Cotidiano
Uma das ruas mais populares de São Paulo serve de 'memorial' para um dos assassinatos mais bárbaros da história nacional
Rua Peixoto Gomide, em São Paulo / Wikipédia/Lukaaz
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A maioria dos paulistas já passou por ruas, avenidas e monumentos populares da capital nomeados como Peixoto Gomide. No entanto, a dedicatória política esconde uma história macabra envolvendo pai e filha. Confira abaixo quem foi este rapaz e por que ele não deveria ser homenageado.
A história ocorreu em meados de 1906 dentro do ambiente familiar de Francisco de Assis Peixoto Gomide, o até então presidente do Senado do Estado, um cargo equivalente ao de governador.
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Era 20 de janeiro, quando o político assassinou repentinamente sua própria filha Sophia, de 22 anos, dentro do suntuoso casarão da família, localizado na atual rua Benjamin Constant, na região central de São Paulo.
O crime paralisou a elite paulistana e emplacou manchetes no país, principalmente pelo prestígio que Gomide tinha como político. Até então, ele era reconhecido por todos como um rapaz articulado e respeitado, mas relatos indicam que o ato teria sido para lá de premeditado.
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Segundo depoimentos, Sophia estava bordando à mesa da sala de jantar quando Gomide encostou o cano de um revólver Smith & Wesson em sua testa. Sem hesitar, o senador atirou contra a própria filha, deixando esposa e herdeiros espantados com a cena brutal. O político ainda ameaçou sua outra filha, Gnesa, mas foi contido por uma funcionária antes de tentar suicídio.
A motivação teria sido o casamento de Sophia com o promotor público e poeta Manuel Baptista Cepelos, que tinha cerimônia agendada para 27 de janeiro. Embora o senador tenha aprovado o noivado, questões sociais e comentários polêmicos sobre o passado do genro o fizeram mudar de ideia.
Na época, o relacionamento virou motivo de chacota no estado ultraconservador, ainda mais por envolver uma herdeira e um ex-soldado-poeta. "E não é que o Gomide vai casar a filha com um boêmio?", ironizavam pelas ruas, muito embora Cepelos fosse um homem obstinado e estudioso.
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Foi aí que o prestígio do senador entrou em jogo, pois tratava-se de um período em que a palavra era considerada sagrada pela população. O caos influenciou diretamente em sua decisão de impedir o noivado de maneira brutal, ao invés de dialogar com a própria filha.
O jornalista Roberto Pompeu de Toledo, autor de "A Capital da Vertigem", descreve que o senador vinha apresentando sinais de melancolia e ansiedade nos dias que antecederam o assassinato de Sophia. Ele teria procurado ajuda psiquiátrica e confidenciou a amigos que não suportava a ideia de se afastar da herdeira.
Outra versão ainda sugere que Gomide seria o verdadeiro pai de Cepelos, fruto de um relacionamento extraconjugal do político. Incapaz de revelar o segredo, ele teria escolhido a morte como única saída para impedir a união de irmãos em matrimônio. Essa hipótese jamais foi confirmada, mas repercutiu por décadas.
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Natural de Cotia, Cepelos trabalhou como soldado e delegado de São Paulo, estudou Direito e, depois, virou promotor. Ele era talentoso com as palavras e admirado por Olavo Bilac.
Cepelos foi transferido para Itapetininga após a tragédia, marcando ausência no enterro de Sophia. Arrasado, ele se mudou para o Rio de Janeiro, onde viveu à margem da profissão jurídica e literária.
O poeta viveu no anonimato e na pobreza, algo que motivou a venda de livros de porta em porta. Em 1915, nove anos depois do crime brutal, ele cometeu suicídio ao saltar de uma pedreira na Lapa.
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