Metacelular surgiu como uma tentativa curiosa de aliviar a ansiedade causada pela ausência do smartphone / Reprodução/TikTok
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Por incrível que pareça, um pedaço de plástico transparente em forma de celular virou tendência entre jovens que buscam se desconectar — ou pelo menos parecer que estão. O chamado metacelular (ou methaphone, em inglês) surgiu como uma tentativa curiosa de aliviar a ansiedade causada pela ausência do smartphone. A ideia viralizou no TikTok e gerou debates sérios sobre dependência digital, regulação emocional e saúde mental.
Tudo começou com um vídeo publicado pela criadora de conteúdo Cat (@askcatgpt). Nele, Cat aparece na fila de uma loja de bubble tea, rolando o feed de um suposto celular. A surpresa vem logo depois: o aparelho é transparente. “I’m sorry WTF IS THAT?????”, diz a legenda sobreposta no vídeo, que já ultrapassou 50 milhões de visualizações.
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A explicação veio da própria Cat: o objeto misterioso nada mais é do que um pedaço de plástico moldado como um celular, sem nenhuma função tecnológica. A ideia surgiu como um experimento de um amigo da influenciadora, que, preocupado com o vício generalizado em smartphones, quis criar uma alternativa física para ajudar pessoas a enfrentar a abstinência digital.
A proposta, apesar de inusitada, tem base em um conceito antigo da psicologia: o objeto transicional, introduzido pelo psicanalista Donald Winnicott. Segundo a psicóloga Samantha Martin Negrini, entrevistada pela nossa equipe, “o objeto transicional é usado como suporte emocional. Desde a infância, objetos como chupetas ou paninhos com cheiro da mãe ajudam na regulação emocional, e esse princípio pode ser adaptado para o uso do metacelular”.
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A psicóloga explica que, para alguns perfis, segurar um objeto semelhante ao celular pode ser uma forma eficaz de lidar com a ansiedade e a necessidade de contato. “Funciona desde que a pessoa compreenda sua necessidade: se ela precisa do objeto físico para se sentir segura, então pode haver um efeito real na regulação emocional”, afirma.
Negrini compara o uso do metacelular ao de estratégias similares adotadas em outros vícios, como o cigarro: “Alguns fumantes seguram um canudo ou mantêm um maço por perto para amenizar o desconforto da falta. É uma forma de substituir a ação física do vício por algo simbólico, ainda que sem função prática.”
No entanto, ela alerta que isso não serve para todos. “Cada pessoa tem um motivo diferente para recorrer ao celular. Algumas buscam validação social, outras usam como fuga emocional. Por isso, antes de pensar na solução, é fundamental entender qual é o vício real. O metacelular pode ser inútil se a pessoa não reconhecer o prejuízo que o uso excessivo está trazendo à sua vida”, explica.
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Para tratar a dependência digital, segundo Negrini, é necessário ampliar o repertório emocional e social da pessoa. “O primeiro passo é identificar os prejuízos: você está dormindo menos? Está deixando de cumprir tarefas básicas? Isso já é um sinal claro de dependência. Depois, podemos buscar novas fontes de prazer, como atividades físicas em grupo, clubes de leitura, ou qualquer ambiente que ofereça conexão e pertencimento sem a mediação das telas.”
Ela também destaca que cada caso é único: algumas pessoas precisam de uma ruptura completa com o celular, enquanto outras conseguem regular o uso com organização e disciplina. “Criar uma relação mais consciente com o tempo de tela, definir horários, limitar os conteúdos acessados — tudo isso faz parte do processo de cura”, conclui.
O metacelular foi colocado à venda por 25 dólares e, mesmo sendo apenas um pedaço de plástico, esgotou rapidamente. A viralização do produto reacendeu discussões importantes sobre o impacto das redes sociais na saúde mental, especialmente entre jovens. A ideia de segurar algo que simula o celular — sem entregar seus estímulos — é, ao mesmo tempo, simbólica e reveladora.
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Se vai funcionar a longo prazo, ainda é cedo para saber. Mas como aponta Negrini, o mais importante é que a tendência está ajudando muitas pessoas a refletirem sobre seus hábitos digitais. E esse já é um primeiro passo importante para qualquer mudança real.