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Cotidiano

Centro Histórico de Santos agoniza com saída de empresas

ABANDONO. Prédios históricos, ocupados anteriormente por empresas de diversos segmentos, estão desocupados

Rafaella Martinez

Publicado em 19/02/2017 às 08:30

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Prédios históricos, ocupados anteriormente por empresas de diversos segmentos, estão desocupados / Rodrigo Montaldi/DL

Basta uma pequena caminhada pelas principais ruas do Centro Histórico de Santos para perceber a ociosidade de prédios anteriormente ocupados por bares e empresas do ramo de logística e comércio exterior. Nesse segundo caso, ao que tudo indica, a proximidade com o porto, alfândega e outros locais de interesse para o despacho aduaneiro parece não ser mais um diferencial para esses estabelecimentos que, pouco a pouco, migraram para outras localidades da cidade. Contrariando as estatísticas que apontam que a região ainda possui valores convidativos, o destino de boa parte desses estabelecimentos foi o Gonzaga, bairro com o metro quadrado mais caro de Santos.

O processo de desocupação do centro teve início ainda nos anos 90, com o crescimento do comércio em outros bairros da cidade. Mecanismos foram criados pela Administração, na ocasião, para que a situação fosse revertida: dentre eles o ‘Alegra Centro’, legislação que visa conceder incentivos fiscais para os empresários que queiram instalar empresas e revitalizar a região. Embora tenha alcançado êxito em alguns aspectos, a morosidade, a desatualização e a burocracia da legislação acabaram por afastar alguns dos empresários.

Foi o caso de Luiz Mastellari, antigo proprietário do Typographia Brasil – primeira casa noturna instalada no bairro, em 2006. O imóvel histórico, que abrigou em 1900 uma das primeiras tipografias do País, está fechado desde a saída do comércio do local, em 2013.

“A legislação não garante vantagens para quem queira fixar comércio no local. Antes de iniciar as atividades, em 2008, fui questionado se gostaria de restaurar a fachada do imóvel em troca de isenção de três anos do IPTU. Topei pois estimei a obra de restauro - que traria benefícios estéticos para o bar - em R$20 mil. Quando comecei fui informado que precisaria fazer uma pesquisa do tipo de tinta e somente uma empresa fazia esse serviço. Depois, tive que seguir uma série de outras determinações e na ponta do lápis gastei R$150 mil. Os incentivos não compensam”, conta.

Ele ainda cita outras obras que precisou fazer por estar em um imóvel histórico. “Pouco tempo depois de iniciar as atividades no local recebi um comunicado da Administração pedindo que eu trocasse todas as telhas – que estavam em bom estado – por telhas francesas. A justificativa era que precisava haver um padrão para o caso de algum helicóptero sobrevoar a área. Mesmo sem ser o proprietário do imóvel, gastei R$32 mil, que nunca foram reembolsados”, conta.

As determinações de segurança também se mostraram um desafio constante. “Falavam que eu precisava aumentar o tamanho da minha porta, mas por ser tombada eu não poderia fazer isso. Para limitar a quantidade de frequentadores dentro do bar eu deveria gastar mais dinheiro reduzindo a área. Certa vez um órgão da Prefeitura disse que eu precisaria colocar uma rampa de acessibilidade. Daí outro órgão afirmou que eu não poderia mudar a estrutura. Ninguém se entende e quem sai lesado é o investidor”, ressalta.

A degradação dos imóveis e as dificuldades em promover mudanças estruturais significativas são fatores relevantes que fizeram com que algumas empresas deixassem o centro. Na visão do diretor regional do Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Residenciais e Comerciais (Secovi), Carlos Meschini, a crise econômica financeira fez com que a concorrência ficasse mais forte e os imóveis para a locação em outras áreas da cidade mais acessíveis.

“Os novos prédios, equipamentos com tecnologia de ponta, cobram de aluguel o mesmo preço que os prédios antigos que não têm garagem, auditório ou sala de treinamento. Muitos desses empreendimentos novos foram erguidos para serem vendidos, mas o boom imobiliário e a crise econômica fizeram com que os proprietários entendessem que, na lógica do mercado, o aluguel era a melhor alternativa”, aponta.

Custos. A reportagem apurou que as empresas que deixaram a região central pagavam de R$ 10 mil a R$ 30 mil no aluguel de prédios históricos. Com limitações quanto à instalação plena de sistemas de ar-condicionado e falta de vagas para estacionar (visto que boa parte desses empreendimentos não dispõe de estacionamento), a migração foi a melhor solução para, inclusive, conseguir instalar todas as empresas de um mesmo grupo em um único espaço.

A localização também foi um fator considerado. “Em tempos de crise os empresários pensam em gastos funcionais. O transporte público e a oferta de alimentação na Zona Intermediária são melhores que na Região Central. Acredito que essa tendência de migração irá se acentuar pelos próximos cinco anos. O que acontecerá com o Centro eu não sei. É preciso que os prédios se modernizem e que o Poder Público crie incentivos reais para a ocupação dessa região”, finaliza Meschini.

Em tempo: das 439 isenções fiscais concedidas pela Administração para a revitalização do Centro Histórico, 287 ocorreram nos primeiros nove anos de vigência.

Ciente da situação, Prefeitura planeja desburocratização da lei

Em nota, a Prefeitura de Santos afirma que está ciente da situação apontada pelo Diário do Litoral e que está revendo, para o primeiro semestre de 2017, o aprimoramento da legislação relativa ao programa Alegra Centro. Garante ainda que estuda procedimentos de desburocratização da análise dos processos, ampliação dos incentivos fiscais associados à conservação predial, de modo a não criar situações que venham a impossibilitar a ocupação dos prédios.

Em conjunto com a revisão da legislação do Alegra Centro, estuda o desenvolvimento de ações de modo a potencializar a revitalização da região central, a exemplo de novo regramento para a fiação aérea, estímulo ao deslocamento com diferentes modais de transporte e ampliação de áreas caminháveis com acessibilidade e segurança.

Sobre a quantidade de empresas que fecharam ou migraram da área, disse, por meio da Coordenadoria de Assuntos Econômicos e Fiscais da Secretaria de Finanças, que, no ato da mudança de endereço, algumas empresas alteram razão social, CNPJ (entre outros dados), desvinculando o estabelecimento do endereço anterior. Por esse motivo, não é possível fornecer um número com precisão.

Ações de zeladoria. A Administração também realiza, desde o último dia 6, diversas intervenções de limpeza, conservação e revitalização de ruas e praças, dentro do projeto Viva o Centro. Comandado pelo grupo técnico de trabalho, que envolve ações integradas de várias secretarias da Prefeitura, a operação tem duração de 53 dias em cada fase e acontece sempre das 8h às 11h. As etapas se repetem outras duas vezes, nos mesmos locais, com o calendário de ações terminando em 21 de julho. Toda sexta-feira acontece alguma manifestação cultural para marcar a recuperação de praças e vias e ao final de cada uma das três etapas haverá atividades culturais e sociais.

A Subprefeitura da Região Central Histórica gerencia as operações. Duas equipes atuam simultaneamente, cada uma com quatro operários e um encarregado. Um grupo faz pintura e o outro a manutenção de pisos, mosaicos, rampa de acesso, recuperação de banco, etc.

A Secretaria de Serviços Públicos promove a poda das árvores e a limpeza da rede de drenagem; a Secretaria de Meio Ambiente, a conscientização e educação quanto ao descarte do lixo, e, com apoio da Guarda Municipal, também fiscaliza o descarte irregular de lixo.

A Secretaria de Finanças atua no combate ao comércio ambulante irregular e quando o Código de Posturas for desrespeitado. O Consultório na Rua, da Secretaria de Saúde, e a equipe de abordagem social, da Secretaria de Assistência Social, convidam as pessoas em situação de rua a conhecerem os respectivos serviços públicos.

As secretarias de Cultura e a de Turismo atuam na programação dos eventos, e a primeira pasta também se encarrega da recuperação dos monumentos das praças e estimulo a grafitagem de alguns locais que sofrem com o descarte irregular de detritos. A Prodesan responde por tapar buracos, enquanto a Secretaria de Infraestrutura e Edificações fiscaliza as calçadas particulares que apresentam problemas.

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