Política

Câmara de Guarujá tem contas reprovadas por gastos com ‘lindas mulheres’

Procurador do MP apontou uma série de ocorrências de uso indevido do dinheiro público, tais como gastos de uma comissão de vereadores em uma casa noturna em Brasília

Rafaella Martinez

Publicado em 01/08/2018 às 17:58

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TCE julgou como irregular as contas do exercício de 2015 da Câmara de Guarujá / Luiz Torres/Arquivo/DL

O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE) julgou como irregular as contas do exercício de 2015 da Câmara de Guarujá. Durante o julgamento, o procurador do Ministério Público de Contas, José Mendes Neto, apontou uma série de ocorrências de uso indevido do dinheiro público, tais como gastos de uma comissão de vereadores em uma casa noturna em Brasília; configuração irregular do quadro de pessoal; falta de controle de frequência de funcionários e gastos excessivos com horas extras, creditadas inclusive durante o período de almoço dos funcionários, em sua maior parte comissionados.

Um dos casos mais citados aconteceu durante uma viagem de três vereadores a Brasília, em abril de 2015. Um estabelecimento que oferece ‘lindas mulheres’ e ‘apresentação com as modelos mais famosas da revista e TV’ em seu site foi escolhido pelo grupo para despesas com verba oficial durante a passagem.

O Tribunal de Contas constatou que a empresa está cadastrada na Secretaria da Fazenda com o ISS de discotecas e, portanto, não ficou evidenciada a finalidade pública dessa despesasa, sendo o gasto de R$ 440,00 ilegítimo e passível de devolução.

Além disso, o documento destaca a configuração do quadro de pessoal, que na época tinha 37 funcionários efetivos e 75 comissionados. Dos 75 cargos em comissão ocupados, 68 referiam-se ao cargo de Assessor Parlamentar. Somente esse cargo representa 60,7% do total de vagas preenchidas.

Outro ponto é o pagamento excessivo de horas extras, que ultrapassou R$ 1,928 milhão, equivalente a 4,83% do total das despesas da Câmara Municipal de Guarujá em 2015. A análise apontou que a prestação de horas extras aconteceu praticamente em todos os meses, de maneira contumaz e rotineira e não possuía excepcionalidade ou eventual necessidade do serviço.

“Fazia tempo que eu não via um relatório de fiscalização tão extenso como este. São 93 laudas com inúmeros apontamentos sobre o uso incorreto do dinheiro público”, apontou o procurador, acrescentando que “não é possível julgar como regular as contas. Não se gasta dinheiro público em boate de Brasília. Isso é caso de cadeia, de cassação e de demissão e nada aconteceu”.
 
Outra irregularidade apontada foi a gratificação de nível superior para cargo que só pode ser ocupado por quem já tem nível superior. Em outras palavras, o TCE destaca que “não é razoável que um advogado receba o adicional apenas por ser formado em Direito, o engenheiro por ter curso superior em Engenharia, tampouco o contador por ter curso superior em Ciências Contábeis”.

Os recebimentos não possuíam um teto, sendo acrescidos ilimitadamente ao longo dos anos e o cálculo de 10% incidia sobre todos os vencimentos, ou seja: salário base, adicionais, horas extras e gratificações, gerando o chamado efeito cascata.

O uso de veículos oficiais sem registro dos objetivos dos deslocamentos, inclusive em dias e horários não comerciais também foi citado. O julgamento contou com a presença do então presidente da Câmara, Ronald Luiz Nicolaci Fincatti.

Reprodução do site do local de onde teria acontecido a reunião

Em sua defesa

Nicolaci apontou que em relação à viagem da comissão de vereadores, foi entregue uma nota fiscal dentro da legalidade, embora não dentro da moralidade, visto que o estabelecimento não era lícito. “Quando tomamos conhecimento disso, já no final do meu segundo mandato, fiscalizamos todas as nossas notas e não voltou a acontecer algo do gênero”, destaca.

Em relação ao número de cargos em comissão, enfatizou que o número de servidores continua em defasagem, mesmo com a criação do concurso público e em relação às horas extras, destacou que pela falta de servidores e o excesso de trabalho, foi preciso esticar a carga horária dos trabalhadores. “Temos um excesso de trabalho e por isso houve uma demanda de uso excessivo dos servidores. De toda a junção das horas extras feitas, somente pagamos 1/3 delas, pois o restante atingiu o teto constitucional de gastos”, afirmou.

Sobre as horas extras sobre o intervalo de almoço, Nicolaci destacou que certas sessões não são interrompidas e os lanches são feitas no local de trabalho. “Um dos exemplos foi a CPI do Escândalo da Merenda, que ficamos 50 horas. Ainda existe o caso dos motoristas que acabam indo para viagens longas e acabam almoçando durante o serviço”, pontua.

Sobre a gratificação para nível superior, justificou que somente a incorporação desse direito foi pago durante a sua gestão e finalizou destacando que fez diversas ações de economia na Câmara e que se houve algum erro não foi por interesse ou ganho pessoal e sim por falhas inerentes ao ser humano.

Câmara nega apontamentos do TCE e aponta ações

Em nota, a Câmara de Guarujá afirma que a comissão parlamentar, mencionada pelo TCE, esteve em Brasília, entre os dias 14/04/2015 e 15/04/2015, em visita ao Ministério dos Transportes e a Secretaria de Portos com o objetivo de aumentar o recolhimento de impostos referentes à movimentação de navios na região.

De acordo com a assessoria, “o grupo que viajou a Brasília era composto pelos vereadores Mário Lucio da Conceição, Givaldo dos Santos Feitoza e Walter dos Santos”, que afirmam ter almoçado e jantado em estabelecimentos comerciais da cidade, acompanhados inclusive de representantes dos ministérios.

Ainda de acordo com a nota da Câmara, os vereadores citados e o setor financeiro da Casa “manifestaram surpresa quanto à designação da atividade mencionada pelo TCE no que se refere especificamente a uma das notas fiscais apresentadas, de valor de R$ 458,15, atribuída ao estabelecimento denominado Apple’s”.

No caso dos vereadores, pelo fato de afirmarem ter se alimentado, em estabelecimento que serve refeições. E no caso do setor financeiro da Câmara Municipal, sobretudo, pelo fato de a nota de cadastro do referido estabelecimento constar como "restaurante e similares”.

Em relação as demais irregularidades, a Câmara afirma que o atual presidente, Edilson Dias de Andrade, ao assumir a função, em janeiro de 2017, extinguiu todos os gastos com viagens de comissões parlamentares, além de ter atendido integralmente as recomendações do TCE, no que se refere a prestações de contas, assim como ao pagamento de horas extras, gratificações, incorporações e uso de carros oficiais.

Destaca ainda que os pagamentos de horas extras são feitos a servidores concursados e comissionados que batem cartão de ponto, ou seja, que têm controle de horário, afirmando que não procede a afirmação de que foram pagas horas extras a servidores sem qualquer controle de horário.
 
Em relação à gratificação de nível superior para cargo de procurador, também mencionada, destaca que ela foi criada em 1968 e extinta em 2014, sendo posteriormente pagos apenas os valores que se referem a incorporações salariais, efetuados com base em determinação judicial expedida em 2010.
 
Por fim, quanto ao uso de carros oficiais, afirma que ainda antes de 2015, foram instalados GPS's em todos os veículos que atendem o legislativo municipal e sempre houve controle com relação às origens e destinos.

Apontamentos do tribunal

•    Gastos de uma comissão de vereadores durante viagem a Brasília em um estabelecimento comercial chamado “Apple’s” – que oferecia, entre outras coisas, “Lindas mulheres e os melhores shows de Brasília com apresentações”.

•    Pagamento de horas extras no total de R$ 1,928 milhão, inclusive a servidores comissionados que não têm qualquer controle de horário.

•    Gratificação de nível superior para cargo de procurador, por exemplo, que só pode ser ocupado por quem já é graduado em direito.

•    Uso de carros oficiais sem registro das origens e destinos ou objetivos dos deslocamentos, inclusive em dias e horários não comerciais.

 

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