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Esportes

Jiu-jitsu muda vidas na Prainha, em Guarujá

Felipe usou 12 placas de tatame, a sala de casa e tudo de si para reescrever a história de mil crianças.

Rafaella Martinez

Publicado em 22/09/2019 às 09:08

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Quatro ex-alunos hoje são instrutores do Instituto Novos Sonhos. / DIVULGAÇÃO/INSTITUTO NOVOS SONHOS

Há poucos metros da movimentada Avenida Santos Dumont, no Paecará, em Vicente de Carvalho, há um trilho de trem. Do 'lado de lá' da passagem das locomotivas, crianças brincam livremente no lamaçal provocado pela chuva recente na rua sem asfalto. Ali começa a Comunidade Aldeia e a história de um projeto social que desde 2010 modifica a vida de crianças e jovens através do esporte.

Foi após se mudar para comunidade que o então encarregado de transportes de uma gigante portuária Felipe Ferreira decidiu tocar o projeto social. Na época, já treinava Jiu-Jitsu e era faixa azul, estando fora da lista de convocados para graduação (para ministrar aulas é preciso ser, ao menos, faixa roxa). A ideia inicial era fazer algo pelas pessoas que saiam do sistema penitenciário. "Eu queria ajudar aqueles que saem das cadeias, pois eles não têm nenhuma referência. Quando se está perdido, sem direção, o crime pode compensar mais do que o sistema". A ideia foi abandonada tempos depois, por falta de apoio.

Conhecendo a rotina da comunidade e vendo na prática a carência emocional das crianças do lugar, percebeu que o esporte poderia preencher uma lacuna naquelas vidas, como havia preenchido na sua. Faltava, mais do que a graduação necessária, um espaço para os treinos.

O esforço fez com que a tão sonhada faixa roxa chegasse e com ela a possibilidade de começar o trabalho. Na ausência de um espaço físico apropriado, abriu as portas da própria casa, um espaço simples, às margens da maré. Doze placas de 1 metro de tatame foram improvisadas e colocadas na sala. Em agosto de 2010, 40 crianças passaram pelo hall de entrada para descobrir um novo caminho.

A surpresa veio quando a sua antiga empresa, a Santos Brasil, entrou como patrocinadora da ideia do Felipe. Já a comunidade que vive no entorno, se uniu para preparar lanches para os alunos que frequentam hoje o espaço repleto de atividades lúdicas no contraturno escolar. No dia da visita surpresa da reportagem, mais de 20 crianças em cada uma das duas unidades que sediam o Instituto Novos Sonhos participavam de ações culturais, apesar da chuva e da lama.

Com amor e suporte, a sala foi derrubada para virar um galpão. Paredes foram pintadas e decoradas e as portas permanentemente abertas recepcionam qualquer pessoa que queira entrar.

EXPANSÃO E UNIÃO

Atualmente, 150 crianças frequentam as três sedes do Instituto: a primeira na comunidade Aldeia, localizada no fundo da Prainha, a segunda em uma antiga creche da Marézinha e outra no asfalto do bairro Paecará. A Santos Brasil é a responsável por fornecer os quimonos, mas só ganha um o aluno que mantém a disciplina e o respeito. Todas as unidades possuem biblioteca e sala de informática e na Aldeia hoje existe também uma cinemateca, proporcionada pelo Ministério da Cultura e a MRS Logística.

"Quando essas crianças não são atendidas pelo poder público, elas são acolhidas pelo crime. O esporte é o caminho do meio e felizmente são muitos que estão seguindo por ele. Não ministramos aulas de Jiu-Jitsu como passatempo. Eles aprendem os conceitos de respeito e disciplina e hoje para além do esporte proporcionamos diversas outras ações. Queremos que elas sejam acolhidas e que sigam o caminho dos ex-alunos que hoje trabalham conosco administrando o projeto, por exemplo", conta emocionado.

Além das aulas, os ex-alunos tocam também a parte administrativa e recreativa do projeto, que recebe cada dia mais crianças.

"Ser professor diariamente me transforma em um ser humano melhor. Desperta o meu desejo de ser bom para ser espelho para eles. Sei que em qualquer lugar que um desses meninos chegar, no tatame ou na vida, ali também eu estarei, pois fiz parte da história deles e eles são a minha. Essa recompensa, esse valor, nenhum dinheiro no mundo é capaz de pagar. Não traço planos e nem me preocupo com o dia de amanhã. Dou o meu melhor hoje e transmito os valores que a vida me ensinou. Esse projeto não é meu e não sou eu. Sou apenas um servo", finaliza.

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