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Esquecido na principal categoria, A Baleia é o filme mais comentado do Oscar 2023

Todos os anos gosto de acompanhar de perto a cerimônia do Oscar, dedicando uma parte do meu tempo em assistir as obras indicadas nas principais categorias. Além dos indicados ao prêmio de melhor filme, dou um peso enorme também para as obras estrangeiras, que não perdem em nada para Hollywood. Tem sido comum encontrar filmes fora do circuito americano bem superiores aqueles de língua inglesa. Parasita, vencedor do Oscar em 2020, é o grande exemplo disso e não está só.

Muito se fala sobre a queda de qualidade dos indicados ao longo dos últimos anos. O que é uma verdade. Uma questão determinante foi o aumento dos indicados ao prêmio máximo da noite. De cinco para dez. A mudança que tinha a intenção de aproximar novamente o grande público da cerimônia, no intuito de listar blockbusters entre os indicados, acabou diminuindo a nota de corte, dando espaço para filmes que seriam ignorados em outros momentos. Enquanto todas as categorias contam com cinco indicados, deixando uma disputa mais afunilada, a que deveria ter o maior nível de exigência, acaba sendo um apanhado de filmes que nem sempre tem a áurea de uma grande obra. Tenho também o sentimento que os anos de pandemia atrapalharam muito as produções cinematográficas, colaborando para que o nível das obras também caísse. Algo completamente compreensível e que aos poucos vai se reencontrando.

Dentro disso, me chama a atenção a ausência do polêmico A Baleia da lista dos indicados a melhor filme.  Longe de ser um primor ou apresentar uma grande novidade, a obra estrelada por Brendan Fraser tem despertado a curiosidade do público e gerado inúmeros debates. A ausência da principal lista seria completamente justificável pelo que o filme oferece. Mas o alto número de indicados e a presença de blockbusters como Top Gun: Maverick e Avatar: O Caminho da Água dão argumentos para os defensores da obra dirigida por Darren Aronofsky, que tem gerado inúmeros debates. 

Não pretendo aqui me aprofundar nas discussões que envolvem a forma como o diretor trata o protagonista que sofre de obesidade mórbida ou as temáticas no entorno do filme como homofobia, perseguição religiosa, suicídio e relações familiares. Confesso que me surpreendeu o número de pessoas que foram tocadas pela obra. Talvez o distanciamento que muitos ainda têm desse tipo de cinema tenha permitido um olhar cru e inocente para um projeto que pouco tem a oferecer, a não ser uma grande atuação do protagonista que deve ser coroado com justiça. 

E está aí o ponto que quero bater sobre a preferência de uma grande parte do público quando está diante de uma tela por algumas horas. A impressão é de que para o espectador vale mais uma atuação marcante e cheia de desafios do que propriamente o filme em si. No caso de A Baleia, o retorno de Brendan Fraser aos holofotes depois de um período crítico em que ficou afastado por denunciar um abuso sexual sofrido por ele, somado ao esforço de uma transformação corporal, mais um trabalho de maquiagem impactante, aliados a uma atuação desafiadora de uma personagem complexo e renegado, são suficientes para impulsionar o filme e aprofundar inúmeros debates (muitos pertinentes) a respeito da história que, ao meu ver, não apresenta grandes novidades. Numa avaliação rápida, vejo A Baleia como uma obra mais próxima do ordinário do que de algo que realmente foi feito para tocar as pessoas. E talvez o grande mérito, além da atuação de Fraser, seja essa confusão de sentimentos que tem deixado o filme mais em evidência do que os próprios indicados ao principal prêmio. 

Ignorando apenas Avatar, assisti aos indicados a melhor filme tanto na categoria principal, como na dos estrangeiros. Gostei de 70% do que vi. Mesmo achando uma certa dose de forçação de barra ver Top Gun entre os indicados, é inegável que a obra diverte e entretém. Gostar ou não gostar dos indicados é uma questão particular e não técnica. A análise passa apenas pela forma como o cinema mexe no particular de cada um e o que buscamos quando estamos assistindo a um filme. 


Por isso, rejeito o favorito Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo. Confesso estar surpreso com o favoritismo do filme dirigido por  Daniel Kwan e Daniel Scheinert. Uma vitória da obra pode me colocar num nível de conservadorismo maior do que da própria academia, propensa a premiar um filme que passa longe do padrão que nos acostumamos a ver entre os indicados. Sinal de novos tempos e novas linguagens na tentativa de reaproximar um público entregue a dinâmica comunicação das redes sociais. Para o amante do cinema que nos acostumamos, a consagração de um filme que foge totalmente à regra, pode soar como algo radical, mas também faz parte de uma dinâmica da Academia de tentar abraçar o diferente. Movimento recorrente, que vai se remodelando ano após ano. Talvez a vitória de Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo represente o movimento mais brusco com relação aos limites do cinema atual. Dentro de uma visão meramente pessoal, é um filme que não me agrada. 

Se a premiação fosse feita apenas por escolhas minhas, Os Banshees de Inisherin levaria o principal prêmio da noite, por ser o mais puro cinema. Sem complexidades. Apenas uma boa história, com boas atuações e uma direção serena. Também me senti contemplado pelo ordinário Triângulo da Tristeza, que pega carona numa tendência de satirização dos milionários e entrega um filme divertido, com momentos marcantes, que poderia ser um pouco mais curto. 

Por mim, o prêmio de melhor direção ficaria nas mãos de Sarah Polley, pelo trabalho em Entre Mulheres. As escolhas da diretora tornam o filme potente, dentro de uma simplicidade de montagem que carrega uma mensagem mais do que necessária. 

Tár é outro filme interessante, com uma atuação soberba sobre um assunto que pouca gente tem conhecimento técnico, o mundo da música clássica. Mesmo assim, a obra prende pela atuação de Cate Blanchett, que dá corpo a uma de mente genial com comportamentos duvidosos (para dizer o mínimo), talhado por relações abusivas. Ao que tudo indica, Blanchett será tri vencedora do Oscar, com muita justiça e sobras. 

Entre justiças e injustiças, destaco aqui a ausência de Mia Goth entre as indicadas a melhor atriz, pela atuação em Pearl, escancarando o preconceito da Academia com filmes de terror. 

Se Paul Mescal foi lembrado entre os indicados a melhor ator por Aftersun, a obra em si foi esquecida entre os principais indicados. Outra injustiça levando em conta as escolhas da lista. Assim como A Baleia, o filme andou com as próprias pernas, em mais uma história de relação entre pai e filha e conquistou a atenção do público, de uma maneira mais sútill.

Entre os estrangeiros, o épico de guerra alemão Nada de Novo no Front desponta como favorito, seguido por Argentina, 1985. Gostei de ambos e o prêmio vai ficar em boas mãos, apesar do meu favorito do coração ser o delicado e devastador Close, filme belga que aborda relações de amizade entre garotos e as consequências dos julgamentos sociais que aparecem logo cedo.

Se para a Academia de Cinema os critérios técnicos são decisivos para as escolhas, o grande barato do Oscar para quem acompanha de fora está justamente em ser surpreendido por obras que estariam longe do nosso ao alcance.

O termômetro do grande público muitas vezes vale mais do que as escolhas técnicas da premiação, chegando até a influenciar nas escolhas. Tanto o badalado A Baleia e o favorito Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo dividem opiniões.

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