Oymyakon é mais do que uma curiosidade geográfica. É um retrato impressionante da capacidade humana de adaptação / Reprodução/ Instagram: @vishnu.saha28
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Na longínqua região da Yakutia, no extremo leste da Rússia, existe um vilarejo que parece desafiar qualquer lógica de sobrevivência humana. Oymyakon é considerado o lugar habitado mais frio do planeta e já registrou -71 °C, uma temperatura capaz de congelar cílios em segundos.
Ainda assim, cerca de 800 pessoas seguem vivendo ali, em uma área de apenas 1,5 km², transformando o frio extremo em parte da rotina.
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No auge do inverno, o simples ato de atravessar a porta de casa é um choque físico imediato. Dentro das residências, aquecidas a cerca de 30 °C, o corpo está confortável; do lado de fora, as ruas podem estar próximas de -60 °C.
Essa diferença brusca faz com que a respiração se transforme em vapor que rapidamente vira cristais de gelo, enquanto partes expostas da pele correm risco de queimaduras por frio em poucos minutos.
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Eletrônicos não resistem: celulares desligam sozinhos, mesmo com bateria cheia, e carros deixados ao ar livre por algumas horas simplesmente congelam por completo, tornando-se inutilizáveis.
As construções de Oymyakon funcionam como verdadeiras fortalezas térmicas. Paredes espessas, vigas robustas, isolamento em múltiplas camadas de basalto e janelas triplas ajudam a reter cada fração de calor. O aquecimento central, geralmente a carvão, mantém os ambientes internos habitáveis durante meses de frio contínuo.
O permafrost — solo permanentemente congelado — impede encanamentos subterrâneos. Por isso, banheiros costumam ficar do lado de fora das casas, e a água potável é obtida de forma artesanal: blocos de gelo retirados de rios congelados precisam ser derretidos lentamente em fogões, processo que pode levar horas.
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Cultivar frutas e vegetais é praticamente impossível em um solo congelado o ano inteiro. A dieta local é baseada em caça, criação de gado adaptado ao frio e carnes ricas em gordura, armazenadas naturalmente congeladas pelo clima. Nada de geladeiras: o próprio ambiente faz esse papel.
Algumas práticas revelam o nível extremo de adaptação:
carros a diesel precisam ficar ligados continuamente ou guardados em garagens super isoladas;
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qualquer banho ou limpeza doméstica exige derreter neve ou gelo previamente;
moradores cobrem quase todo o rosto ao sair, deixando o mínimo de pele exposta;
aparelhos eletrônicos sobrevivem apenas por poucos minutos ao ar livre.
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A sobrevivência em Oymyakon não é só humana. Os cavalos Yakut, típicos da região, desenvolveram corpo compacto, pelagem extremamente espessa e resistência a temperaturas abaixo de -70 °C. As vacas locais produzem leite com alto teor de gordura, entre 7% e 8%, essencial para fornecer energia em um ambiente onde o corpo queima calorias rapidamente.
A caça segue sendo parte importante da subsistência. Lebres, lobos e até ursos fazem parte da dieta, e algumas tradições incluem o consumo de carne crua e ainda congelada, prática que ajuda a preservar vitaminas. Esses hábitos se misturam a rituais de inspiração xamânica, passados de geração em geração.
Mesmo nesse cenário extremo, a vida segue com certa normalidade. As aulas só são suspensas quando os termômetros caem abaixo de -55 °C, algo que, em outros lugares do mundo, seria motivo de calamidade. Chegar a Oymyakon, porém, não é simples: são cerca de 7 horas de voo desde Moscou, seguidas por aproximadamente 900 quilômetros de estrada em condições severas.
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Oymyakon é mais do que uma curiosidade geográfica. É um retrato impressionante da capacidade humana de adaptação — um lugar onde o frio extremo não é exceção, mas regra, e onde viver significa, diariamente, desafiar os limites do corpo e da tecnologia.