Cotidiano

Entenda como o uso de tratores 'detona' a fauna do litoral durante a limpeza das praias

A cidade de Peruíbe (SP), por exemplo, eliminou o uso do trator em uma praia e viu o retorno da fauna; pesquisadores pedem ampliação da medida

Márcio Ribeiro, de Peruíbe para o Diário

Publicado em 11/07/2025 às 14:50

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Tratores compactam o solo, retiram o alimento dos bichos e podem até matá-los / Márcio Ribeiro/DL

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Esporões, ameixas-do-mar, pegoavas, tatuíras, garoçás, siris e diversos outros seres vivos. A praia, no geral, é um ambiente riquíssimo em biodiversidade, principalmente de macrofauna – animais com até meio milímetro que habitam a areia. A limpeza desse ambiente feita com tratores é considerada ultrapassada e preocupa pesquisadores.
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A Dra. Jéssica Colavite, do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo (USP), afirma que a limpeza mecânica de praias para remoção de algas, gramas marinhas e lixo – por razões de conservação, estética ou limpeza urbana – causa impactos muitas vezes negativos à fauna local.

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“O material arribado é frequentemente retirado da praia. Ele é composto por algas e plantas marinhas que, além de servirem de alimento, criam habitats únicos e são meios de dispersão da fauna de invertebrados bentônicos, como crustáceos anfípodes (pulgas-da-praia), que servem de alimento para muitos outros animais costeiros, como as Maria-Farinhas.”

Já a Dra. Fernanda Ramos Fernandes de Oliveira, do Instituto do Mar da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), destaca que a limpeza intensiva afeta a densidade e a diversidade de espécies, além de dificultar sua recolonização, especialmente quando os impactos são profundos ou frequentes:

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“A própria presença dos maquinários afeta negativamente a fauna desse ecossistema. Já foi comprovado que a presença de veículos, mesmo em praias pouco urbanizadas, leva ao atropelamento de indivíduos dessa fauna, além de compactar o solo. A limpeza de praias realizada mecanicamente não é seletiva e retira uma grande quantidade de sedimento, agravando os impactos causados.”

Em Peruíbe

O biólogo Bruno Lima, do Projeto Aves Limícolas, disse que pediu para que a limpeza nas praias do Guaraú, Costão e Taniguá, em Peruíbe – locais com maior concentração de aves – fosse feita de forma manual ou por meio de mutirões. Segundo ele, os tratores compactam o solo, retiram o alimento dos bichos e podem até matá-los:

“Entramos com o pedido para suspender a limpeza de praia com tratores. Onde conseguimos foi no Taniguá, onde o trator só limpa até as Ruínas. E o que aconteceu? Em agosto e setembro, que é quando tem mais insetos e quando chegam as limícolas migratórias, tem mais comida para elas. Antes, o trator tirava as joaninhas, besouros e mariposas, deixando a praia deserta – ou seja, sem alimento.”

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A bióloga e doutoranda Karina Ávila, autora de estudos com aves limícolas, afirmou que, para comprovar os efeitos positivos na Praia do Taniguá – onde o trator deixou de passar – ainda é preciso mais tempo de pesquisa. No entanto, ela se mostra otimista quanto aos resultados futuros, já que um dos maiores causadores de impacto foi eliminado naquele trecho:

“Tem que fazer um trabalho mais minucioso. Para saber os benefícios sobre a população das aves, só com um tempo maior de estudo. Não dá para dizer de imediato que a quantidade de aves aumentou só porque não passa mais trator. Isso não tem como afirmar ainda, mas que cortamos o impacto, isso dá.”

Resposta

O secretário de Meio Ambiente de Peruíbe, Eduardo Ribas, informou que as praias do Índio, Prainha, Guarauzinho, Arpoador, Parnapoa, Praia Brava, Juquiazinho, Desertinha, Caramborê, Barra do Una e Taniguá não recebem limpeza com tratores. Vale lembrar que nove dessas 11 praias não possuem acesso por estrada e estão dentro de unidades de conservação.

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Sobre as praias do Costão e parte da Praia do Guaraú, Ribas afirmou que são áreas bastante frequentadas e que a limpeza regular com tratores é importante por conta da demanda da população e do turismo de sol e praia. Em relação à Praia do Taniguá e a outro trecho da Praia do Guaraú, ele declarou:

“Estamos em processo de transformação da Praia do Taniguá em uma Unidade de Conservação de Proteção Integral (RVS ou Parque), e 950 metros da Praia do Guaraú (trecho defronte ao Parque Natural Municipal Restinga do Guaraú) estão incluídos no Plano de Manejo do Parque como área de exclusão de limpeza mecanizada de praia.”

Conclusão

Os especialistas apontam que o manejo sustentável das praias deve ser levado em conta, e não se deve priorizar apenas a indústria do turismo e a urbanização. Muitos estudos recomendam a limpeza manual em vez da limpeza mecânica, alegando que esta última produz impactos negativos significativos à fauna desse ecossistema.

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