Por ajuste, Dilma desmonta pilares do 1º mandato

Integrantes da equipe econômica querem aproveitar ao máximo esse momento favorável ao ajuste, já que não sabem quanto tempo durará

17 JAN 2015 • POR • 16h43

O segundo governo de Dilma Rousseff ainda não tem 20 dias, mas já registra recuos sobre pilares que sustentaram a política econômica até 2014: a defasagem do preço dos combustíveis, a redução artificial das tarifas de energia elétrica, a política de "campeões nacionais" do BNDES e os programas sociais de apoio aos trabalhadores. Na última sexta-feira, houve outro sinal importante: a Volkswagen reverteu a demissão de 800 funcionários, sem qualquer tipo de ajuda governamental, como era comum no passado recente.

O personagem mais identificado com essas mudanças é o ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Ele afirmou, por exemplo, que os preços dos combustíveis são decisão da Petrobrás, em contraste com a clara subordinação empresarial ao governo existente até o fim do ano passado.

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O recado era, no caso, que a empresa não será forçada a reduzir o preço dos combustíveis por causa da queda na cotação do barril de petróleo.

Levy também fechou a torneira do Tesouro Nacional para o setor elétrico depois de haver defendido, em diversas ocasiões, o "realismo tarifário" para um preço que ficou artificialmente contido nos últimos dois anos.

Seu discurso de posse, centrado no ataque ao "patrimonialismo", mirou bilionários subsídios que o BNDES concedia a empresas "amigas", a conhecida política de "campeões nacionais". Ainda em 2014, o governo elevou o juro dos empréstimos concedidos pelo banco de desenvolvimento, o que trará alívio ao caixa do Tesouro mais adiante.

E, contra a promessa da presidente de não mexer em direitos dos trabalhadores "nem que a vaca tussa", Levy participou da elaboração final das medidas que restringiram a concessão de abono salarial, seguro-desemprego e um conjunto de benefícios previdenciários. Tudo isso sem precisar voltar atrás.

Guinada

Mas ainda é cedo para concluir que Dilma se converteu às leis de mercado. A avaliação de integrantes do governo e de analistas externos é de que essas guinadas são explicadas pelo comprometimento da presidente com o ajuste fiscal.

Não há revisão de posição, e sim uma janela que se abriu para medidas de redução da intervenção estatal na economia provocada pelo seu custo.

Integrantes da equipe econômica querem aproveitar ao máximo esse momento favorável ao ajuste, já que não sabem quanto tempo durará. A rotina tem sido submeter as propostas à presidente e, havendo sinal verde, correr para colocá-las em prática.

Foi assim, por exemplo, na decisão de deixar as tarifas de energia elétrica serem fixadas conforme seu custo. Estima-se que os preços da eletricidade subirão 30% ao longo deste ano, depois de passar os anos de 2013 e 2014 rebaixados artificialmente, à custa de recursos do Tesouro Nacional.

Outro caso é o das medidas trabalhistas. Contrariando o que Dilma havia acertado com as centrais sindicais, elas foram divulgadas sem uma negociação prévia com os trabalhadores. Por duas razões: era preciso editar as Medidas Provisórias ainda em 2014 para a vigência em 2015, e porque havia temor de um recuo da presidente.

"Isso tudo é impressionante, mas eu estaria mais feliz se metade do que o Joaquim Levy diz tivesse saído da boca da presidente", diz o economista Mansueto Almeida, que participou da elaboração do programa de governo do candidato do PSDB à presidência, senador Aécio Neves. Sem estarem associadas à imagem da presidente, avalia, essas medidas ficam fora do contexto político.

Idas

Menos impressionado está o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves. "Existe uma tendência, que atravessa governos, de liberalização em combustíveis, energia e concessões", diz. "Mas há idas e vindas."

No fim do primeiro governo Dilma, por exemplo, a balança pesou mais para o uso desses preços como instrumento de combate à inflação. "Mas essa é uma característica das empresas que têm o governo como acionista."

De toda forma, o analista avalia que esse é um dado importante, assim como ocorreu no caso das tarifas de energia. "Neste primeiro semestre, são importantes os sinais de que a política fiscal vai acontecer", afirma. "Não sou ingênuo de achar que está tudo resolvido, mas o sinal existe."

Um teste importante para as medidas impopulares deste início do governo de Dilma ocorrerá nesta segunda-feira.

As restrições ao abono, seguro-desemprego e benefícios previdenciários serão discutidas entre governo e centrais sindicais, em São Paulo. Participarão os ministros da Secretaria Geral, Miguel Rossetto; do Planejamento, Nelson Barbosa; e do Trabalho, Manoel Dias.

Não será tarefa fácil, já que os sindicalistas pretendem se organizar para pressionar contra essas medidas no Congresso Nacional, onde o pacote será votado a partir de fevereiro.