Artigo - Dissonância cognitiva

Até quando vamos continuar sendo reféns das nossas crenças limitantes, da nossa miopia de conhecimento?

4 FEV 2022 • POR • 06h06
Célio Dias Sales, advogado - DIVULGAÇÃO

Por Célio Dias Sales *

Acredito que todo brasileiro que tenha um mínimo de bom-senso está incomodado com todas essas questões envolvendo saúde pública, política partidária e, principalmente, divergência de opiniões sem maiores fundamentações, por vezes alicerçadas muito mais no fanatismo, em determinada e ultrapassada ideologia, do que na análise sensata das situações que nos são colocadas no dia a dia. 

Há, por exemplo, a turma da vacina que salva e, do outro lado, o pessoal que é contra esse método de proteção cientificamente comprovado. Existem os que querem Luiz Inácio Lula da Silva como próximo presidente do país e estes defendem que Lula e o PT são vítimas das circunstâncias políticas. E o que falar de Jair Messias Bolsonaro que é tido por tantos outros como o “Salvador da Pátria”, o “Enviado de Deus”, honesto, cuja agressividade diária e constante visa apenas e tão-somente combater a quebra de um perverso sistema de corrupção no nosso país. 

Em tempo, e por amor a argumentação, só menciono “Lula” e “Bolsonaro” porque ambos são os grandes polos de divergência da nossa política atual e se encaixam perfeitamente ao objetivo deste texto.

De minha parte troquei o incomodo mencionado acima, pela jornada da busca pelo entendimento a todo esse radicalismo de direita, de esquerda, dos que tomam e dos que se negam a tomar vacina e, para minha felicidade, encontrei nos estudos de Leon Festinger, nascido em Nova Iorque, no ano de 1919, a resposta que ao menos trouxe para mim, e espero que leve a você também querido leitor, uma resposta totalmente condizente e científica ao que estamos vivenciando no Brasil e no resto do mundo, até porque o extremismo político e religioso se estende por todo o globo terrestre. 

Festinger, na condição de psicólogo e cientista, cunhou o termo que é título desta matéria para descrever a tensão interna que sentimos quando, entre outras coisas, nossas crenças são desafiadas pela evidência. Também no livro “O Princípio da Caixa-Preta”, o filósofo e colunista da Times e comentarista da BBC, Matthew Syed, aborda a dissonância cognitiva de maneira similar, asseverando: “Quando nos confrontamos com uma evidência que desafia nossas crenças mais profundas, é mais provável que reenquadremos a evidência do que mudemos nossas crenças. Simplesmente inventamos novas razões, novas justificativas, novas explicações”.

Neste sentido, é necessário indagar sobre qual é o nosso verdadeiro papel na sociedade em que vivemos e até quando vamos continuar sendo reféns das nossas crenças limitantes, da nossa miopia de conhecimento, até porque somos bombardeados de informações, mas nos dedicamos muito pouco ao estudo dos temas que nos são propostos pela vida.

Na questão política, por exemplo, são sempre os mesmos, com repetidos discursos, conversas, promessas e bravatas e, apesar disso, alguns continuam a “crer” que Lula é honesto e a única solução para a classe menos privilegiada da sociedade e, noutra esteira, o Bolsonaro é um injustiçado, perseguido pela mídia escrita e televisiva.

Em síntese, voltando à ciência e à filosofia, temos duas opções descritas por Syed para enfrentar essas e tantas outras questões dissonantes nas nossas vidas. A primeira é aceitar que nosso julgamento original pode ter sido um engano e, neste sentido, talvez tenhamos que encarar o nosso ego, o orgulho e a nossa assombrosa arrogância ou, a segunda alternativa: negar! Nesta hipótese, seguiremos com a consoladora presunção de que sempre estivemos com a razão, ou seja, estamos absolutamente certos! Não fomos enganados! 

Enquanto isso, nosso país afunda no atraso político, econômico e social, vamos nos perdendo e caminhando sem objetivo e principalmente sem um mínimo de conhecimento. E como dizem por aí, quando não sabemos para onde ir, qualquer caminho – ou no caso qualquer candidato – serve!

* Célio Dias Sales, advogado