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Cotidiano

Superlotação das unidades prisionais chega a 173% na Baixada Santista

Sindicato denuncia que número de agentes penitenciários para atender a demanda é insuficiente

Rafaella Martinez

Publicado em 17/04/2017 às 10:04

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Situação mais preocupante acontece em São Vicente; CDP de cidade registra superlotação na ordem de 260% / Matheus Tagé/DL

No estado com o maior índice de presos do Brasil, a Baixada Santista chama atenção pelo índice de superlotação nos presídios. De acordo com os próprios dados da Secretaria de Administração Penitenciária do estado de São Paulo - atualizados semanalmente no site - a região possui 73% a mais de presos do que as unidades prisionais suportam. O número foi obtido com as populações dos CDPs, CPPs, CRs e Penitenciárias de São Vicente, Mongaguá e Praia Grande. No total, há 5.243 vagas e 9.105 pessoas encarceradas. A porcentagem segue a tendência nacional: no Brasil, a taxa de ocupação das unidades prisionais gira em torno de 167%.

O aumento no número de presos está diretamente relacionado com a defasagem no número de vagas no país: atualmente há 371.884 vagas disponíveis e um deficit de 250.318.

De acordo com o último relatório do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), o Brasil já ultrapassou a marca de 622 mil pessoas privadas de liberdade em estabelecimentos penais, chegando a uma taxa de mais de 300 presos para cada 100 mil habitantes. Com esse contingente, o país é a quarta nação com maior número absoluto de presos no mundo, seguindo uma trajetória de crescimento da população prisional de 7% ao ano, aproximadamente.

Antonio Pereira, presidente do Sindicato dos Agentes de Escolta e Vigilância Penitenciária do Estado de São Paulo (Sindespe), aponta outro dado alarmante: o número de agentes penitenciários é insuficiente nessas unidades. “Os números apontam que os presídios tem 4.238 detentos a mais, só na região. A situação fica ainda mais complicada para os agentes penitenciários. Imagine ter que controlar presídios com esse número, com essa superlotação. É como se o agente fosse uma concha no meio de um mar de presos. É impossível manter a ordem”, desabafa.

De acordo com a Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) e o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), órgão ligado ao Ministério da Justiça (MJ), cada agente deve ficar responsável por até cinco detentos. Dados do Sindespe ressaltam, no entanto, que em alguns casos, como no CDP de São Vicente, cada profissional lida com uma média de 15 detentos, o triplo do número estabelecido.

O presidente do sindicato aponta ainda que a situação encontrada nos presídios da Baixada Santista é uma das mais preocupantes do Estado de São Paulo. “Nós lutamos pela contratação de mais agentes, todos os dias. Essa é uma grande batalha travada pelo nosso sindicato e que interfere diretamente na segurança do cidadão paulista, frente ao que está acontecendo em todo o país, no que temos acompanhado todos os dias pelos meios de comunicação. A superlotação, aliada com a falta de profissionais capacitados para conter uma crise dentro do presídio, faz com que o problema se transforme em uma grande bola de neve que a qualquer momento poderá afetar diretamente a população”, conclui.

Capacidade

Na Baixada Santista a situação mais preocupante acontece no Centro de Detenção provisória de São Vicente. Com 842 vagas o CDP tem uma população prisional de 2.178 pessoas, o que equivale a 260% a capacidade da prisão. O complexo penitenciário da cidade, instalado na Área Continental, abrange cinco penitenciárias e um centro de detenção provisória. O local abriga mais da metade de todos os encarcerados da ­região.

O Centro de Progressão Penitenciária (CPP) “Dr Rubens Aleixo Sendin”, de Mongaguá, que possui reeducandos já condenados cumprindo pena no regime semiaberto, também está com 179% de ocupação.

Detentos

O relatório do Infopen aponta que em dezembro de 2014, 40% da população prisional brasileira era composta por presos provisórios. Embora existam muitos países com percentual maior de presos provisórios – o Brasil ocupa apenas a 38ª posição entre os países com mais de 10 milhões de habitantes – isso significa 40% de 600 mil pessoas. São quase 250 mil pessoas presas antes de serem julgadas em primeiro grau, sendo que há evidências de que uma grande parte delas poderia responder ao processo em liberdade.

Agente fala sobre insegurança e denuncia as condições insalubres das unidades prisionais da Baixada Santista

“Uma cela que era para ter 30 presos, chega a abrigar 50. Então se você tem um reeducando ali dentro e não trabalha na ressocialização, como espera que ele saia dali? É preciso pensar pelos dois lados: na segurança e também nos direitos humanos. A pessoa que está sendo presa, independente do motivo pelo qual ela está lá, um dia vai sair dali e precisamos trabalhar para que ela saia melhor do que ela entrou. Mas em um cenário de superlotação e sucateamento do trabalho isso é impossível”.

O desabafo acima foi feito por um agente de escolta e vigilância prisional que preferiu não se identificar. Atuando há anos em uma das unidades prisionais da Baixada, ele afirma que a falta de segurança dos profissionais que atuam nos presídios e a alta carga de tarefas faz com que poucas pessoas queiram trabalhar nas unidades prisionais do Estado.

“Em São Vicente, por exemplo, você tem em um único pavilhão quase 500 presos e uma única pessoa para soltar. Ele está sozinho e tão preso quanto os presos. A população carcerária dobrou e o Estado precisa ter olhos atentos para isso. Na crise de 2006, o Estado de São Paulo teve 73 unidades rebeladas e não houve nenhuma fuga. Hoje as unidades que tinham 15 profissionais, trabalham com seis. Poucas pessoas estão interessadas em seguir carreira. Na última chamada, das 300 vagas, 40 não foram preenchidas”, destaca.

Ele ressalta ainda as condições insalubres do sistema prisional. “O Estado quando cerceia os presos de direitos precisa suprir todas as necessidades daquelas pessoas e isso não acontece. Falta remédio, os pavilhões estão em condições degradantes e não há produtos para atender toda a demanda. A maior parte das pessoas está presa por tráfico. Uma medida boa seria agilizar o julgamento para esvaziar os presídios.

A demora demanda em gastos com alimentação, água, luz e reparos”, finaliza.

Outro lado

Em nota, a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) informa que atualmente possui um médico clínico em cada uma das seguintes unidades: Penitenciária I de São Vicente, Centro de Detenção Provisória (CDP) de São Vicente. Centro de Progressão Penitenciária (CPP) de Mongaguá e CDP de Praia Grande. Atualmente, somente a PII de São Vicente não possui o profissional. Ressalta ainda que todas as unidades contam com equipe de saúde e, quando necessário, o preso é encaminhado para hospitais e redes de atendimento públicas locais.

Nega também a falta de medicamento nas unidades da região, apontando que os insumos são adquiridos por meio de atas de registro de preços e mesmo quando não há estoque  a unidade é autorizada a adquirir os medicamentos nas drogarias da região.

SAP ressalta ações e enfatiza construção de novas unidades prisionais no Estado de São Paulo

Em nota, a Secretaria de Administração Penitenciária informou que desde o início do Plano de Expansão de Unidades Prisionais a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) entregou mais de 20 mil vagas, sendo que outros 15 presídios estão em construção.

Além do programa de expansão e modernização do sistema penitenciário paulista, a nota destaca que o Governo do Estado de São Paulo tem investido maciçamente na ampliação de vagas de regime semiaberto, seja pela ampliação das atuais existentes, seja pela construção de alas em unidades penais de regime fechado. “Dentro do Programa, já foram entregues quase 8 mil vagas e estão em construção outras 600 vagas. Paralelamente à criação de novas vagas, o Estado investe maciçamente na adoção de penas alternativas à pena de encarceramento - hoje quase 14 mil pessoas prestam serviços à comunidade, medida essa que substitui a pena de prisão”, ressalta o comunicado.

A ampliação do programa de Centrais de Penas e Medidas Alternativas é outra medida adota pelo governo.

Através da Coordenadoria de Reintegração Social e Cidadania, a Pasta desenvolve o Programa de Prestação de Serviço à Comunidade desde o ano de 1997. O total de pessoas que passaram pelo Programa desde 1997 é superior a 150 mil.

A Secretaria da Administração Penitenciária afirma também que tem participado ativamente na realização de audiências de custódia e que tem colaborado de forma decisiva para reduzir o número de inclusões de pessoas presas em flagrante no sistema penitenciário. “Além dessas medidas descritas, o Governo do Estado de São Paulo, por meio da SAP, também mantém parcerias com a Defensoria Pública e a Corregedoria Geral de Justiça para prestação de assistência judiciária aos sentenciados e a realização de mutirões para análise dos pedidos de progressão de regime”, finaliza a nota.  

Sobre a denúncia do número insuficiente de agentes penitenciários, a Pasta destacou que, por questão de segurança, não informa sobre número de funcionários.

O secretário de Estado da Administração Penitenciária, Lourival Gomes, afirma que tem se reunido frequentemente com a Corregedoria Geral da Justiça para solicitar a realização de mutirões visando análises dos benefícios requeridos por presidiários que cumprem pena em unidades prisionais dos regimes fechado e semiaberto.

 

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