Polícia

Casos de feminicídios registram 40% de aumento no estado de São Paulo

Em entrevista ao Diário do Litoral, Raquel Galinatti, ex-secretária de segurança de Santos, lamenta o resultado

especialista

Publicado em 17/07/2025 às 07:00

Compartilhe:

Compartilhe no WhatsApp Compartilhe no Facebook Compartilhe no Twitter Compartilhe por E-mail

Segundo especialista, solução está longe de ser alcançada apenas com a criação de novas leis / Nair Bueno/Diário do Litoral

Continua depois da publicidade

O estado de São Paulo registrou aumento de 41% nos casos de feminicídios nos últimos anos. Um levantamento exclusivo do Diário do Litoral, feito com base nos dados da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP-SP), mostra que, a partir de 2020, apenas em 2021 foi registrada uma queda no índice.

Faça parte do grupo do Diário no WhatsApp e Telegram.
Mantenha-se bem informado.

O ano de 2020 teve 179 casos e no ano seguinte foram registradas 140 ocorrências. Em 2022 foram 195 registros contra 221 em 2023, atingindo o alarmante patamar de 253 casos em 2024. Em 2025, até o mês de maio foram 108 casos desse tipo de violência, número ligeiramente menor que o mesmo período de 2024, com 111 ocorrências.

Continua depois da publicidade

Leia Também

• Fisiculturista deixou companheira caída, ofegante e sem conseguir falar após agressão em Santos

• Justiça decreta prisão preventiva para fisiculturista que agrediu namorada

Em entrevista ao Diário do Litoral, Raquel Gallinati, diretora de Comunicação da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol) e ex-secretária de Segurança da Cidade de Santos, lamentou o resultado e afirmou que esses dados mostram o quanto ainda vivemos em uma sociedade na qual o machismo ainda é muito forte.

“Em primeiro lugar, é muito triste presenciarmos que, em decorrência de uma construção equivocadamente machista, ainda vivemos em uma sociedade desigual em relação a homens e mulheres e seus papéis na sociedade”, explica.

Continua depois da publicidade

Em relação à violência contra a mulher, Raquel comenta que se trata de um tipo de crime extremamente complexo e que, muitas vezes, ocorre na clandestinidade.

“Acontece entre quatro paredes, que deveriam ser seguras, mas são os locais mais perigosos para as vítimas: os próprios lares. Os algozes são aqueles pelos quais as mulheres têm uma veneração sentimental e uma devoção. Elas escondem as agressões não apenas por vergonha, mas também pelo instinto de proteção ao agressor”, explica.

Ela comenta ainda que, em média, as vítimas só relatam esse tipo de crime às autoridades de segurança na sétima vez em que ele ocorre. No entanto, grande parte das mulheres que sofrem com a violência doméstica morre antes disso, na metade dessa jornada de sofrimento.

Continua depois da publicidade

“Existe uma romantização da agressão, uma normatização. E o mais triste é que, muitas vezes, ela parte da própria vítima, que acredita que o homem ficou agressivo por culpa dela.”

A delegada define o crime de feminicídio como o ápice da objetificação da mulher — ideia que representa o modo operante do agressor.

“Aquele que se acha proprietário diz: ‘se você não for minha, não será de mais ninguém’. Por isso, muitos feminicídios são cometidos com facadas no rosto, socos no rosto — para que essa mulher se torne uma ‘coisa’. É cruel, áspero.”

Continua depois da publicidade

Para Raquel, a solução está longe de ser alcançada apenas com a criação de novas leis. Segundo ela, é necessária uma reorganização profunda em todas as esferas — familiar, social e cultural.

Raquel define o crime de feminicídio como o ápice da objetificação da mulherRaquel define o crime de feminicídio como o ápice da objetificação da mulher / Crédito: Divulgação

Coleta de dados é recente

“Antes da lei do feminicídio, de 2015, não tínhamos estatísticas de crime de violência contra a mulher. Em 2021 veio a lei de violência psicológica e crime de perseguição. Todos esses crimes eram computados de forma geral e hoje, não podemos falar se houve um aumento ao longo do tempo, pois os dados não eram nem computados”, comenta Raquel.

A delegada comenta ainda que existe uma grande problemática em relação a esse tipo de crime. “Diferente dos crimes patrimoniais, a vítima está nesse papel há muito tempo por causa da perseguição psicológica, que só virou crime recentemente. Hoje a mulher sabe que isso não é normal, mas até 2021 ela acreditava que era normal”, explica.

Continua depois da publicidade

Feminicídio x Homicídio

Raquel explicou também sobre a importância de diferenciar o homicídio do feminicídio.

“Quando uma mulher é assassinada, é o ápice da objetificação e da coisificação da mulher. Esses crimes visam despersonificar a mulher e por isso que elas levam socos e facadas no rosto, por exemplo, para que ela não tenha mais a figura de sujeito de direito e torná-la uma coisa. É cruel, é ácido, é a destruição da personalidade do ser humano, transformar em coisa e ser descartado”, comenta.

O homicídio, por sua vez, está ligado a crimes de disputa territorial de facções criminosas e brigas, por exemplo. “São muito mais crimes de ímpeto do que ações planejadas e premeditadas”, conta.

Continua depois da publicidade

Mudança estrutural é chave contra o feminicídio

Raquel finaliza mostrando que a educação tem um papel fundamental no combate a este tipo de crime.

“Ter na grade curricular o que pode e o que não pode em um relacionamento, a educação familiar, é a sociedade não normalizar atos de agressão ou que possam parecer normais. É uma mudança estrutural. Também precisamos ter em mente que os crimes só são reprovados quando a sociedade também os reprovam. Caso contrário, eles se tornam uma lei morta”, diz.

SSP tem plano de combate ao feminicídio

O Diário do Litoral procurou a SSP-SP para comentar o aumento dos casos. A pasta afirmou, em nota, que a gestão estadual prioriza o enfrentamento à violência e tem medidas e investimentos em prevenção, responsabilização dos agressores e acolhimento às vítimas estão sendo implementados.

Continua depois da publicidade

Entre as ações estão o incentivo à denúncia, o combate à subnotificação e a expansão do atendimento especializado. O Estado conta com 142 Delegacias de Defesa da Mulher (DDMs) e 162 Salas DDMs em plantões com atendimento 24 horas, todos os dias.

Outra prática adotada pela SSP é o uso de tecnologias, como a Cabine Lilás e o aplicativo SP Mulher Segura, que permite o acolhimento da vítima, o registro de boletins de ocorrência e o acionamento de socorro por meio de um botão de emergência.

Por fim, as autoridades também destacam a implantação do movimento SP por Todas, criado para fortalecer a rede de proteção às mulheres no estado.

Continua depois da publicidade

Mais Sugestões

Conteúdos Recomendados

©2025 Diário do Litoral. Todos os Direitos Reservados.

Software