A Losartana é um dos remédios mais vendido do Brasil / Pexels
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A Losartana tornou-se o genérico mais vendido do país, evidenciando o avanço silencioso da hipertensão no Brasil. O medicamento ganha espaço porque o país envelhece, se move pouco, dorme mal e chega tarde ao diagnóstico. Sua ação bloqueia o sistema que contrai os vasos e, por ser barato e seguro, domina o tratamento.
Apesar de eficaz, não é uma cura e pode mascarar causas e induzir muitos a tratar a pressão sem investigar a doença subjacente. Especialistas alertam que a prevenção exige rotina, rastreamento e mudanças duradouras em fatores como consumo de sal, peso, qualidade do sono e atividade física.
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Milhões de brasileiros iniciam o dia ingerindo um comprimido de Losartana. Este ritual cotidiano ajuda a explicar o fenômeno de ser hoje o genérico mais vendido do país, superando analgésicos populares.
O domínio absoluto da Losartana não é apenas um efeito do envelhecimento da população, mas revela, segundo especialistas, um país com alta incidência de hipertensão, com prevalência acima da média global, reflexo de falhas nos cuidados primários. Três em cada dez adultos brasileiros têm pressão alta. A nova Diretriz Brasileira de Hipertensão, publicada em 2025, ampliou o grupo de risco ao classificar 12x8 como pré-hipertensão.
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O envelhecimento, o sedentarismo, as metas mais rígidas e um sistema que falha em prevenção explicam parte do avanço da Losartana. A outra parte reside na forma como o país organiza seu cuidado: o Brasil trata, mas não previne.
Para compreender a popularidade do medicamento, é preciso analisar o mecanismo que ele busca equilibrar. Os vasos sanguíneos são regulados pelo sistema renina–angiotensina–aldosterona, responsável por ajustar a pressão e o volume de líquidos.
Quando a pressão cai, o rim libera renina, que ativa a angiotensina I, a qual é convertida em angiotensina II. Este hormônio contrai os vasos, aumentando o volume e a pressão.
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Na hipertensão, esse mecanismo fica hiperativado. É nessa etapa final que a Losartana atua, bloqueando o receptor AT 1. Ao fazer isso, o vaso sanguíneo não recebe a ordem para se contrair.
A fórmula é funcional, segura e previsível. Além disso, é barata, de produção nacional e gratuita no SUS, fatores que aumentam sua adesão.
Apesar de ser o nome mais conhecido, a Losartana não é a única opção. O tratamento é individualizado, pois diferentes sistemas podem estar mais ativados em cada paciente.
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Há três grandes classes de medicamentos de primeira linha no Brasil:
Diuréticos, que eliminam sal e água, reduzindo o volume circulante.
Bloqueadores de canais de cálcio (anlodipina, nifedipina), que relaxam e dilatam as artérias mais finas.
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Bloqueadores do sistema renina–angiotensina–aldosterona (losartana, candesartana e olmesartana), que impedem o efeito da angiotensina II.
A Losartana foi a primeira dessa classe, lançada nos anos 1990. Sua ação é melhor quando a dose é dividida ao longo do dia (25 ou 50 mg a cada 12 horas). Versões mais novas, como candesartana e olmesartana, têm perfil farmacológico mais moderno, com maior duração e eficácia comprovada em dose única diária, o que melhora a adesão.
No entanto, o consenso é que a Losartana não causa dependência nem vicia, podendo ser usada por toda a vida com efeito mantido.
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Sua eficácia e tolerância acabaram por incentivar o uso da Losartana sem avaliação médica. Muitos começam a usá-la por recomendação informal.
O alívio imediato na leitura do aparelho de pressão reforça a sensação de controle, mas a causa subjacente pode permanecer e ser grave. A Losartana pode mascarar problemas como apneia do sono, estenose de artéria renal e feocromocitoma. O número normalizado não significa que a doença tenha sido tratada.
A diretriz de 2025 busca corrigir esse descompasso, reforçando que é necessário reduzir o risco cardiovascular global, incluindo obesidade, diabetes, colesterol, sono, estresse e atividade física, não bastando apenas monitorar o número da pressão.
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A maior parte dos diagnósticos ainda ocorre tardiamente, após o surgimento de sintomas. Há uma lacuna no acompanhamento contínuo, no rastreamento regular nas unidades básicas e na investigação de causas como apneia e hábitos de vida.
Nesse vácuo, a Losartana assume um papel que não deveria ser apenas dela. Muitos pacientes chegam ao sistema de saúde quando o evento cardiovascular já é iminente ou aconteceu.
No uso adequado e sob supervisão, a Losartana não apresenta risco. O risco maior não está no tempo de uso, mas na qualidade da fabricação. O tratamento da pressão é sempre mais seguro do que conviver com ela elevada, já que a hipertensão descontrolada aumenta o risco de infarto, AVC e insuficiência renal.
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Houve apreensão em 2018 devido a recalls de lotes contaminados por nitrosaminas, substâncias com potencial cancerígeno em níveis elevados. O problema estava em processos industriais específicos, não na molécula. Após a revisão de métodos e o reforço da fiscalização, análises de 2025 encontraram zero contaminação nos lotes avaliados.
Quando o remédio é usado sem diagnóstico e sem investigação de causas modificáveis como apneia, estresse crônico ou obesidade, o comprimido reduz os números, mas falha em tratar o motor da doença.
A mudança de hábitos é a medida mais eficaz, exigindo continuidade:
Redução do sal, evitando industrializados.
Aumento do potássio, com frutas e vegetais.
Atividade física regular (150 minutos/semana).
Melhoria da qualidade do sono.
Controle do peso.
Evitar o consumo de álcool.
Gerenciamento do estresse.
Medição regular da pressão.