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E a escolha para esta republicação, agora em um só volume com extras, não poderia ser mais acertada. Baseada numa livre adaptação do controverso livro de James Joyce, Finnegans Wake, a história em quadrinhos fala sobre um gângster chamado Veto Skreemer, que vive o tédio de achar que sabe tudo o que vai lhe acontecer.
Publicado em 1939, Finnegans Wake é o último livro de James Joyce, uma ousadia experimental que mistura neologismos em várias línguas. Isso torna sua tradução uma tarefa quase impossível, o que faz do livro uma das obras menos lidas e conhecidas de Joyce. No Brasil, a obra foi publicada com o nome de Finnicius Revém, com tradução dos irmãos Augusto e Haroldo de Campos, nomes importantes do concretismo e experimentalismo literário no país e no mundo.
A obra, que levou impressionantes 16 anos para ficar pronta, no entanto, ainda era um work in progress quando Joyce morreu. O título vem de uma balada que conta a morte de Finnegan, um operário que morre ao cair bêbado de uma escada, mas renasce com uma gota de uísque e acaba dançando no próprio velório.
Em Skreemer, o roteirista Peter Miligan usa a obra como uma das inúmeras referências para contar a história do velho gângster, misturando Joyce com o crime organizado, decadência, livre arbítrio e mais uma quantidade expressiva de “meias palavras” para bons entendedores e leitores, claro.
Mas, o livro de Joyce parece ser mesmo a maior referência, uma vez que a história de Skreemer possibilita inúmeras e interessantes leituras. Publicada originalmente em 1989 como uma série em seis partes, a HQ não conta apenas a ascensão e queda do gângster, mas fala sobre ética e a inexorabilidade do destino. Afinal, temos uma vida determinada previamente ou podemos mudar tudo com um simples ato? Existe o acaso?
Difícil dizer que alguém nunca tenha pensado que sua vida pudesse ter sido diferente se tivesse feito uma curva à esquerda ao invés de à direita. Só isso faz de Skreemer uma das HQs mais ricas e impressionantes em termos de camadas de leitura. Sem dúvida, deve agradar, por isso, aos leitores mais experientes e com um maior número de referências. Claro que isso não deve afastar os outros tipos de leitores de gibi, até porque Miligan é muito habilidoso em contar uma história que possa ser lida por qualquer um. Experimente. Garanto que será diferente de quase tudo o que você já leu em quadrinhos norte-americanos.
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