Vô Chico faz sucesso com arte feita à mão

Feliz com o reconhecimento pelo trabalho, Vô Chico está mais empolgado. Página no Facebook já tem 2 mil curtidas.

8 JUL 2019 • POR • 09h54
Aos domingos ele expõe na feira de Vicente de Carvalho. - NAIR BUENO/DIÁRIO DO LITORAL

Com 94 anos completados em junho, Sigeru Tamotu, mais conhecido em Guarujá como Vô Chico, apelido dado pelo neto, tem feito sucesso por onde passa. Mas, nem sempre foi assim. A história de vida do Vô Chico começa no interior de São Paulo, em Piracicaba, onde nasceu. Foi lá que ele aprendeu, quando criança, a transformar madeira em obra de arte. Puxou o talento do pai, exímio artesão e mentor do ofício.

Na juventude mudou-se para Anhembi, outra cidade interiorana que conquistou o coração dele. Margeada por um Rio Tietê ainda limpo, Vô Chico passava os dias pescando o sustento da família. Mas, a chegada dos três filhos com a esposa que ele honra há 40 anos, tornou a pesca insuficiente para a subsistência. Foi então que uma nova oportunidade surgiu em Guarujá.

"Meu cunhado tinha uma barraca de legumes na feira e me chamou para trabalhar com ele. Eu aceitei e mudamos pra cá. Gosto de Guarujá mas sinto falta do interior", conta Vô Chico com lucidez e memória admiráveis.

Em meados de 1990 a aposentadoria chegou e o tempo livre fez ressurgir o hábito da infância: dar vida a pedaços de madeira. Vô Chico comprou ferramentas e voltou a passar os dias esculpindo utensílios de massagem e de cozinha, como tábuas de carne, modelos variados de talheres, suporte para aperitivos, kit quebra caranguejo e siri, e outros produtos de encher os olhos.

As vendas eram realizadas pelas feiras livres da cidade e para amigos próximos. Essa rotina se mantém há mais de 20 anos, mas a falta de valorização do trabalho artesanal e um estoque de mercadorias que mal cabia na garagem de casa fez Vô Chico desanimar.

"As pessoas no Brasil não valorizam o que é feito à mão, o que leva tempo para ser produzido. Aí levava as peças para expor na feira e quase ninguém comprava", conta Vô.

Preocupada com o desânimo do patriarca, a família teve uma ideia no fim do ano passado: montar uma página para o Vô Chico no Facebook (Vô Chico Artesão) e publicar fotos dos trabalhos dele. Deu certo. O sucesso das postagens foi tão grande que mais da metade do estoque foi vendido só em janeiro e a página já soma mais de 2 mil curtidas.

Foi preciso até um novo post agradecendo a procura e pedindo um pouquinho de paciência porque Vô Chico não estava dando conta de tantos pedidos, alguns vindos até do Rio de Janeiro.

ROTINA

Feliz com o reconhecimento pelo trabalho, Vô Chico se animou e segue firme na rotina. Todos os dias ele acorda às 6h, busca pão e prepara o café dele e da esposa acamada.

Às 8h começa a produção na pequena oficina no quintal de casa. Vez ou outra tem ajuda do filho Roberto Yukishigue Tamotu para cortar no maquinário manual pedaços de madeira maiores ou mais pesados.

Já o acabamento das peças é sempre feito pelas próprias mãos. "Essa é a parte que dá mais trabalho. Preciso ter muita precisão e concentração porque os detalhes fazem toda a diferença", explica, enquanto mostra uma colher toda em madeira que, segundo ele, foi uma das peças mais demoradas pela exigência no acabamento.

Às 11h é hora de fazer o almoço. Depois de um descanso, Vô Chico volta para a produção da tarde e segue trabalhando até as 17h. Ele diz que hoje o fôlego é menor, mas mesmo assim ainda consegue produzir uma tábua de carnes em cerca de três horas.

Aos domingos, leva os produtos para expor na feira de Vicente de Carvalho, lugar onde ficou famoso e concorrido. E no próximo dia 21 (domingo), Vô Chico participa do Bazar de Mulheres Empreendedoras, evento que reúne artesãos e pequenos comerciantes na Rua Luiz Felipe Machado, 181, no Jd. Santa Helena.

COMPRE DE QUEM FAZ

Em sua oficina, uma placa talhada em madeira, diz: "compre de quem faz". Parece inocente, mas ela faz repensar os motivos que fazem milhares de pessoas se amontoarem em grandes lojas de utensílios para casa que inauguram na região, mas ignorarem quem produz, de fato.

E se há quem diga que quem faz com as mãos, faz também com o coração, ver a forma como Vô Chico trata suas obras, não deixa dúvida disso.