‘Condutores não sabem dirigir nas rodovias’, diz especialista

Na Semana Nacional do Trânsito, acidentes recentes nas estradas que ligam a Baixada Santista à região Metropolitana de São Paulo levantam debate sobre a qualidade da formação oferecida aos condutores no País

17 SET 2017 • POR • 10h31
Pouco tempo depois uma mulher morreu ao ser vítima de um acidente envolvendo um caminhão e um carro na Via Anchieta - DIVULGAÇÃO / CORPO DE BOMBEIROS

São vários os fatores que acabam por vitimar milhares de pessoas nas estradas do País. Se por um lado o Departamento de Estradas e Rodagem (DER) aponta o excesso de velocidade como o vilão das rodovias, há os que vão mais a fundo na questão e levantam dúvidas sobre a qualidade na formação dos motoristas. Diante da triste realidade das vidas que viraram estatísticas, a Semana Nacional do Trânsito levanta o debate.

“Todo processo de habilitação atual é pensado para o espaço urbano e não para rodovia. Não somos treinados para conviver com o espaço rodoviário onde as velocidades são mais altas e os veículos de cargas se tornaram gigantescos e potentes”, afirma o especialista em educação para o trânsito Leandro Biavati.

Na visão dele, o processo de habilitação melhorou nos últimos anos, mas ainda é deficitário, desigual e tem custos elevados. “Na Europa existe um processo que se chama ‘habilitação graduada’, onde a pessoa tem uma primeira habilitação que permite que ande pela cidade, depois a distância aumenta e assim por diante. Aqui o processo já permite que pegue qualquer estrada. Rodovias e ruas são completamente diferentes e aqui ninguém é preparado para isso. Uma coisa é o carro apresentar um problema na estrada e outra coisa é esse mesmo problema acontecer na rodovia sem acostamento. Não se fala disso, pois no nosso atual processo isso não é importante, mesmo em um cenário onde metade das mortes no trânsito no Brasil acontece na rodovia”, analisa o especialista.

Dois acidentes recentes nas estradas que ligam a Baixada Santista com a região metropolitana de São Paulo corroboram com essa visão. No primeiro caso, um motorista caiu de uma altura de 170 metros após ser atropelado e arremessado de um viaduto no trecho de serra da Rodovia dos Imigrantes. Por conta de um problema mecânico, o condutor parou na faixa da esquerda da rodovia e foi atingido por um veículo que vinha atrás.

Em outra ocorrência, dias depois, uma mulher de 65 anos morreu ao ser vítima de um acidente na Via Anchieta, em Cubatão. Ela estava no banco traseiro de um carro que era pilotado pela filha quando foi atingida por um caminhão. O carro estava parado na pista 1 (da esquerda), na altura do quilômetro 59, porque a motorista havia se perdido.

Ambas as situações fazem parte teoricamente da formação dos motoristas, porém não são colocadas em prática nas rodovias.

Para Biavati, é preciso um amplo debate sobre as soluções para o problema. “Não basta aumentar a carga horária, pois isso vai encarecer ainda mais o processo. A questão é mais profunda, pois no mundo ideal as aulas de moto aconteceriam nas ruas, por exemplo, pois da forma como acontece hoje é ridículo. No entanto, se acontecer um acidente no meio da aula quem responderá por isso? É preciso um amplo debate para equacionar essa questão”, argumenta.

Melhorias

A Comissão de Viação e transportes da Câmara dos Deputados analisa dezenas de propostas de melhorias no processo de habilitação.

Outra medida tomada para melhorar a qualidade técnica dos condutores é trabalhar para evitar trapaças durante o processo de formação. A partir de amanhã, as 4.500 autoescolas do Estado de São Paulo terão de usar um novo aparelho para evitar fraudes nos exames do Detran (Departamento Estadual de Trânsito).

O órgão constatou que uma fraude comum é a aplicação de dedo de silicone para burlar as digitais de quem faz a prova. “O novo sistema vai eliminar isso”, afirmou o diretor-presidente do Detran, Maxwell Vieira.

Segundo Vieira, o novo sistema reconhece a temperatura corporal e os batimentos cardíacos do usuário, e detecta digitais impressas em papel, silicone ou borracha. Além dos alunos e instrutores, médicos, psicólogos também são obrigados a usar a nova biometria.

Cresce o número de multas por excesso de velocidade

O número de autuações por excesso de velocidade no Sistema Anchieta-Imigrantes (SAI) cresceu 65% no primeiro semestre deste ano em relação ao mesmo período do ano passado. O excesso de velocidade é o principal fator apontado pelo Departamento de Estradas de Rodagem (DER) para acidentes nas estradas.

O aumento mais significativo ocorreu na Rodovia dos Imigrantes. Em junho, por exemplo, o DER registrou 38.863 multas por excesso de velocidade. Em junho do ano passado foram 9.854.
De acordo com o DER, os radares são implantados após a realização de estudos técnicos que apontam onde há ocorrência de excesso de velocidade.

Na visão de Biavati, é essencial pensar em mecanismos para controle da velocidade. “A questão é decisiva, pois é matemática: quanto maior a velocidade, maior a gravidade das lesões“, finaliza.