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Otaviano Lopes dos Santos teve sua carroça apreendida pela Prefeitura de Santos / NAIR BUENO/DIÁRIO DO LITORAL

Otaviano Lopes dos Santos, que trabalha como catador de material reciclado pelas ruas de Santos, revela que teve sua carroça apreendida pela Prefeitura de Santos, sábado passado, e não sabe como fazer para manter seu sustento. A Reportagem está aguardando um posicionamento da Administração. 

Além de fazer um trabalho essencial – recolher das ruas material que pode ser recuperado e reaproveitado por outras pessoas - Otaviano, de 56 anos, é parceiro no programa de extensão universitária na Universidade Federal do Estado de São Paulo (Unifesp). 

Ele foi informado que sua carroça teve como destino o lixão municipal e pede ajuda para reaver o veículo que lhe rendia diariamente e, com muita sorte, entre R$ 50,00 e R$ 70,00. Já há uma movimentação virtual para tentar ajudá-lo.  

Otaviano Lopes dos Santos faz parte de um grupo que passa despercebido pela sociedade e que está envolvido diretamente com o processo de reciclagem de resíduos. 

“Tem que trabalhar bem e dar sorte nas ruas. Papelão e ferro estão com preços bons e conseguimos vender nos ferros-velhos. Móveis e calçados a gente consegue vender nas feirinhas do rolo. Sem minha carroça, como vou sobreviver? Preciso de ajuda!”, explica. 

Otaviano revela que possui dois cadastros na Prefeitura e, portanto, trabalhava de forma totalmente legal. Conta que há 10 anos trabalha com reciclagem e foi graças a ela que conseguiu sair das ruas e viver de forma digna, pagando aluguel. Ele mora atualmente na Rua Senador Feijó, no Centro da Cidade. 

“Hoje, a reciclagem é nossa única alternativa. Eu morava na rua. Hoje, faço curso de Redução de Danos na Unifesp e participo de Grupo DiVerso, de pessoas que têm realidade igual a minha. Uma vida bastante difícil. Tenho dois certificados”, explica orgulhoso de sua contribuição com um ambiente mais sustentável.  

ROTINA.
O reciclador tinha uma rotina forte antes de ter sua carroça apreendida. Levantava de madrugada, por volta das 5 horas. Após recolher material descartável pelas ruas, seguia por volta do meio dia para pesar e vender a primeira leva de material. “Meu cadastro na Prefeitura é o 006. Ela estava sem o lacre porque não estão mais recadastrando por conta da pandemia. Tenho outro que me dá direito a vender o material também nas feirinhas, incentivadas pela própria Prefeitura”, explica.

Otaviano revela que a apreensão foi uma surpresa. Ele estava doente e acamado e sua carroça estacionada em frente sua casa. Quando acordou para trabalhar, viu que não estava mais e até pensou que tinha sido roubado. “Domingo, ao sair de casa para ir para a feira do rolo, ela não estava na porta. Na segunda-feira, um vizinho viu meu desespero e disse que a carroça havia sido levada pela Prefeitura por intermédio de dois caminhões do Cata-Treco. 

O trabalhador foi até a Vila Criativa – um equipamento da Prefeitura que é responsável também pelos projetos de reciclagem – e confirmou a apreensão e que sua carroça estaria no lixão. “Eu estou pagando a carroça. Para montá-la, peguei R$ 500,00 emprestados com o dono de um ferro-velho. Eu preciso, pelo menos, do eixo, para tentar construir outra carroça. Vou gastar dinheiro, mas volto a ganhar meu pão”, pede. 

O reciclador revela que antes, quando a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) apreendia as carroças por alguma infração, deixava um papel para que o trabalhador pudesse retirá-la por uma taxa de R$ 16,00. “Nem bateram na minha porta para avisar que iriam levar minha carroça”, lamenta. 

CONSELHEIRA.
A psicóloga Annie Louise Saboya Prado, que faz parte do Conselho Municipal de Políticas sobre Drogas (COMAD) membra do DiVerso - Saúde Mental, Redução de Danos e Direitos Humanos Grupo de Estudos, Pesquisa e Extensão da Unifesp, revela que a situação dele está longe de ser pontual e que a carroça foi retirada de uma pessoa que estava pagando aluguel e agora está sem renda. 

Para a psicóloga, a situação é um exemplo clássico de violação dos Direitos Humanos. “Uma ação absurda, arbitrária. Todas as vezes que buscamos responsabilizar alguém, nos deparamos que não existe lei que se encaixa nessa situação em favor da vítima. Ao contrário, usam leis de posturas, de trânsito e outras para legitimar as ações”, revela. 

Para a psicóloga, existe uma política de higienização disfarçada e enraizada no poder público, agora “agravada por conta da pandemia. Ao invés de receber apoio, as pessoas como Otaviano são prejudicadas com todo o tipo de violência”, finaliza.

DADOS.
O catador de material reciclável é considerado um importante agente ambiental, pois aumenta o índice de coleta seletiva no Brasil dando andamento a uma cadeia sustentável com a possibilidade de reaproveitamento e reciclagem de produtos inutilizados.

Pesquisas recentes do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) apontam que os catadores são responsáveis por quase 90% do lixo reciclado no Brasil.

De acordo com o Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis, há 800 mil profissionais do tipo em atividade no país e aproximadamente 85 mil associados ao Movimento Nacional. A maioria desses trabalhadores encontrou na profissão uma alternativa ao desemprego.

PREFEITURA

A Prefeitura não mencionou se irá devolver a carroça. Somente que a remoção se baseou Código de Posturas porque houve reclamação que o veículo estava sobre a calçada impedindo a passagem dos pedestres. Também que a carroça não tinha em sua estrutura nenhuma identificação do cadastro.

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