Dirceu multiplicou negócios após passagem pela casa Civil do governo Lula

O ex-ministro alterou cinco vezes a razão social da JD Assessoria e Consultoria e incluiu no seu escopo de atuação a atividade de lobby para diversos setores com interesses no governo federal

23 DEZ 2013 • POR • 10h34

O ex-ministro José Dirceu multiplicou sua possibilidade de negócios após sua passagem como ministro da Casa Civil do governo Lula. Fora do governo e com o mandato de deputado cassado pelo envolvimento no esquema do mensalão, Dirceu alterou cinco vezes a razão social da JD Assessoria e Consultoria e incluiu no seu escopo de atuação a atividade de lobby para diversos setores com interesses no governo federal.

As mudanças no contrato da empresa incluem o registro de uma filial no Panamá, conforme revelou neste domingo, 22, o jornal O Estado de S. Paulo. A filial tem o mesmo endereço da Truston International, sócia majoritária do hotel St. Peter, que ofereceu o cargo de gerente administrativo a Dirceu, com salário de R$ 20 mil, dez dias após ele ser preso pela condenação no mensalão. No endereço da JD e da Truston funciona o escritório de advocacia Morgan & Morgan, que oferece testas de ferro para abertura das filiais no paraíso fiscal.

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Ao ampliar o escopo de sua consultoria, Dirceu fez fortuna. Sua última declaração de bens pública, apresentada à Justiça Eleitoral em 2001, informa que ele tinha bens e valores que somavam R$ 172,8 mil em valores da época. Somente a casa em que funcionava sua consultoria, em São Paulo, está avaliada em R$ 5 milhões por corretores. Após sua prisão, o imóvel na Avenida República do Líbano, a 300 metros do Parque do Ibirapuera, foi colocado à venda.

A oposição cobrou neste domingo investigação oficial da filial da JD Assessoria e Consultoria no Panamá. "Percebe-se que, a cada dia, surge uma nova descoberta daquilo que seria um grande 'laranjal' arquitetado em torno do mensalão. Isto é gravíssimo, o que exige das instituições, como Ministério Público, Polícia Federal, Receita Federal e Banco Central, que se faça ampla investigação", afirmou o líder do PPS, deputado Rubens Bueno (PR).

Dirceu desistiu do emprego no St. Peter após a denúncia de que a empresa proprietária do hotel tinha um "laranja" como presidente "Isso reforça a suspeita de que o hotel é de propriedade do próprio Zé Dirceu e quem está à frente dele é laranja. Não tem como um hotel ser tão benevolente para oferecer um salário daqueles", disse o líder da minoria, Nilson Leitão (PSDB-MT). "É preciso que o Ministério Público, a Polícia Federal e a Receita Federal façam um rastreamento de todas essas empresas porque aí vai haver uma correlação muito forte. Esse pode ser o caminho para devolver aos cofres públicos recursos desviados. São tantos os laranjas ligados ao PT que se pode formar um pomar", ironizou.

Documentos aos quais o jornal teve acesso mostram que, com as alterações na razão social da JD Assessoria e Consultoria, Dirceu se propôs a "viabilizar o relacionamento institucional de particulares com os mais variados setores da administração pública". Atuou, ainda, em favor de clientes dos setores sucroalcooleiro, minero-siderúrgico e termoelétrico junto a órgãos públicos de fiscalização e de meio ambiente, áreas tradicionalmente dominadas pelo PT.

Enquanto ocupava a Casa Civil no governo Lula, o objeto da empresa - aberta em janeiro de 1998 - ocupava apenas quatro linhas do contrato social: destinava-se a consultoria técnica a empresas, organizações de classe e outras entidades sem relacionar o lobby. Após sua saída do Executivo, o documento foi ampliado para 13 linhas.

Dirceu manteve forte influência no governo federal mesmo fora dele. Em agosto do ano passado, ele foi flagrado pela revista "Veja" recebendo políticos e até o então presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli num quarto de hotel, em Brasília

Entre as alterações na empresa feitas após junho de 2005, quando deixou o governo, está, ainda, a possibilidade de estabelecer parcerias comerciais com países do Mercosul. Essa mudança foi registrada no contrato um mês antes de Dirceu constituir a filial da JD no Panamá, conhecido paraíso fiscal.

A assessoria de Dirceu justificou que o objetivo era prospectar negócios no Panamá. O país, contudo, não está relacionado no objeto da empresa nem tampouco integra o Mercosul.

De acordo com um delegado da Polícia Federal ouvido pela reportagem, que pediu para não ser identificado, geralmente as "filiais" em paraísos fiscais como o Panamá são abertas somente para movimentar recursos financeiros de forma a dificultar o rastreamento do dinheiro. Segundo ele, não é comum abrir um negócio em paraíso fiscal para prospectar negócios.

A última alteração na JD foi feita neste ano, pouco antes de Dirceu ser preso. Ele passou a consultoria para o nome de seu irmão, Luiz Eduardo Oliveira e Silva, que já atuava nos bastidores.

Chefe

Segundo os documentos da empresa, o ex-ministro sempre foi o principal nome da sociedade. Cabia a ele a administração, "sendo responsável, isoladamente, pela prática de todos os atos necessários ou coniventes à administração, orientação e direção dos negócios". Dirceu também tinha poderes para "representar a sociedade perante as instituições financeiras e praticar, em nome da sociedade, os atos que forem necessários".

Para o líder do DEM na Câmara, Ronaldo Caiado (GO), os órgãos de controle demonstram temor em aprofundar as investigações. "Imagina se tivéssemos órgãos fiscalizadores, ou um Congresso mais eficiente e livre para puxar o fio da meada, o que nós não descobriríamos no país? ", questionou Caiado. "Fica claro que a estrutura petista de governar foi criada com o objetivo de montar essas contas em paraísos fiscais, estruturas de financiamento paralelo de campanha e utilização de todos os laranjas que apareceram por aí."