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Como caracóis sobrevivem ao impossível graças a técnica que poucos animais têm

Estivação e hibernação permitem que esses moluscos resistam ao calor extremo, ao frio de 40 °C e até anos sem comer ou beber

Júlia Morgado

Publicado em 11/12/2025 às 06:30

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Mesmo com aparência frágil, os caracóis possuem adaptações extraordinárias que lhes permitem sobreviver por meses em estado de dormência / wirestock/Freepik

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Imagine poder desligar quase todos os sistemas do seu corpo e trancar a porta de casa por anos até que o clima melhore. É exatamente isso que algumas espécies de caracóis fazem.

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Muito comum em jardins, este animal possui uma estratégia de sobrevivência para condições extremas: a estivação e hibernação, que dependendo da espécie podem estender um estado de dormência de até 3 anos.

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Estratégias como estivação e hibernação revelam a impressionante capacidade dos caracóis de sobreviver a condições extremas/ kuritafsheen77/Freepik
Estratégias como estivação e hibernação revelam a impressionante capacidade dos caracóis de sobreviver a condições extremas/ kuritafsheen77/Freepik
Algumas espécies conseguem reduzir o metabolismo a níveis mínimos e até suportar temperaturas abaixo de zero por longos períodos/ wirestock/Freepik
Algumas espécies conseguem reduzir o metabolismo a níveis mínimos e até suportar temperaturas abaixo de zero por longos períodos/ wirestock/Freepik
Gastrópodes discretos, mas fascinantes, os caracóis combinam biologia complexa, resistência notável e adaptações evolutivas surpreendentes/ onlyyouqj/Freepik
Gastrópodes discretos, mas fascinantes, os caracóis combinam biologia complexa, resistência notável e adaptações evolutivas surpreendentes/ onlyyouqj/Freepik

O que é a estivação?

Como já dito a estivação é um tipo de “modo de sobrevivência” que os caracóis, acionam quando enfrentam muito calor e falta de água. Diferente da hibernação (que acontece no frio), a estivação é usada para evitar morrer de desidratação.

Ao entrar em estivação, o caracol não está apenas dormindo; ele está alterando a química do seu corpo, por isso ocorre uma redução drástica em sua energia, ou seja, o animal sofre uma inibição metabólica reversível.

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Em espécies como o caracol Otala lactea, a taxa metabólica basal cai para menos de 30% do que seria o seu repouso normal. Em alguns casos de estivação profunda, o consumo de energia pode cair para entre 1% e 20% do normal.

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Ocorre também uma "troca de combustível", como não está se alimentando, o caracol para de usar a glicose (açúcar) como fonte primária de energia e passa a queimar suas reservas de lipídios (gordura) acumuladas previamente. É uma mudança metabólica complexa que preserva as proteínas vitais.

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A maior ameaça para um molusco de corpo mole no verão é secar. Para evitar isso, o caracol recolhe o corpo para dentro da concha e secreta uma camada espessa de muco na abertura. Esse muco seca e endurece, formando uma estrutura chamada epifragma.

O epifragma atua como uma porta estanque que impede a perda de água por evaporação e protege o animal contra predadores e temperaturas extremas. Apesar disso, o período de 3 anos ocorre apenas em casos extremos, a maioria das dormências dura apenas alguns meses, o que já é muito impressionante.

Como o caracol não pode fazer suas necessidades durante meses ou anos, ele precisa lidar com a toxicidade interna, por isso seu corpo faz uma detoxificação, seu metabolismo de nitrogênio muda. A produção de amônia (que é tóxica) diminui, e a síntese de uréia aumenta.

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Ele possui também um truque de hidratação. O acúmulo controlado de ureia no corpo aumenta a concentração dos fluidos corporais, o que ajuda quimicamente a reter a água dentro das células e tecidos, evitando a desidratação fatal.

Preparação para o estresse oxidativo (POS)

Quando o caracol sai da estivação, ele volta a respirar oxigênio rapidamente. Isso gera uma explosão de radicais livres (espécies reativas de oxigênio - ROS) que poderiam destruir suas células.

Para sobreviver a isso, o caracol aumenta suas defesas antioxidantes (enzimas como catalase e superóxido dismutase) durante a estivação, deixando o corpo "armado" para neutralizar os danos no momento exato em que acordar.

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O que é a hibernação?

A hibernação em caracóis é uma estratégia de sobrevivência fascinante que permite a esses moluscos enfrentar o frio extremo do inverno.

Quando as temperaturas caem, algumas espécies de caracóis terrestres reduzem drasticamente o metabolismo, desaceleram os batimentos cardíacos e entram em um estado profundo de dormência para preservar energia e evitar o congelamento dos tecidos.

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Um dos exemplos mais impressionantes é o caracol-romano (Helix pomatia). Antes do inverno chegar, ele se enterra no solo e sela completamente a abertura da concha com um epifragma calcário, que funciona como uma tampa protetora.

Esse selo cria uma barreira física que impede a entrada de gelo e reduz a perda de água. Dentro da concha, o animal se retrai profundamente e forma uma pequena bolsa de ar isolante, que funciona como uma camada extra de proteção térmica.

O corpo do caracol também passa por ajustes bioquímicos importantes. Ele expulsa o excesso de água para diminuir o risco de congelamento, e suas células quebram moléculas grandes em componentes menores, que funcionam como uma espécie de “anticongelante natural”. Graças a essas adaptações, algumas espécies conseguem suportar temperaturas extremamente baixas, o Helix pomatia, por exemplo, pode sobreviver a até –40 °C sem congelar.

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Assim como acontece na estivação, a hibernação é marcada por um metabolismo reduzido ao mínimo. Durante meses, o caracol vive apenas de suas reservas internas, aguardando que o ambiente volte a se tornar favorável. Com a chegada da primavera, ele rompe o epifragma, reidrata o corpo e retorna à superfície, retomando sua rotina lenta e surpreendentemente resiliente.

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Mais sobre essas fascinantes criaturas 

Para além dessas estratégias extraordinárias de sobrevivência, os caracóis também se destacam por uma série de curiosidades fascinantes.

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Eles pertencem ao grupo dos gastrópodes e carregam consigo uma concha que cresce junto ao corpo e nunca é trocada, podendo até se regenerar parcialmente se o tecido produtor, o manto, permanecer intacto.

Movem-se graças a um único “pé” muscular, deslizando sobre muco para reduzir o atrito, e possuem rádulas, estruturas semelhantes a uma língua com minúsculos dentículos usados para raspar o alimento.

Apesar do ritmo lento, são animais altamente adaptáveis, encontrados em florestas, jardins, desertos e até ambientes urbanos. Esses pequenos moluscos, muitas vezes subestimados, revelam um mundo complexo de biologia, comportamento e resistência, que continua surpreendendo cientistas e curiosos.

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