Cotidiano

Entenda por que o mesmo remédio não funciona igual para todo mundo

Fatores genéticos, fisiológicos e comportamentais influenciam diretamente como o corpo absorve, distribui, metaboliza e elimina um fármaco

Ana Clara Durazzo

Publicado em 03/07/2025 às 10:30

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Você já tomou um medicamento que funcionou perfeitamente para alguém, mas não teve efeito algum em você? Ou pior: sentiu efeitos colaterais intensos enquanto outras pessoas nem perceberam que estavam medicadas / Pixabay

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Você já tomou um medicamento que funcionou perfeitamente para alguém, mas não teve efeito algum em você? Ou pior: sentiu efeitos colaterais intensos enquanto outras pessoas nem perceberam que estavam medicadas? Apesar de curioso, esse fenômeno é comum  e a ciência tem explicações claras para isso.

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Cada organismo é biologicamente único. Fatores genéticos, fisiológicos e comportamentais influenciam diretamente como o corpo absorve, distribui, metaboliza e elimina um fármaco. 

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Essas diferenças fazem com que o corpo de cada pessoa processe os medicamentos de maneira distinta, tanto na velocidade quanto na eficácia e na tolerância a efeitos adversos. 

Fatores como idade, peso e sexo também fazem diferença

A idade é um dos principais fatores fisiológicos que afetam a metabolização de remédios. Moriel explica que “bebês e idosos têm metabolismo mais lento, o que pode aumentar o tempo de ação e os riscos de efeitos adversos”, o que exige, na maioria dos casos, ajustes nas doses.

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O peso corporal também interfere, visto que pessoas com maiores pesos corpóreos podem precisar de doses mais altas para atingir o mesmo efeito, pois o medicamento pode ser mais diluído em um volume maior de sangue e tecidos.

Já o sexo biológico influencia a resposta medicamentosa devido a diferenças hormonais e metabólicas, o que reforça a complexidade de se prescrever um tratamento universalmente eficaz.

Genética: o fator invisível que muda tudo

A genética, porém, é um dos aspectos mais determinantes. Embora nosso DNA seja 99,9% igual entre todos os humanos, o 0,1% restante pode definir se um remédio será eficaz, inofensivo ou até perigoso. Diferentes pessoas produzem quantidades distintas de enzimas que metabolizam os medicamentos, o que pode acelerar ou retardar sua eliminação do organismo.

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Um dos genes mais estudados nesse contexto é o CYP2D6, responsável por metabolizar uma variedade de medicamentos como antidepressivos e analgésicos. Indivíduos com uma versão hiperativa desse gene podem eliminar o remédio tão rapidamente que ele se torna ineficaz. Já aqueles com uma versão lenta correm o risco de acumular a substância no organismo, aumentando a chance de toxicidade.

Essa área de estudo, conhecida como farmacogenética ou farmacogenômica, tem sido cada vez mais usada para personalizar tratamentos. Os testes genéticos já ajudam na escolha de medicamentos em áreas como oncologia e psiquiatria, ao identificar variantes nos genes CYP2D6, CYP2C19 ou SLCO1B1, que afetam a resposta a antidepressivos, anticoagulantes e estatinas.

Segundo ela, também é possível analisar mutações em genes como EGFR, BRCA1/2 e HER2, o que permite direcionar terapias-alvo para o tipo exato de tumor do paciente.

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Esses testes podem ser realizados por meio de amostras de sangue, saliva ou biópsias tumorais, dependendo da finalidade. Embora no Brasil esses testes ainda não estejam amplamente disponíveis na rede pública, em países como a Espanha, eles já fazem parte dos protocolos do sistema público de saúde, sendo realizados antes da prescrição de certos medicamentos. O objetivo é claro: aumentar a eficácia do tratamento e reduzir os riscos de reações adversas.

O papel do fígado e dos rins no processamento dos remédios

A forma como o organismo lida com os medicamentos também depende do bom funcionamento de órgãos como o fígado e os rins. O fígado é responsável por metabolizar a maioria das substâncias, enquanto os rins cuidam da excreção. 

Alimentos, álcool e cigarro: aliados ou vilões?

Além das características biológicas, o estilo de vida também influencia a ação dos medicamentos. Um exemplo clássico é o suco de grapefruit (toranja), que pode inibir a enzima CYP3A4, elevando a concentração de certos medicamentos no sangue e aumentando os riscos de efeitos colaterais. Laticínios, por sua vez, podem interferir na absorção de antibióticos como tetraciclina e ciprofloxacino.

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O consumo de álcool e tabaco também é relevante, visto que bebidas alcoólicas podem potencializar a ação de sedativos, antidepressivos tricíclicos e antipsicóticos, além de sobrecarregar o fígado, aumentando o risco de toxicidade. Já o tabagismo acelera a metabolização de alguns medicamentos, como a teofilina e a olanzapina, reduzindo sua eficácia.

A promessa da medicina personalizada

Diante de tantas variáveis, o ideal seria que cada paciente recebesse um tratamento personalizado. Essa é justamente a proposta da farmacogenômica: cruzar dados genéticos com o perfil clínico para prescrever medicamentos sob medida. Estudos já indicam que as reações adversas podem ser reduzidas em até 30% quando a dose é ajustada com base no DNA do paciente.

Com o avanço da tecnologia, os testes genéticos vêm se tornando mais acessíveis, embora ainda caros para grande parte da população — o custo pode ultrapassar R$ 5.000. No entanto, o Brasil tem investido na área, por meio de instituições como o CNPq e a Fapesp.

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Enquanto a medicina personalizada não se torna uma realidade para todos, médicos e farmacêuticos seguem ajustando doses e monitorando pacientes, combinando ciência e experiência para garantir que o remédio, de fato, cumpra seu papel: fazer bem.

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