Artigo - 'Aumento' para as polícias de SP: reconhecimento ou marketing?

A recomposição salarial é bem-vinda, mas não vai mascarar todos os problemas da instituição

17 FEV 2022 • POR • 17h42
Raquel Kobashi Gallinati - Divulgação

Por Raquel Kobashi Gallinati

Na última semana, o Governo do Estado de São Paulo anunciou um “aumento” salarial de 20% para os policiais e servidores da área da saúde. O valor seria uma forma de prêmio para as duas categorias, que não tiveram suas atividades interrompidas durante a pandemia do Covid-19, colocando suas vidas e as vidas de suas famílias em risco.
Importante pontuar alguns aspectos desse anúncio para entender como o índice foi concebido, visto que o quadro não é tão bonito quanto o anúncio do governo fez parecer.
A inflação acumulada no período do governo Doria é de 19,43%, logo, o suposto aumento não passa de uma reposição das perdas salariais dos policiais dentro da própria gestão do governador.

Em comparação com os demais estados brasileiros, os policiais civis paulistas estão entre os piores salários, sendo que os delegados recebem a remuneração mais baixa do Brasil. 
Mesmo com o “aumento”, o policial de São Paulo continuará com o seu holerite entre os piores do país, recebendo cerca da metade do valor pago por estados que valorizam seus policiais, ainda que com orçamentos infinitamente inferiores ao paulista.

Nesta realidade angustiante, em que policiais sacrificam seu tempo de descanso e convívio familiar em bicos para complementar a renda, é inegável que 20% a mais no pagamento é um alento.

O dinheiro vai ajudar no aluguel, nas compras de supermercado, no material escolar dos filhos.

Durante três anos de mandato, o Governo paulista não concedeu qualquer tipo de recomposição salarial, supostamente amparado na Lei Complementar 173/2020 do Governo Federal, que vetou aumento salariais até o final de 2021.

Apesar de impedir aumentos, a legislação não vetou a reposição da inflação, desde que o orçamento do estado permitisse. Vale lembrar que o superávit orçamentário do Governo paulista é a principal bandeira do secretário da Fazenda e Planejamento, Henrique Meirelles.

Mais uma vez, fica a dúvida sobre a real motivação do Governo, ao oferecer, recomposição salarial de 20% para policiais e servidores da saúde e 10% para os funcionários de todas as demais áreas do funcionalismo.

O anúncio ocorre em fevereiro e será efetivado a partir de 1 de março, exatamente um mês antes da data que João Doria deverá abandonar o cargo para o qual foi eleito pelos paulistas para tentar galgar mais um degrau em sua carreira política, como candidato à Presidência da República.

A Polícia Civil de São Paulo continua com um déficit de mais de 15 mil cargos vagos, com equipamentos obsoletos e viaturas e distritos deteriorados. 
A recomposição salarial é bem-vinda, mas não vai mascarar todos os problemas da instituição. Como reforço financeiro, a medida recupera as perdas dos últimos 3 anos, como jogada de marketing, os servidores não serão ludibriados mais uma vez.

* Raquel Kobashi Gallinati, Presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (Sindpesp); diretora da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol do Brasil) e vice-presidente da Federação Nacional dos Delegados de Polícia Civil (Fendepol)