Raro fenômeno geográfico em mar aberto, ele forma um labirinto de ilhas, dunas, manguezais e canais navegáveis, com forte potencial para o ecoturismo e o turismo científico. / MTur Destinos
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Entre o Ceará e o Maranhão, o Piauí guarda um dos tesouros naturais mais impressionantes do país e, paradoxalmente, um dos menos explorados. Com apenas 66 quilômetros de litoral, o menor do Brasil, o estado abriga o Delta do Parnaíba, uma formação em mar aberto única nas Américas, composta por dezenas de ilhas, canais e manguezais que abrigam uma biodiversidade singular.
Mesmo com tamanho potencial, a região segue fora das principais rotas turísticas do Nordeste, resultado de desafios históricos, geográficos e estruturais que ainda limitam seu desenvolvimento costeiro.
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Diferente de outros estados nordestinos, o Piauí se formou voltado para o interior. A colonização avançou pelo sertão, impulsionada pela pecuária e pelas rotas comerciais que ligavam o Nordeste ao Norte do país, deixando o litoral praticamente esquecido.
Até o final do século XIX, a faixa costeira nem sequer fazia parte do território piauiense — ela foi incorporada apenas após um acordo político com o Ceará, em que áreas do interior foram trocadas por um pequeno trecho à beira-mar.
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Essa integração tardia explica por que o estado nunca desenvolveu tradição marítima, portos estruturados ou indústria pesqueira de grande porte.
Outro fator que contribuiu para o isolamento do litoral é a distância de Teresina, a capital piauiense, situada a mais de 320 quilômetros do mar.
A cidade, construída no encontro dos rios Parnaíba e Poti, tornou-se o principal centro político e econômico, mas deixou o litoral sem o apoio de uma metrópole próxima.
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Cidades como Parnaíba, Luís Correia, Ilha Grande e Cajueiro da Praia cresceram lentamente, com infraestrutura limitada e dependência de investimentos sazonais.
Enquanto outras capitais nordestinas se desenvolveram “olhando para o mar”, o Piauí manteve seu foco voltado para o interior.
O Delta do Parnaíba é o grande trunfo do estado. Raro fenômeno geográfico em mar aberto, ele forma um labirinto de ilhas, dunas, manguezais e canais navegáveis, com forte potencial para o ecoturismo e o turismo científico.
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A região atrai observadores de aves, pesquisadores e viajantes em busca de experiências de natureza intocada.
Ainda assim, a falta de acesso facilitado, infraestrutura turística e políticas permanentes tem impedido que o destino alcance o destaque merecido.
'O Delta tem um potencial comparável ao dos Lençóis Maranhenses, mas precisa de gestão integrada e investimentos em sustentabilidade', resume um consultor do setor.
O principal acesso terrestre ao litoral é pela BR-343, que liga Teresina a Parnaíba. Apesar de trechos duplicados, o percurso de mais de 300 quilômetros ainda é longo e cansativo. Essa dificuldade afeta o fluxo de turistas e o transporte de cargas.
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O aeroporto de Parnaíba começa a mudar esse cenário: em 2025, passou a contar com voo direto para Fortaleza, operado pela LATAM, o que deve integrar o litoral piauiense à malha aérea regional.
No campo econômico, o Porto de Luís Correia, conhecido como Porto Piauí, tornou-se um símbolo de promessas adiadas.
Projetado há décadas, passou por diversas inaugurações sem operação contínua. Em 2025, o governo estadual anunciou a conclusão de parte das estruturas e negociações com empresas de navegação, o que pode reativar a economia local.
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Estudos de turismo e urbanismo apontam que o litoral piauiense sofre com a falta de continuidade administrativa.
Obras em orlas, como a da Praia de Atalaia, em Luís Correia, foram reformadas com recursos federais, mas se deterioraram pela ausência de manutenção.
Projetos turísticos desatualizados, secretarias municipais sem estrutura e ações pontuais em períodos eleitorais formam um ciclo de avanços temporários e retrocessos recorrentes.
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Enquanto o Piauí enfrentava entraves internos, os vizinhos Jericoacoara (CE) e Lençóis Maranhenses (MA) se consolidaram como destinos internacionais de ecoturismo.
Localizado exatamente entre os dois, o litoral piauiense acabou se tornando rota de passagem: muitos turistas o atravessam, mas sem pernoitar.
A tentativa de reverter esse cenário veio com a inclusão do estado na Rota das Emoções, circuito turístico que conecta Jericoacoara, Delta do Parnaíba e Lençóis Maranhenses.
A iniciativa aumentou a visibilidade da região, mas o desafio agora é transformar o fluxo de visitantes em estadias mais longas e renda para as comunidades locais.
Com novos voos, reestruturação do porto e atenção crescente do setor público, o Piauí dá sinais de avanço.
Mas o consenso entre especialistas é claro: sem planejamento integrado, capacitação profissional e conservação ambiental, o litoral continuará preso ao ciclo de promessas interrompidas.
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O Delta do Parnaíba segue como um gigante natural adormecido, à espera de políticas que aliem crescimento econômico, sustentabilidade e valorização cultural.
A pergunta que permanece é se o Piauí, enfim, conseguirá transformar seus 66 quilômetros de costa no símbolo de um modelo duradouro de desenvolvimento e turismo ecológico.