Região chegou a ser alvo de muitos cenários caóticos, por conta dos constantes conflitos / Lisa from Pexels/Pexels
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No final da década de 1970, uma descoberta no sul do Pará deu início a uma das maiores corridas pelo ouro da história moderna. Serra Pelada transformou-se rapidamente no maior garimpo a céu aberto do mundo, atraindo dezenas de milhares de homens em busca de enriquecimento rápido.
A imagem icônica de um imenso "formigueiro humano", registrada pelas lentes de fotógrafos como Sebastião Salgado, correu o planeta e se tornou um símbolo da época. Este artigo analisa como era a vida nesse ambiente extremo e investiga o que aconteceu com as toneladas de ouro retiradas de suas entranhas.
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A história de Serra Pelada começou em 1979, quando o fazendeiro Genésio Ferreira da Silva encontrou uma pepita de ouro em suas terras.
A notícia se espalhou como um rastilho de pólvora, e em poucos meses, a área foi invadida por uma multidão de homens de todas as partes do Brasil.
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O que era uma serra remota na Amazônia virou uma cratera de aproximadamente 400 metros de diâmetro e 200 de profundidade, escavada com ferramentas manuais.
O governo federal, sob o regime militar de João Figueiredo, interveio na região em 1980 para controlar a extração e a comercialização do metal. A área foi colocada sob a gestão do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) e a segurança ficou a cargo da Polícia Federal, sob o comando do major Sebastião Rodrigues de Moura, o Major Curió.
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O garimpo foi organizado em "barrancos", lotes de terra de 2x3 metros que eram sorteados ou vendidos. O sonho de "bamburrar" – encontrar um grande veio de ouro – movia a todos.
A rotina em Serra Pelada era marcada por condições de trabalho brutais e um ambiente de alta tensão. A vida no garimpo pode ser compreendida por meio de alguns pontos centrais:
Condições de trabalho: Os "formigas", como eram chamados os trabalhadores que carregavam sacos de terra de até 40 quilos para fora da cava, subiam escadas de madeira precárias, conhecidas como "adeus mamãe", sob risco constante de desmoronamentos e acidentes. A violência era endêmica, com disputas por barrancos e ouro frequentemente resultando em mortes.
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Estrutura social: Oficialmente, a entrada de mulheres, bebidas alcoólicas e armas era proibida dentro da cratera. No entanto, nos arredores, especialmente na cidade de Curionópolis, floresceu um universo de prostituição, bares e comércio inflacionado, onde a riqueza recém-adquirida era rapidamente gasta.
Economia e controle: Todo o ouro extraído deveria, por lei, ser vendido exclusivamente à Caixa Econômica Federal (CEF), que instalou um posto de compra no local. Estima-se que, oficialmente, a CEF tenha adquirido cerca de 30 a 40 toneladas de ouro de Serra Pelada. Contudo, o contrabando era massivo, e muitos especialistas acreditam que a produção real pode ter superado as 100 toneladas.
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O auge de Serra Pelada durou até meados da década de 1980. O esgotamento do ouro de superfície, aliado a desmoronamentos cada vez mais perigosos, tornou a exploração manual inviável.
Em 1986, um grande deslizamento de terra soterrou parte da cava, e a mineração foi progressivamente desativada, sendo oficialmente encerrada no início dos anos 1990. A imensa cratera foi inundada pelas chuvas, formando o lago que existe hoje no local.
O destino do ouro de Serra Pelada seguiu dois caminhos distintos. O metal comprado oficialmente pela Caixa Econômica Federal foi incorporado às reservas do Banco Central do Brasil, sendo utilizado para fortalecer a economia nacional e auxiliar no pagamento da dívida externa do país.
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Já o ouro desviado pelo contrabando, estimado em um volume superior ao oficial, foi pulverizado no mercado negro internacional, tornando seu rastreamento impossível. A maior parte da riqueza não permaneceu na região nem transformou a vida da maioria dos garimpeiros, que gastaram seus ganhos rapidamente ou foram vítimas de golpes e violência.
A Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada (COOMIGASP) ainda hoje luta por direitos de exploração mecanizada na área, mantendo viva a memória e a disputa pelo que restou da lenda.
A saga de Serra Pelada representa um capítulo singular na história do Brasil, simbolizando a promessa de riqueza fácil, a exploração humana em condições extremas e a complexa relação do país com seus recursos naturais.
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O ouro oficialmente extraído contribuiu para as reservas nacionais, mas a maior parte da fortuna se perdeu em uma rede de contrabando e gastos imediatos, deixando para trás um lago profundo, histórias de sorte e tragédia, e um legado socioambiental que perdura até hoje.