Constituição é clara ao vetar prisão em 2ª instância, dizem especialistas

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi condenado no caso tríplex a 12 anos e 1 mês de prisão pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro

26 MAR 2018 • POR • 19h01
Especialistas afirmaram que a Constituição é tão clara quanto equivocada ao vetar a prisão após condenação em segunda instância - Divulgação/Fotos Públicas

Em debate, especialistas em direito afirmaram que a Constituição é tão clara quanto equivocada ao vetar a prisão após condenação em segunda instância. O evento na Fundação FHC em parceria com o site "Jota" ocorreu nesta segunda-feira (26), horas antes de o TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) negar mudança na decisão que condenou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no caso tríplex e abriu caminho para a determinação da prisão do petista.

Segundo Nino Toldo, desembargador do TRF-3 (SP e MS), "do ponto de vista teórico, não vejo sentido algum em, uma vez que a pessoa tenha sido condenada em primeiro grau e confirmada a condenação em segundo, que ela aguarde o trânsito em julgado. Porque não existe relação lógica entre presunção de inocência e trânsito em julgado do ponto de vista do processo penal".

"Agora, não posso negar. A Constituição diz claramente lá que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado. Então, se a interpretação for literal, não tem jeito. A Constituição está errada. É um equívoco lógico", sustentou Toldo.

O professor da FGV e colunista da Folha de S.Paulo Oscar Vilhena Vieira disse que "a Constituição é razoavelmente clara. Ela diz trânsito em julgado". Ele, contudo, questionou a Carta. "Não existe democracia no mundo em que a execução, ainda que provisória, não se dê pelo menos na segunda instância. Todos os tratados internacionais de direitos humanos trabalham com o duplo grau de jurisdição."

Kenarik Felippe, desembargadora do Tribunal de Justiça de São Paulo, criticou o Supremo Tribunal Federal pela hesitação em decidir a questão de forma impessoal, portanto, não o caso específico de Lula.
"É incompreensível por que não colocar a questão geral em pauta. Por que a ministra do Supremo [Cármen Lúcia] se recusa, vai na televisão, dá entrevista como se fosse a única pessoa naquele quadro de 11 a poder fazer uma negativa de um determinado tema, como se isso fosse a salvação da pátria", disse.

"O Judiciário está plantando tempestades. O que pode se agravar porque o Supremo não está cumprindo sua função. A Constituição de 1988 trouxe promessas e princípios para serem realizados, não era para ficarem lá de enfeite."

O texto, ela disse, é explícito. "Tem questões que a gente até fica em dúvida. Nesse caso é muito claro: trânsito em julgado. Pronto, não tem muito mistério."

Marivaldo Pereira, auditor federal de finanças e controles e ex-secretário de Reforma do Judiciário, concordou que a arbitrariedade em relação à pauta de julgamentos de ações no Supremo distorce o papel da Justiça.

"Poder decidir quando posso levar um processo à pauta é decidir qual processo vai prescrever ou não."
"Parte dos ministros muda a postura entre o garantismo e o punitivismo", disse. Pereira criticou "aqueles que, lá atrás, defendiam até o episódio de um grampo absolutamente ilegal [pelo juiz Sergio Moro de Lula]".

"Sem ser chamados aos autos, vieram a público dizer que aquilo era coberto pela legalidade e hoje têm postura diferente. Quando há politização você não sabe onde está a razão", concluiu.