Cotidiano
O levantamento realizado na Ilha do Cardoso abrangeu três habitats principais
A presença abundante e diversificada de moluscos reflete o bom estado de conservação da Ilha do Cardoso / Vanessa Simão/Divulgação
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Um estudo que será publicado na revista Hoehnea revelou a notável diversidade de moluscos que habitam o Parque Estadual da Ilha do Cardoso (PEIC), no litoral sul de São Paulo. A pesquisa destaca o papel crítico desses invertebrados para a manutenção dos ecossistemas costeiros e para o planejamento ambiental da região.
Liderado pelo pesquisador Edison Barbieri, em colaboração com Thalassia Giaccone, Rodrigo Cesar Marques e Vanessa Simão do Amaral, o artigo apresenta um inventário detalhado das espécies de moluscos da ilha e mostra como elas podem orientar ações de manejo e conservação.
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O levantamento realizado na Ilha do Cardoso abrangeu três habitats principais, manguezais, praias arenosas e costões rochosos —, evidenciando uma elevada diversidade de moluscos, incluindo bivalves, gastrópodes e cefalópodes.
Entre as espécies registradas destacam-se Crassostrea spp., Perna perna, Mytilus spp. e Anomalocardia brasiliana, todas amplamente reconhecidas por sua importância ecológica e econômica.
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Essas comunidades exercem funções-chave na manutenção da integridade dos ecossistemas costeiros, atuando na filtragem da água, na ciclagem de nutrientes e na estabilização dos sedimentos.
Vanessa Simão/DivulgaçãoAlém disso, formam bancos naturais biogênicos que fornecem abrigo, alimento e substrato para diversas outras espécies de invertebrados, peixes e aves costeiras.
A presença abundante e diversificada de moluscos reflete o bom estado de conservação da Ilha do Cardoso, considerada um dos últimos refúgios de ecossistemas costeiros relativamente intactos do litoral paulista.
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No entanto, mesmo em áreas protegidas, essas comunidades sofrem pressões crescentes, como a poluição por metais pesados, o acúmulo de microplásticos e a introdução de espécies exóticas que competem por espaço e recursos.
A sobrepesca e a coleta irregular de ostras, mexilhões e berbigões para consumo e comércio também representam ameaças diretas à manutenção dos estoques naturais e à regeneração das populações.
“Os moluscos são bioindicadores da qualidade ambiental. Compreender sua distribuição e as pressões sobre suas populações é fundamental para o manejo do parque”, explica Barbieri.
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O pesquisador ressalta ainda que o monitoramento contínuo desses organismos pode servir como uma ferramenta estratégica para detectar alterações sutis no equilíbrio ecológico, permitindo respostas rápidas de gestão e conservação.
Assim, o estudo reforça a importância dos moluscos não apenas como componentes da biodiversidade local, mas como elementos estruturantes das funções ecológicas e do funcionamento sustentável dos ecossistemas costeiro
O estudo alerta para a presença de espécies exóticas, como Saccostrea cucullata e Perna viridis, introduzidas possivelmente pelo tráfego marítimo e pelas atividades de aquicultura. Essas espécies competem diretamente com as nativas por espaço e alimento, podendo alterar profundamente a estrutura e o funcionamento dos ecossistemas locais.
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Além dessas rotas conhecidas, cresce a preocupação com a poluição por plásticos, que atua como um novo e eficiente vetor de dispersão biológica.
Fragmentos plásticos flutuantes oferecem substrato para a fixação de organismos marinhos, como o mexilhão-verde (Perna viridis), encontrado aderido a resíduos plásticos em diversas regiões costeiras do Brasil. Esse processo favorece a introdução e o transporte de espécies invasoras a longas distâncias, ampliando o risco ecológico.
Casos emblemáticos, como o dos “patos de borracha” que caíram de um navio chinês em 1992 e percorreram oceanos por décadas, ilustram o potencial de mobilidade e persistência dos plásticos nos mares.
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Assim como esses brinquedos, detritos plásticos podem atravessar fronteiras geográficas e ecológicas, levando consigo organismos oportunistas capazes de colonizar novos ambientes.
Mesmo sendo uma das áreas mais preservadas do litoral paulista, o Parque Estadual da Ilha do Cardoso (PEIC) enfrenta pressões crescentes do turismo náutico, da atividade portuária e agora da poluição plástica.
Diante desse cenário, os pesquisadores reforçam a necessidade urgente de políticas públicas voltadas ao monitoramento contínuo, à gestão integrada dos resíduos e ao controle biológico rigoroso.
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Essas ações são essenciais para conter a disseminação de espécies invasoras e garantir a conservação da biodiversidade marinha local.-
O estudo propõe ações práticas para incorporar os resultados ao Plano de Manejo do PEIC, entre elas:
• Monitoramento contínuo da malacofauna para detectar mudanças ambientais e novas invasões;
• Controle preventivo de espécies exóticas, com protocolos de biossegurança em áreas portuárias e de aquicultura;
• Proteção de áreas sensíveis, como bancos naturais de mexilhões e regiões de reprodução de bivalves;
• Promoção da maricultura sustentável, alinhada à capacidade ecológica da região;
• Monitoramento da qualidade da água, já que os moluscos acumulam metais e poluentes;
• Educação ambiental e engajamento comunitário, valorizando o conhecimento tradicional de pescadores e marisqueiras.
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Mais do que um inventário, o estudo serve como ferramenta de gestão. As informações podem subsidiar revisões do Plano de Manejo, estudos de impacto ambiental e políticas públicas voltadas ao uso sustentável dos recursos marinhos do Lagamar de Cananéia-Iguape-Ilha Comprida.
Para os autores, a Ilha do Cardoso é um patrimônio natural e científico de valor inestimável. O conhecimento gerado fortalece a integração entre ciência, conservação e desenvolvimento sustentável, consolidando a região como modelo de gestão ecológica no Atlântico Sul.