A trajetória dessa espécie é curiosa e ilustra como a natureza ainda guarda surpresas / Foto de Amanda Selinger
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Uma espécie que chegou a ser considerada possivelmente extinta na natureza foi reencontrada por pesquisadores em Itanhaém, no litoral de São Paulo. O achado aconteceu no início do ano, enquanto o registro científico da descoberta foi publicado recentemente na revista Biota Neotropica.
Na ocasião, os pesquisadores localizaram cinco exemplares do Leptopanchax itanhaensis em uma poça temporária e em uma vala de estrada situadas na sub-bacia do Rio Preto.
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Trata-se de um peixe anual que vive em ambientes de águas escuras, ácidas e com pouco oxigênio. Até o momento, sua ocorrência é conhecida apenas em Itanhaém.
A trajetória dessa espécie é curiosa e ilustra como a natureza ainda guarda surpresas. O primeiro local onde o peixe havia sido encontrado foi destruído em 2007 e, desde então, não houve mais registros — apesar dos esforços de diversos grupos de pesquisa para localizá-lo novamente.
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Veja também que um outro peixe reapareceu no litoral de São Paulo após quase 30 anos desaparecido.
Os cinco peixes encontrados eram todos machos. O maior deles media apenas 2,45 centímetros, o que demonstra o pequeno porte da espécie.
O pesquisador João Henrique Alliprandini da Costa, doutorando do Programa de Biodiversidade de Ambientes Costeiros da Unesp – Câmpus do Litoral Paulista, destacou a preocupação de ter encontrado um animal tão ameaçado em um ambiente tão frágil.
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Em sua tese de doutorado, ele aborda os riscos para a conservação da espécie e a relevância da redescoberta:
“A sua ocorrência em poças temporárias é natural, contudo, seu registro em valas de estradas levanta preocupações sobre uma possível perda de habitat de uma espécie tão ameaçada, uma vez que é um ambiente artificial, e com condições hostis (ausência de mata ciliar, o que torna ela extremamente quente; possibilidade de carreamento de poluentes e lixos pela água que passa na estrada, entre outras coisas)", afirma.
Ele afirma ainda que "mesmo em ambiente natural, a área que a espécie foi redescoberta tem sido alvo de desmatamento. Esse novo relato e redescoberta da espécie é essencial, trazendo a necessidade de medidas urgentes para proteger a espécie, que além de ser alvo da perda de habitat, que atinge diretamente as poças que habitam, pode ser alvo também do comércio ilegal de espécies – devido a sua beleza chamativa”.
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Conheça também o predador fluvial gigante que foi identificado em rios da Ásia depois de 20 anos de buscas.
Segundo Costa, os pesquisadores pretendem continuar monitorando a espécie nos próximos meses e anos para compreender melhor aspectos de sua biologia, como alimentação, reprodução e genética, além de avaliar as condições de vulnerabilidade da população. Ele complementa:
“Essa descoberta é um lembrete poderoso da importância de proteger os ambientes naturais remanescentes e dos esforços contínuos necessários para garantir a preservação da biodiversidade única da Mata Atlântica. Essa pesquisa de doutorado busca entender melhor a composição de espécies em poças temporárias e valas de estrada na região, ambientes que abrigam não apenas os rivulídeos ameaçados, mas uma diversidade de peixes pouco conhecidos pela ciência.”
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Quem quiser acompanhar o trabalho pode seguir o projeto no Instagram: @peixesdepoca.
Peixes anuais são espécies que vivem em ambientes temporários, como brejos e poças d’água, e têm seu ciclo de vida diretamente ligado às estações secas e chuvosas. Eles depositam seus ovos no solo, e os adultos morrem quando a água seca. Quando as chuvas retornam e as poças se enchem novamente, os filhotes eclodem e reiniciam o ciclo.
Esses peixes, bastante apreciados por aquariófilos, são comuns entre os rivulídeos e ocorrem tanto nas Américas quanto na África. Também recebem nomes populares como peixe do céu, peixe da poça ou peixe nuvem — este último, o mais conhecido.
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O estudo integra a tese de doutorado de João Henrique Alliprandini da Costa, orientado pelo Dr. Rafael Mendonça Duarte, professor da Unesp, e coorientado pela Dra. Ursulla Pereira Souza, da Universidade Santa Cecília (Unisanta).
Participam ainda o Dr. Francisco Langeani, da Unesp de São José do Rio Preto, e os mestrandos Amanda Selinger e Thomas Alves Vidal, da Unisanta.
O projeto recebe apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia – Centro de Estudos de Adaptações Aquáticas da Amazônia (INCT-ADAPTA II).
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Além da equipe acadêmica, o trabalho conta com o envolvimento de diversos alunos de mestrado e graduação da Unesp e da Unisanta, e com a colaboração essencial de um morador local, Tuca, que acolhe os pesquisadores mensalmente em sua casa e facilita as atividades de campo.