Nativas do Brasil e sem ferrão, as abelhas mandaçaias são de fácil manejo e vêm ganhando atenção por seus produtos além do mel / Freepik
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Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade de Brasília (UnB) e de duas startups de Ribeirão Preto identificaram um composto com alto potencial larvicida na própolis produzida pela abelha sem ferrão mandaçaia (Melipona quadrifasciata). O estudo, que contou com apoio da Fapesp e do Ministério da Saúde, busca alternativas naturais para combater o Aedes aegypti, mosquito transmissor da dengue, chikungunya, zika e febre amarela.
Publicado na revista Rapid Communications in Mass Spectrometry, o trabalho revelou que a chamada "geoprópolis" da mandaçaia — mistura de resinas vegetais com partículas de terra — apresentou uma eficácia de 100% na eliminação das larvas do mosquito em até 48 horas. Em comparação, a própolis tradicional, feita por abelhas europeias (Apis mellifera), mostrou resultados muito inferiores mesmo após 72 horas de exposição.
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A substância responsável pelo efeito larvicida é um tipo de diterpeno presente na geoprópolis. Segundo os cientistas, a molécula é derivada da resina de pinus (Pinus elliottii), uma árvore exótica cultivada no Brasil. O diferencial está na forma como a mandaçaia processa essa resina com sua saliva, o que ativa a propriedade larvicida do composto.
“Ficou claro que a resina do pinus, processada pelas mandaçaias, é o que proporciona a ação larvicida”, explica o pesquisador Luís Guilherme Pereira Feitosa, autor principal do artigo e doutor pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP-USP).
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Atualmente, o controle de larvas do Aedes aegypti depende de inseticidas químicos que podem causar danos ao meio ambiente. A descoberta do diterpeno oferece uma alternativa sustentável e de menor impacto ecológico. No entanto, os pesquisadores destacam que o volume de geoprópolis produzido pelas mandaçaias é muito pequeno, o que inviabiliza sua aplicação direta em larga escala.
A boa notícia, segundo os cientistas, é que a resina do pinus já é produzida industrialmente. Com isso, o composto ativo poderá ser replicado ou modificado em biorreatores, usados na indústria farmacêutica, para criar versões ainda mais potentes do agente larvicida.
Nativas do Brasil e sem ferrão, as abelhas mandaçaias são de fácil manejo e vêm ganhando atenção por seus produtos além do mel. A pesquisa também testou a própolis de outras espécies nativas da mesma região — como a jataí, a mirim e a borá, mas nenhuma apresentou o mesmo nível de eficácia no combate às larvas do mosquito.
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O projeto faz parte da iniciativa "Inventariando o metabolismo secundário através da metabolômica", liderada pelo professor Norberto Peporine Lopes (FCFRP-USP), no âmbito do Programa Biota-Fapesp.
O fluxo de trabalho utilizado no estudo, baseado em diferentes técnicas de espectrometria de massas, tem sido aplicado agora na busca por compostos naturais com ação antitumoral. “A abordagem pode ser usada para diversas finalidades farmacológicas”, explica Feitosa, atualmente em estágio de pós-doutorado na USP.
Além disso, o projeto coordenado pela professora Laila Salmen Espindola, da UnB, resultou em outro larvicida natural a partir de óleo essencial de uma planta já cultivada no Brasil. Segundo os pesquisadores, foram desenvolvidas versões em pó e comprimido, com ação prolongada por até 24 dias, sendo o comprimido de liberação lenta e o pó de efeito imediato.
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As descobertas reforçam o potencial da biodiversidade brasileira como fonte de soluções inovadoras e sustentáveis no combate a doenças tropicais negligenciadas.