"Sobradão" desafia qualquer expectativa sobre construções coloniais brasileiras / Domingos Mota/PMMV
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Erguido em 1821 na pacata Vila do Fanado, em Minas Novas, o "Sobradão" desafia qualquer expectativa sobre construções coloniais brasileiras.
Com seus quatro andares imponentes construídos em taipa e madeira, o edifício se ergue dramaticamente acima do casario térreo ao redor, conquistando o curioso apelido de "primeiro arranha-céu" do Brasil Colônia.
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A denominação pode soar exagerada aos ouvidos contemporâneos, mas captura perfeitamente o impacto visual que a construção causava, e ainda causa, na paisagem urbana do Vale do Jequitinhonha.
Concluída em maio de 2021, uma ampla restauração devolveu estabilidade e funcionalidade ao imóvel histórico. O Iphan investiu cerca de R$ 886 mil na recuperação de portas, janelas, rebocos e pinturas, preservando a tipologia arquitetônica original.
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A intervenção seguiu trabalhos emergenciais realizados entre 2017 e 2018 que estabilizaram telhado e pisos, garantindo que essa raridade arquitetônica sobrevivesse às próximas gerações.
O edifício voltou à vida pública de forma memorável em maio de 2022, quando o Tribunal de Justiça de Minas Gerais realizou uma sessão do Tribunal do Júri em suas dependências.
O evento demonstrou que o "Sobradão" não é apenas relíquia do passado, mas espaço vivo capaz de abrigar atividades contemporâneas, reforçando seu papel como símbolo de pertencimento para a comunidade local.
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Com 59 janelas distribuídas pelas fachadas, quatro portas de loja no térreo e uma porta principal que alcança impressionantes 3,60 metros de altura, as dimensões do "Sobradão" revelam sua escala excepcional.
A estrutura combina madeira e taipa de forma magistral, criando um volume que o Iphan classifica como "construção de grandes dimensões, pouco usuais" para esse sistema construtivo. O beiral generoso e o ritmo das aberturas demonstram adaptação inteligente ao clima e topografia mineiros.
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A solução arquitetônica segue lógica funcional típica dos centros coloniais: comércio no térreo e diversos usos nos pavimentos superiores.
Porém, ampliar essa fórmula para quatro níveis usando apenas técnicas tradicionais representava verdadeiro feito de engenharia para 1821, explicando por que o edifício se tornou caso de estudo para arquitetos e restauradores.
O "Sobradão" desempenhou por décadas função de Fórum da comarca, consolidando sua centralidade na vida cívica de Minas Novas.
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Documentos históricos mencionam até propostas do século XIX para transformá-lo em sede administrativa de uma província regional planejada, evidenciando sua importância estratégica desde sempre.
Hoje, o Plano de Ocupação aprovado pelo Iphan prevê transformação cultural completa. O térreo receberá loja de artesanato, Centro de Atendimento ao Turista e biblioteca.
Os andares superiores abrigarão museus dedicados à arte sacra, ao artesanato do Jequitinhonha e ao acervo histórico regional, além de espaços voltados à memória e formação.
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A estratégia busca gerar fluxo turístico, empregos locais e integrar o edifício ao circuito regional das Pedras Preciosas.
Obviamente, o termo "arranha-céu" soa anacrônico quando aplicado a uma construção de 1821. No sentido técnico moderno, arranha-céus dependem de estruturas metálicas e elevadores surgidos apenas no final do século XIX. Mas no contexto mineiro do início dos oitocentos, quatro pavimentos em taipa literalmente "arranhavam o céu" da paisagem urbana.
A alcunha não pretende competir com ícones como o Edifício Martinelli de 1929, mas comunicar de forma acessível a singularidade extraordinária do bem.
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A imprensa regional e órgãos públicos adotaram a expressão justamente por seu poder de sensibilizar a população para a preservação.
Essa estratégia comunicativa funciona: facilita o engajamento público com o patrimônio histórico sem exigir formação especializada para compreender sua importância.
O "Sobradão" pode não ser arranha-céu pelos padrões modernos, mas permanece único em seu tempo e lugar, e isso basta para torná-lo tesouro arquitetônico do Jequitinhonha.
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