Brasil
Além disso, em nome de questões morais e religiosas, alguns protocolos de atendimento são quebrados, como o direito à confidencialidade e à privacidade nas consultas médicas
O acesso das mulheres a contraceptivos no país é influenciado por correntes religiosas e grupos conservadores / Divulgação
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O documento, divulgado esta semana pela Federação Internacional de Planejamento Familiar/Região do Hemisfério Ocidental, aponta que a influência desses fatores na escolha dos métodos contraceptivos se dá porque as mulheres não têm acesso à informação nem a políticas públicas de educação sexual.
A pesquisa foi realizada no fim de 2015 e ouviu 20 especialistas de cada país, dos setores público e privado. No Brasil, o estudo foi coordenado pela organização não governamental (ONG) Cepia, que se dedica ao desenvolvimento de projetos que promovem os direitos humanos e a cidadania de grupos vulneráveis.
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Interferência
De acordo com a socióloga da Cepia Jacqueline Pitanguy, muitas vezes, a influência religiosa determina a escolha de um método contraceptivo e até impede o cumprimento da Lei de Planejamento Familiar, que prevê, por exemplo, a vasectomia e a ligadura de trompas como instrumentos de programação de um casal. Em alguns casos, segundo a representante da Cepia, até profissionais de saúde – motivados por valores morais pessoais e crenças religiosas – interferem na tomada de decisão das mulheres sobre essa escolha.
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Além disso, em nome de questões morais e religiosas, alguns protocolos de atendimento são quebrados, como o direito à confidencialidade e à privacidade nas consultas médicas, que também é garantido por lei a adolescentes, mas descumprido quando os profissionais condicionam o atendimento à presença da mãe ou outro adulto.
“Isso fere o protocolo e mostra uma moral incriminatória que, imediatamente, freia o que é o objetivo precípuo desse atendimento, que é fornecer à jovem informação contraceptiva, acesso a meios para que ela possa, por exemplo, evitar uma gravidez na adolescência, que é uma coisa muito séria no Brasil”, pondera a socióloga.
A interferência se dá, segundo Jacqueline, por causa da ausência de disciplinas sobre saúde sexual e reprodutiva nos currículos escolares do país. Para a socióloga, a educação sexual tem a ver “com cidadania, com projeto de vida, de liberdade” e não pode ser limitada ao ensino de questões biológicas.
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De acordo com o relatório, de modo geral, os cinco países analisados tratam os temas de direitos sexuais e reprodutivos de forma limitada em campanhas de saúde. No Brasil, por exemplo, as campanhas públicas sobre o tema são quase sempre restritas ao período do carnaval e voltadas especificamente para a prevenção de HIV/Aids. “Apesar de termos alcançado pontuação elevada no que se refere a protocolos, normas, mesmo a leis com relação à saúde reprodutiva e sexual, nós não fazemos campanhas de sensibilização da população sem ser aquela coisa pontual de carnaval, Aids, camisinha”, critica Jacqueline.
Vírus Zika
O relatório destaca a necessidade de reforço das políticas de planejamento familiar em função do vírus Zika, que provoca malformações em bebês. Logo após o auge a epidemia da doença, em 2015, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos emitiu recomendações sobre a ampliação do acesso à contracepção, principalmente entre as mulheres mais pobres, mais vulneráveis à contaminação pelo vírus, transmitido pelo Aedes Aegypti. Além disso, a ONU apontou a necessidade de revisão das leis sobre o aborto por causa da doença.
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Segundo Jacqueline, as diretrizes não foram acolhidas pelo Brasil, que concentrou os esforços no atendimento às famílias de bebês que nasceram com microcefalia causada pelo Zika.
Sistema Único de Saúde
No documento, a Federação Internacional de Planejamento Familiar elogia a política brasileira de distribuição gratuita de medicamentos contraceptivos no Sistema Único de Saúde (SUS), mas pondera que o acesso é desigual e varia de acordo com a região do país.
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