarda Mão, levando sua mãe, o marido dela Arlindo, 44, padrasto de Adriano, sua avó, dona Darci, 77, e os irmãos Samuel, 16, e Suelen, 9. Apenas o corpo de Silvana tinha sido encontrado até a tarde. O rapaz que perdeu quase toda a família conta que há dois anos mora e trabalha em Joinville (SC).

"O telefone tocou de madrugada. Disseram que eu tinha de vir para Itaoca o quanto antes, pois tinha acontecido algo. Não entraram em detalhes, mas vi o noticiário. Perdi toda minha família. Não sei como estou aqui." Adriano passou a manhã andando de um lado para outro, à espera de informações sobre os quatro familiares ainda desaparecidos. "Preciso resolver isso primeiro, e depois o que vai ser." Quem ofereceu água ao rapaz foi Berenice Dias dos Santos Rosa, de 29 anos, vizinha que teve a casa atingida, mas continuou em pé. "Quando vi a água chegando, peguei minha filha (Brenda, 2 anos), chamei meu marido e fomos para a parte alta. Perdemos lavadora, móveis e roupas, mas estamos vivos."

O marido de Berenice, o leiturista da Sabesp Drauzio Ribas Rosa, conta os mortos e desaparecidos do Guarda Mão pelas casas que não existem mais. "Naquela foram três pessoas, o Luciano, a Michele e a Manuele. Na outra ali eram oito, só acharam o seu Dimas, o resto da família está sumido." Drauzio vai contando nos dedos: "Na casa do seu Odair foram cinco, só acharam ele e a Michele. Ali tinha outra casa, com quatro pessoas, inclusive um casal de crianças, mas só acharam a mãe. Acho que muito corpo não vai aparecer mais".

No final da tarde desta quarta-feira, 15, a Defesa Civil e a Polícia local contabilizavam 13 mortos e 13 desaparecidos (Foto: Epitácio Pessoa/Estadão Conteúdo)

Moradores conseguiram salvar pessoas que se enroscaram em galhos e árvores. "Pegamos uma menina, mas o homem, seu Dimas, acabou morrendo", conta Cleusires Ribas. O homem estava sob um monte de galhos, foi retirado com vida, mas no meio da tragédia o socorro médico não deu conta. Quando chegou, sete horas depois, ele já havia morrido. O padrinho de Cleusires salvou dois idosos, Amadeu Camargo, de 82 anos, e sua mulher Conceição, de 67, que estavam presos em casa com água até o pescoço. Outra família - dona Malvina, a filha dela Laís e o neto Vital - foram resgatados após se agarrarem nos galhos de uma jabuticabeira.

Limpeza

Na área urbana, a parte da cidade não atingida tenta voltar ao normal. Na parte alta não há casas destelhadas, nem lama pelas ruas. O comércio abriu as portas e os moradores que nada sofreram se engajam como voluntários para ajudar os flagelados. Benedito Gonçalves de Almeida, de 32 anos, ajuda na limpeza de casas e ruas. No dia do temporal, ele ficou com o carro ilhado entre o córrego Guarda Mão e o rio Palmital, mas conseguiu escapar. Agora, integra o grupo de voluntários que ajuda moradores da Professor Elias Magalhães, a rua mais afetada, paralela com o rio.

Cerca de 100 casas e estabelecimentos comerciais foram afetados e 19 ruíram completamente. Mais de trezentas pessoas continuam desalojadas e 20 estão abrigadas numa escola estadual. Lojas, mercearias, açougues e residências, ou caíram, ou estão tomadas por lama e entulho. Máquinas e tratores removem a lama e o asfalto é lavado. A base da Polícia Militar e o único cartório de notas e registro civil da cidade também foram tomados pelo barro. "Salvei um carro e uma TV, o resto foi tudo", disse o ex-tabelião Claudio Oliveira de Lima, dono do prédio do cartório, da loja agropecuária vizinha e morador da casa ao lado Uma montanha de paus triturados ainda obstrui parcialmente o leito do Palmital.

Solidariedade

Uma corrente de solidariedade ameniza o sofrimento das famílias. Carros com alimentos, água, cobertores, colchões e roupas chegam de todas as partes. Vinte jovens de Apiaí desceram em caravana, no final da tarde, para ajudar nos trabalhos braçais. O comerciante João Slompo, 26 anos, de Apiaí, fez duas viagens de picape levando bens doados e água, e preparava uma terceira para levar fraldas e pão. No bairro Lajeado, a dona de casa Antonia de Oliveira Rosa, de 62 anos, cruza a pé o rio Palmital - a ponte foi levada pelas águas - para pegar caixas com lanches e mantimentos.

O material está sendo distribuído na escola do bairro, que virou ponto para entrega de doações. "Várias pessoas conhecidas que ficaram sem ter para onde ir estão em casa", disse Antonia. As doações também estão sendo encaminhadas para órgãos públicos regionais, como o Hospital Regional de Pariquera-Açu, o Laboratório Regional de Registro e o Hospital Municipal de Apiaí As prefeituras de Apiaí, Guapiara, Ribeira e Iporanga também recebem alimentos não perecíveis, água embalada, cobertores e agasalhos.

A Secretaria da Saúde do Estado enviou mais uma equipe com médico e enfermeiras com vacinas e remédios para atender a população. A Cruz Vermelha está na cidade com 14 integrantes, divididos em equipes de enfermeiros, socorristas e de ajuda humanitária.

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