Em Moscou, Temer e Putin defendem agenda oposta à de Donald Trump

'O Brasil é um parceiro chave da Rússia', disse Putin, que enfatizou os 'aspectos econômicos' da relação entre os países

21 JUN 2017 • POR • 14h00

Brasil e Rússia anunciaram acordo para tentar alinhar objetivos de política externa, adotando posições contrárias às defendidas pelos Estados Unidos sob Donald Trump.

Os presidentes Michel Temer e Vladimir Putin encontraram-se no Kremlin e assinaram declaração conjunta chamada "Diálogo estratégico", na qual defendem o combate ao aquecimento global como "inadiável" e a solução de dois Estados para o conflito entre Israel e Palestina -para ficar em dois exemplos de antagonismo a Trump.

"O Brasil é um parceiro chave da Rússia", disse Putin, que enfatizou os "aspectos econômicos" da relação entre os países.

"Renovamos a parceria estratégica", disse Temer, que, como seria previsível, não citou suas dificuldades internas em declaração à imprensa. Ao contrário, exaltou "o compromisso do governo com a agenda de reformas", ignorando a derrota de terça (20) na tramitação da reforma trabalhista. "Tal como Rússia, o Brasil voltou a crescer", disse -ambos os países tentam deixar recessões.

No campo externo, não que sejam posições políticas novas para os dois países, mas inédito é o contexto político americano e a declaração conjunta em si.

O isolacionismo de Trump é atacado de forma indireta, com a exortação do sistema multilateral e das instituições internacionais.

A resolução de conflitos por meio de organismos como a ONU é considerada "imperativa" na declaração, em oposição ao unilateralismo bélico de Trump, já demonstrado na Síria e Afeganistão.

Os países também concordaram com o processo de tentativa de solução da guerra civil síria largamente comandado pelo Kremlin, com aval da ONU. O apoio brasileiro já existia, mas foi formalizado e ocorre numa semana em que a Rússia anunciou a virtual criação de uma zona de exclusão aérea no país árabe, onde atua em favor da ditadura local desde 2015, ameaçando abater aviões americanos.

"Defendemos uma segurança igual, e não dividida, para todos", afirmou Putin.

Os russos novamente manifestaram apoio à entrada do Brasil num Conselho de Segurança reformado, o que até aqui não significou políticas objetivas.

Não deixou de ser irônico o pedido de esforço mútuo no combate à corrupção, dada a avalanche de denúncias contra Temer e seu governo e os recentes protestos em massa contra Putin na Rússia, por esse exato motivo.

No campo econômico, foram assinados atos concretos que visam melhorar a corrente de comércio entre os países, que está em irrisórios US$ 4,3 bilhões anuais. Não houve nenhum ato concreto, além de conversas conjuntas, sobre o principal produto que Brasil exporta para a Rússia, carne bovina.
"Após uma queda no ano passado, as trocas comerciais estão crescendo", afirmou Putin, que citou interesse energético das gigantes Rosneft (petróleo) e Gazprom (gás).

Os russos se comprometeram a negociar cooperação tecnológica na área nuclear, visando fazer um depósito decrementos radioativos da usina de Angra 3, paralisada no escopo dos escândalos apurados pela Operação Lava Jato, e eventual instalação de novas unidades no Brasil.

Embora não fabriquem mais reatores do modelo que explodiu em Tchernobil (então na União Soviética, hoje Ucrânia) em 1986, os russos têm tido sucesso limitado em exportar essa capacidade técnica.

"Queremos novas alianças tecnológicas", disse o russo, que se ofereceu para lançar foguetes da base de Alcântara (MA) e ajudar o Brasil a desenvolver seu lançador de satélites, programa que rasteja desde 2003. Temer, por sua vez, se disse interessado em ampliar testes do sistema Glonass, o GPS russo, que tem quatro bases no Brasil.

Os presidentes assinaram cinco atos em seu encontro.