Com o consumo global em alta e o rabilho mantendo o posto de peixe mais valioso do mundo, a disputa entre países deve aumentar / Freepik
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O atum-barbatana azul, também conhecido como atum-rabilho (bluefin tuna), ocupa há décadas o topo da lista dos peixes mais caros do mundo. Seus exemplares já alcançaram valores milionários em leilões, principalmente no Japão, onde a tradição dos cortes de alta qualidade, como o cobiçado toro, transformou a espécie em símbolo de luxo culinário.
Estrela do sushi de luxo, o peixe tem no país seu maior centro de produção, pesquisa e tecnologia. Em 2024, dados oficiais do Ministério da Pesca japonês e de centros internacionais de aquicultura confirmaram o que especialistas já tratam como um consenso global: nenhuma nação domina essa espécie como o Japão.
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O país cultiva 15 mil toneladas anuais e embarca mais de 21 mil toneladas métricas com apoio de megafazendas marinhas de alta complexidade.
Em leilões de Tóquio, a espécie já alcançou valores superiores a US$ 3 milhões por exemplar, consolidando o rabilho como o verdadeiro diamante azul dos oceanos.
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Mas o preço elevado não se deve apenas ao prestígio cultural: uma combinação de raridade biológica, dificuldades de produção e demanda crescente sustenta o valor deste peixe no mercado global.
O atum-barbatana azul é uma espécie de crescimento lento, com maturação tardia, que percorre grandes distâncias ao longo da vida. Essas características tornam o peixe especialmente vulnerável à sobrepesca, fenômeno que reduziu drasticamente suas populações naturais nas últimas décadas.
Para conter o declínio, organismos internacionais estabeleceram:
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cotas rígidas de captura
regulamentações de pesca sustentável
monitoramento internacional das frotas
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Essas medidas, embora essenciais para a conservação da espécie, reduzem a oferta mundial, o que, por sua vez, aumenta o valor de cada exemplar disponível no mercado.
Além da raridade, o atum-barbatana azul é altamente valorizado pela qualidade da carne, considerada uma das mais saborosas e refinadas da gastronomia contemporânea. O peixe possui:
alto teor de gordura intramuscular,
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textura macia,
sabor delicado que derrete na boca,
sobretudo na região da barriga, onde está o famoso corte toro — o mais caro de todo o animal, frequentemente usado em sushis e sashimis de alto padrão.
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A jornada japonesa começou nos anos 1970, quando pesquisadores buscaram alternativas ao declínio dos estoques selvagens, pressionados pela explosão do consumo doméstico de sushi e sashimi. O marco histórico veio apenas décadas depois, em 2002, quando a antiga Kinki University (hoje Kindai University) completou o ciclo reprodutivo integral do atum-rabilho em cativeiro — da desova ao peixe adulto.
O feito é tratado até hoje como um dos maiores avanços da biotecnologia marinha moderna.
Desde então, o país expandiu sua estrutura e consolidou uma indústria que une genética, larvicultura, monitoramento ambiental e manejo oceânico em um modelo sofisticado de produção em larga escala.
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Hoje, o Japão concentra megacomplexos de engorda distribuídos por regiões como Kagoshima, Nagasaki, Oita, Miyazaki, Ehime e Okinawa, onde operam algumas das maiores fazendas oceânicas do mundo.
Essas unidades utilizam:
Gaiolas marinhas gigantes
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Cercos flutuantes de até 50 metros de diâmetro e dezenas de metros de profundidade.
Sistemas de iluminação subaquática
Usados para estabilizar o comportamento do rabilho durante fases sensíveis do crescimento.
Monitoramento integral por sensores
Aparelhos registram oxigênio, temperatura, correntes e densidade populacional.
Alimentação automatizada
Misturas controladas de sardinha, cavala e rações de alta proteína.
Transporte vivo de longa distância
Realizado por embarcações conhecidas como tuna carriers, capazes de levar peixes juvenis por milhares de quilômetros mantendo as condições ideais.
Segundo a Japan Fisheries Research and Education Agency, todo esse sistema é otimizado para reduzir mortalidade, controlar estresse e acelerar ganho de peso — três fatores críticos para uma espécie que pode ultrapassar 3 metros de comprimento e chegar a 450 kg.
O atum-rabilho é considerado uma das espécies mais complexas da aquicultura mundial porque:
precisa nadar continuamente por longas distâncias
possui metabolismo extremamente acelerado
é altamente sensível a ruídos e correntes
suas larvas são frágeis e têm baixíssima taxa de sobrevivência
exige alimentação constante e densa em proteína
Por isso, poucos países conseguem completar o ciclo total em cativeiro. Mesmo grandes potências da aquicultura, como China e Noruega, ainda dependem quase totalmente de juvenis capturados no mar.
O domínio tecnológico japonês, portanto, representa décadas de vantagem acumulada.
A indústria do rabilho movimenta centenas de milhões de dólares e abastece tanto o mercado interno quanto exportações de cortes premium como:
chūtoro, o meio-gordo
otoro, o corte mais nobre, extremamente marmorizado
A cadeia produtiva envolve grandes empresas como Nissui, Maruha Nichiro, Toyota Tsusho Seafood e cooperativas regionais, sustentando empregos, pesquisa e a economia de regiões pesqueiras tradicionais.
O Japão também lidera globalmente patentes de reprodução, larvicultura, alimentação especializada e transporte vivo, o que reforça seu papel estratégico.
Com o consumo global em alta e o rabilho mantendo o posto de peixe mais valioso do mundo, a disputa entre países deve aumentar. Contudo, especialistas da FAO indicam que o Japão deve permanecer na liderança — tanto pela tecnologia, quanto pelo domínio das etapas mais sensíveis do processo.
Os desafios, porém, são significativos:
pressões ambientais
sustentabilidade das capturas de juvenis
possíveis restrições internacionais
demanda crescente que exige alternativas controladas
Ainda assim, o Japão continua anos à frente do restante do mundo na corrida pelo “ouro azul”, transformando ciência, tradição culinária e tecnologia em um dos sistemas de produção de pescado mais avançados do planeta.