Lula / Rovena Rosa/Agência Brasil
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Ações da equipe da Polícia Federal escolhida para realizar a segurança do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) durante a eleição de 2022 têm gerado mal-estar dentro da corporação.
Um ofício enviado pelos delegados para superintendências com pedido de apoio para viagens do petista, revelado pelo jornal Folha de S.Paulo na terça (9), virou ponto de discussão interna e provocou reação do diretor-geral da PF, Márcio Nunes.
Segundo relatos, o documento encaminhado para chefias da PF nos estados foi considerado fora do tom.
O texto, que critica a política armamentista do governo Jair Bolsonaro (PL), também fala em opositores radicalizados. O documento pede ainda apoio das superintendências para acompanhamento de Lula em viagens nos estados.
A segurança de Lula tem como responsáveis os delegados federais Andrei Augusto Passos Rodrigues, Rivaldo Venâncio e Alexsander Castro Oliveira. Rodrigues é o coordenador, Oliveira, o chefe operacional, e Venâncio, o operacional substituto.
Segundo pessoas ligadas ao trio, o cenário atual é preocupante e todos os esforços precisam ser feitos para proteger os presidenciáveis na campanha, especialmente Lula, por ser o que foi classificado com maior risco.
Essas pessoas também afirmam que o documento foi enviado para 27 superintendências e apenas uma apresentou queixas. Elas atribuem o mal-estar a pessoas contrárias ao PT.
De acordo com relatos colhidos pela Folha de S.Paulo, o conteúdo foi mal recebido por setores técnicos e também por parte da cúpula da Polícia Federal por três motivos principais:
1) a quantidade de policiais solicitada foi considerada sem justificativa ou embasamento técnico;
2) o texto foi considerado com teor político;
3) o tom foi visto como inapropriado por trazer orientações de coordenadores para superintendentes, que estão acima na hierarquia do órgão.
No caso do Distrito Federal, que já foi visitado por Lula durante a pré-campanha, o chefe da PF regional reagiu ao ofício.
Como resposta, o superintendente da corporação no DF, Victor dos Santos, redigiu um documento com 13 perguntas para o setor responsável pela proteção de candidatos, a CPP (Coordenação de Proteção à Pessoa), que fica na Direx (Diretoria-executiva).
"Cabe à equipe de segurança determinar as superintendências, de forma inaudita, o quantitativo a ser empregado e os meios a serem empregados?", questionou Santos.
Como resposta, a Direx afirmou que, nos casos em que houver necessidade de apoio para as equipes de proteção aos candidatos, quem deve fazer isso é o chefe da CPP em contato direto com os superintendentes.
Após o desentendimento entre a equipe de Lula e o superintendente no DF, houve uma reunião ordinária da direção-geral da PF com todos os superintendentes.
Na ocasião, o diretor-geral, Márcio Nunes, pediu desculpas aos presentes e afirmou que episódios semelhantes, de coordenadores da segurança de candidatos determinando missões para as chefias regionais, não se repetirão.
As críticas sobre a atuação dos delegados responsáveis por Lula têm tido como principal alvo Andrei Rodrigues, coordenador do grupo. Ele fez a segurança da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), em 2010, e era próximo do ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo.
Internamente, a leitura é que o delegado busca se posicionar para ser um possível candidato a diretor-geral da PF caso Lula vença a eleição.
Ele foi escolhido na reta final do processo de definição de equipes, historicamente composta por apenas dois delegados.
Na véspera da oficialização, a PF decidiu criar um terceiro posto, por causa do alto risco de segurança conferido à candidatura de Lula e para aplacar a desconfiança existente de petistas com o órgão.
Desde o início do governo, a PF foi jogada para dentro da política e vem sofrendo desgastes pela forma com que Bolsonaro tenta usar a corporação.
Diante do contexto delicado, a direção da PF resolveu fazer flexibilizações, permitindo que a escolha da segurança fosse feita de maneira conjunta com o partido dos presidenciáveis.
As ações seguintes, no entanto, não atenderam às expectativas internas da cúpula da PF, no sentido de que o processo amistoso resultasse numa relação melhor com as campanhas.
Segundo pessoas ouvidas no órgão, a percepção é a de que a equipe de Lula tem agido de maneira independente, o que tem causado atritos.
Na semana passada, o grupo de delegados responsável pela proteção do petista faltou num curso realizado para chefes de núcleos responsáveis por dignitários.
O evento tinha como objetivo finalizar o processo de preparação para a operação. Todos os outros responsáveis por presidenciáveis estavam presentes.
O mal-estar atingiu também pessoas na direção. Parte da cúpula tem responsabilizado Sandro Avelar, diretor-executivo, por ser excessivamente permissivo com a equipe de Lula.
Tanto do lado de pessoas próximas dos delegados que cuidam do petista como de Avelar a resposta tem sido a mesma: o cenário é muito preocupante, todo cuidado é pouco e o número de pessoas mobilizadas tem de ser sempre o maior possível para evitar qualquer problema.
No documento enviado às superintendências e que desencadeou o mal-estar, os delegados da equipe de Lula traçam um cenário alarmante e falam que o momento é inédito na democracia brasileira.
"O contexto político e social no qual se realizará a operação de segurança é composto por, entre outras adversidades, opositores radicalizados e acesso a armas de letalidade ampliada decorrente das mudanças legais realizadas em 2019", diz trecho do ofício, numa referência às normas editadas por Bolsonaro que facilitaram o acesso a armamentos pela população.
Os delegados também abordam no ofício as "ameaças de morte ao candidato e a representantes dos partidos, bem como a perpetração de atos de intimidação e violência, identificados antes do início da campanha, como o atentado ao ônibus da caravana ao ex-presidente Lula, alvejado em maio de 2018 na cidade de Quedas do Iguaçu e Laranjeiras do Sul/PR".
A reportagem procurou a PF, mas o órgão não se manifestou.