Antônio Manuel Sobral e José de Oliveira Costa em frente ao restaurante / Isabella Fernandes/DL
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Quem caminha pelo Centro Histórico de Santos logo reconhece os icônicos toldos verdes do Restaurante Washington, em frente à Praça da Alfândega. Ao entrar, o visitante é recebido pelo aroma dos pastéis recém-fritos e por um atendimento cheio de personalidade, onde os garçons chamam os clientes pelo nome e todos se acomodam em pé ou nos bancos do salão, em um ambiente que conserva um charme clássico.
Mais do que um simples ponto de refeição, o Washington é uma verdadeira instituição santista. Com 111 anos de história, o restaurante abre as portas ainda de madrugada, às 5h, e segue em funcionamento até as 21h, servindo de café da manhã a jantar completo. O movimento é constante entre trabalhadores do porto, comerciantes, advogados e turistas dividem espaço com fregueses de décadas, que chamam os garçons pelo apelido e já têm o pedido pronto.
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Se engana quem pensa que o ponto sempre foi um restaurante, o local já foi palco do hotel mais famoso da cidade. O prédio, datado de 1839, abrigou o Hotel Roma e também o Hotel dos Estrangeiros, conhecido por receber viajantes graças à localização privilegiada, próxima ao porto e ao centro.
Mas um grande incêndio em 1914 mudou tudo. O fogo atingiu o Hotel dos Estrangeiros e também a fábrica de fumos União, que funcionava no térreo. Após o incêndio, o espaço foi reformado e deu lugar ao Hotel Washington e, no andar de baixo, ao restaurante que manteve o nome até hoje.
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À frente do restaurante há 33 anos está Antônio Manuel Sobral, de 87 anos. Nascido em Portugal, onde viveu até os 17, ele começou a administrar restaurantes até que, em 1992, decidiu comprar o Washington.
“Eu já gostava do ponto, estava sempre por aqui. Quando surgiu a oportunidade, fiquei com o restaurante”, conta.
Antônio divide a administração com o amigo José de Oliveira Costa, de 69 anos, com quem trabalha há 55 anos. A parceria começou muito antes do Washington, quando José veio do Nordeste: “Eu era garotinho, tinha carteira de menor naquela época e trabalhava para o Toninho”, lembra José, que hoje é responsável por garantir que tudo funcione no dia a dia.
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A rotina começa cedo. “Eu acordo às 4 da manhã e, às 4h15, já estou no mercado fazendo compras. Quando chego, o Liminha já está abrindo”, conta José. “Tem que ter força de vontade, senão não aguenta, não.”
O cuidado se reflete até na relação com os funcionários. “Nosso contador administra 80 bares e restaurantes e sempre diz que poucos pagam os direitos trabalhistas direitinho como a gente. A gente faz questão”, afirma com orgulho.
Entre os rostos mais conhecidos está Florisvaldo Benedito de Lima, o Lima, de 69 anos, garçom há quase 40 anos no local. Ele começou a trabalhar no Washington ainda antes da atual administração, em 1986, e é o mais antigo da casa.
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Outro nome marcante é Maykon Liminha, de 43 anos, que segue os passos do pai e está há 25 anos servindo no salão.
“Tu vê, é uma história bonita. A gente tem gratidão. Isso eu falo até em casa, com minha mãe e minha esposa. Tenho gratidão pelos dois, seu Toninho e o Zé. É um privilégio trabalhar com eles”, reflete Liminha.
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Na cozinha, quem comanda a grelha é Zé Carlos, o cozinheiro mais antigo. Ele começou aos 14 anos, indicado pela irmã, que trabalhava como doméstica na casa de Antônio. Desde então, segue fiel ao patrão e ao tempero que conquista a todos.
Entre os pratos mais pedidos está o filé mignon à parmegiana, que serve até cinco pessoas e custa cerca de R$ 300. Outro sucesso é o Peixe à Belle Meunière, que leva alcaparras, camarão e soutê.
O consumo de carne é tamanho que impressiona. O restaurante vende, em média, seis caixas de filé mignon por semana, cada uma com 25 quilos. Já de contrafilé, é apenas uma caixa no mesmo período. um reflexo da preferência dos clientes pelos pratos mais tradicional do estabelecimento.
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A casa também é famosa pelos pastéis artesanais, feitos com massa produzida ali mesmo. São cerca de 300 unidades por dia, com recheios de carne, queijo, palmito, camarão, carne seca e bacalhau, todos a R$ 12.
“Antes eu comprava carne moída no açougue, mas sempre tinha reclamação. Agora a gente compra a caixa fechada e mói só o que vai usar no dia. Triplicou a venda”, conta Zé.
O cardápio ainda inclui o mistinho, considerado por muitos o melhor da Baixada Santista, em duas versões: o tradicional, de presunto e queijo, e o temperado, com tomate, orégano e cebola. Há também croissants e pratos marcantes, como o Meca Santista, feito com linguado no lugar da meca, camarões grelhados, risoto de pupunha e farofa de banana com abacaxi.
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O Washington abre as portas às 5h da manhã e fecha às 21h, de segunda a sexta.
“Agora, sexta-feira, chegou uma mesa cedo pra tomar café. Tinham ido em cinco padarias, todas fechadas. Aqui a gente já estava pronto, com café, leite quente, pão e misto. Eles adoraram o atendimento e voltaram no almoço”, conta Zé.
A dedicação faz diferença. “Nossos clientes, 90% são conhecidos, amigos da casa. A gente quase não tem freguês de fora”, diz.
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No sábado, o restaurante fecha para a faxina detalhada da copa e da cozinha, preservando o padrão de limpeza que os fregueses mais antigos tanto valorizam.
Com 111 anos de história, o Restaurante Washington segue como um dos pontos mais tradicionais do Centro Histórico de Santos. Entre receitas clássicas e atendimento à moda antiga, o local mantém viva uma rotina que atravessa gerações e reforça a importância de preservar comércios que ajudam a contar a história da cidade.