A psicologia enxerga benefícios e malefícios em ser 'pai' ou 'mãe' de pet / Imagem gerada por IA/DL
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A psicologia não vê, por si só, problema em quem se chama de “pai” ou “mãe de pet”. O que esse rótulo revela é uma forma específica de vínculo afetivo com o animal, ligada a mudanças nas famílias, à solidão nas grandes cidades e a jeitos novos de entender o que é “família”.
Pesquisas recentes falam em pet parenting para descrever tutores que tratam o cachorro ou o gato como um filho simbólico. Isso aparece em contextos de menos filhos, maternidade/paternidade mais tardias, mais pessoas morando sozinhas e casais que optam por não ter crianças. Nesses arranjos, o pet ocupa um lugar central: não é “apenas um animal”, mas alguém com nome, rotina, festa de aniversário e presença constante nas decisões da casa.
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Em levantamentos com tutores, a maioria diz considerar o pet “parte da família”. A psicologia e áreas próximas vêm mostrando que essa relação pode trazer efeitos positivos: sensação de companhia, redução de solidão, alívio de estresse, incentivo à rotina (como passeios diários) e até impacto em indicadores físicos, como níveis de cortisol e pressão arterial. Em especial para pessoas idosas, solteiras ou que passaram por situações difíceis, o vínculo com o animal pode atuar como uma forma extra de apoio emocional.
Chamar o pet de “filho” envolve o chamado antropomorfismo: atribuir características humanas ao animal, como intenções, pensamentos e emoções muito parecidas com as nossas. Em dose moderada, isso aumenta a empatia e faz o tutor cuidar melhor, reconhecer que o bicho sente medo, dor, desconforto e precisa de segurança e previsibilidade.
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O problema começa quando esse olhar humano se sobrepõe completamente ao fato de que se trata de outra espécie. É o caso de cães tratados como bebês de colo o tempo todo, sem espaço para gastar energia, cheirar o ambiente, interagir com outros animais ou aprender limites. Do ponto de vista do comportamento e do bem-estar animal, isso pode gerar ansiedade, frustração e comportamentos considerados “problema”.
Estudos sobre apego entre humanos e animais de estimação mostram que o padrão de vínculo com o pet costuma refletir estilos de apego que a pessoa já tem em outras relações. Quem apresenta um apego mais ansioso pode desenvolver uma relação muito grudada e preocupada: medo intenso de perder o animal, dificuldade extrema em se separar dele por algumas horas, necessidade de confirmação constante de que é “amado de volta”.
Alguns trabalhos indicam que esse tipo de apego ansioso se associa a maior sofrimento psíquico, como ansiedade e depressão, enquanto vínculos mais seguros tendem a caminhar junto com melhor bem-estar emocional. Ou seja: não é o fato de tratar o bicho como “filho” que faz bem ou mal, mas o modo como a relação se organiza e quanto ela se torna a única fonte de afeto e sentido.
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Já existe até a expressão “culpa de pai/mãe de pet”, descrita em pesquisas como um sentimento parecido com o de pais de crianças: a sensação constante de que não se está dando tempo suficiente, de que o animal fica sozinho demais, de que se falha na função de cuidador. Em parte, isso se relaciona a expectativas muito altas sobre o próprio papel e à tendência de projetar no pet funções emocionais que antes ficavam restritas a relações humanas.
Por outro lado, estudos também apontam que um vínculo forte e saudável com animais costuma andar junto de mais empatia e comportamentos pró-sociais em geral. Crianças e adultos muito ligados aos seus pets tendem a apresentar mais cuidado, compaixão e sensibilidade ao sofrimento de outros seres vivos, humanos ou não. Nesse sentido, a figura do “pai” ou “mãe de pet” pode refletir um jeito de estar no mundo que valoriza cuidado, responsabilidade e afeto.
Do ponto de vista da psicologia, o alerta não é contra o termo, mas contra os excessos. A relação começa a preocupar quando o animal vira praticamente a única fonte de companhia ou de propósito de vida, quando a pessoa se isola de outros vínculos humanos, deixa trabalho, saúde ou autocuidado de lado por causa do pet, ou quando o tratamento humanizado impede que o bicho viva como cão ou gato – com estímulos adequados, socialização, descanso e limites.
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*Com informações da ScienceDirect, News In Health e Social and Personality Psychology