Cotidiano

Nova era do gelo? O colapso no oceano que pode congelar a Europa nas próximas décadas

Estudos indicam que o enfraquecimento da Corrente do Golfo pode provocar frio extremo e secas globais

Ana Clara Durazzo

Publicado em 29/12/2025 às 10:00

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De acordo com as pesquisas, o enfraquecimento acelerado da Amoc pode levar a mudanças abruptas nos padrões climáticos entre as próximas décadas / ImageFX

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Um dos sistemas oceânicos mais importantes do planeta, responsável por regular o clima no hemisfério norte, pode estar se aproximando de um ponto crítico. Estudos recentes conduzidos por institutos internacionais de pesquisa climática alertam para o risco de colapso da Circulação Meridional de Revolvimento do Atlântico (Amoc) — sistema que inclui a Corrente do Golfo — com consequências potencialmente drásticas para o clima global.

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De acordo com as pesquisas, o enfraquecimento acelerado da Amoc pode levar a mudanças abruptas nos padrões climáticos entre as próximas décadas, com alguns modelos apontando um possível ponto de inflexão entre 2039 e 2070, enquanto outros sugerem que sinais iniciais desse processo já podem surgir ainda nesta década.

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O que é a Corrente do Golfo e por que ela é vital

A Amoc funciona como uma gigantesca ‘esteira transportadora’ de calor. Ela leva águas quentes do Atlântico tropical em direção ao Atlântico Norte pela superfície e devolve águas frias e densas em grandes profundidades. Esse mecanismo mantém o clima da Europa Ocidental muito mais ameno do que outras regiões na mesma latitude, como partes do Canadá.

Por esse motivo, a Corrente do Golfo é frequentemente chamada de ‘aquecedor da Europa’. Qualquer desaceleração significativa no sistema altera não apenas o clima europeu, mas também padrões de chuva e temperatura em várias partes do mundo.

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Derretimento do gelo ameaça o funcionamento do sistema

Segundo os cientistas, o principal fator de risco é o derretimento acelerado das geleiras da Groenlândia, que libera grandes volumes de água doce no Atlântico Norte. Essa água, menos densa e mais fria, dificulta o afundamento das massas oceânicas — etapa essencial para manter o motor da circulação funcionando.

O aquecimento global agrava ainda mais o problema. Com a atmosfera mais quente, o oceano perde a capacidade de liberar calor durante o inverno, enfraquecendo a mistura entre as camadas de água e reduzindo o fluxo de calor para o norte.

Possíveis consequências de um colapso

Os impactos de um colapso total ou parcial da Amoc seriam sentidos em escala global. Entre os principais efeitos apontados pelos estudos estão:

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Europa: invernos extremamente rigorosos, com possibilidade de uma ‘pequena era do gelo’, além de verões mais secos e prolongados

América do Norte: elevação do nível do mar na costa leste

África e América do Sul: redução das chuvas, afetando diretamente a agricultura e o abastecimento de água

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Mundo: intensificação de eventos climáticos extremos e mudanças profundas nos regimes de precipitação

Pesquisas indicam que, mesmo antes de um colapso completo, pequenas reduções no transporte de calor já seriam suficientes para provocar impactos severos.

Estudos indicam aceleração do processo

Uma pesquisa publicada na revista Environmental Research Letters, coordenada por cinco institutos internacionais, aponta que a Amoc pode desacelerar drasticamente ainda neste século e atingir seu ponto crítico nas próximas décadas. O estudo foi liderado pelo Serviço Meteorológico Real dos Países Baixos, com participação do Instituto Potsdam para Pesquisa sobre Impacto Climático (PIK).

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Segundo Stefan Rahmstorf, chefe do departamento de Análise do Sistema Terrestre do PIK, ‘nas simulações, o ponto de inflexão nos mares-chave do Atlântico Norte geralmente ocorre nas próximas décadas, o que é muito preocupante’. Após esse ponto, o desligamento da circulação se tornaria inevitável devido a mecanismos de retroalimentação.

Em alguns modelos, o fluxo de calor transportado pela Amoc cairia para menos de 20% do nível atual — e, em cenários extremos, quase a zero.

Simulações até o ano 2500 reforçam o alerta

Os pesquisadores analisaram 38 modelos climáticos diferentes, incluindo os utilizados pelo IPCC, com simulações que se estendem até os anos de 2300 a 2500. Em todos os cenários de altas emissões de gases do efeito estufa, a circulação oceânica evolui para um estado mais fraco e raso, culminando no desligamento da convecção profunda no Atlântico Norte.

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Mesmo em cenários de emissões intermediárias ou baixas, o risco de colapso ainda existe, estimado em cerca de 25%. Os mares de Labrador, Irminger e Nórdico aparecem como regiões-chave para o possível ponto de inflexão, afetando diretamente países como Canadá, Islândia, Noruega, Dinamarca e Rússia.

Uma ameaça já reconhecida no cenário internacional

Relatório divulgado pela Universidade de Exeter, assinado por mais de 160 cientistas de 23 países, alerta que o colapso da Amoc poderia mergulhar o noroeste da Europa em uma ‘pequena era do gelo’, com gelo marinho cobrindo o Mar do Norte no inverno e temperaturas podendo chegar a –30 °C em algumas regiões.

A gravidade do cenário levou autoridades a tratar o tema como uma questão de segurança. O ministro do Clima da Islândia, Johann Pall Johannsson, classificou o fenômeno como ‘uma ameaça direta à resiliência e à segurança nacional’.

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Redução de emissões é considerada essencial

Os cientistas são unânimes ao afirmar que reduzir drasticamente as emissões de CO e acelerar a transição para fontes de energia limpa é a principal forma de diminuir o risco de colapso da Amoc. Embora alguns efeitos já possam ser inevitáveis, ações rápidas podem retardar o processo e reduzir sua intensidade.

‘É crucial reduzir as emissões rapidamente. Isso diminuiria muito o risco de um colapso da Amoc, embora já seja tarde demais para eliminá-lo completamente’, afirma Rahmstorf.

Diante do avanço das mudanças climáticas, o futuro da Corrente do Golfo deixa de ser apenas um tema acadêmico e passa a representar um dos maiores desafios ambientais e geopolíticos do século.

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