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Cotidiano

Casas de apostas online dominam patrocínios de clubes brasileiros

De 2023 para 2024, saltou de 11 para 14 o número de equipes que estampam casas de aposta no centro dos seus uniformes

JOÃO GABRIEL E PAULO SALDAÑA - FOlhapress

Publicado em 26/01/2024 às 17:54

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Essa disseminação é acompanhada de um crescimento nas mais diversas mídias, com recordes em patrocínios a alguns dos maiores clubes do futebol brasileiro e cada vez mais espaços nas camisa / Joédson Alves/Agência Brasil

Funcionando em uma zona cinzenta da legislação desde 2018, o mercado de apostas esportivas online explodiu em publicidade e já figura entre os maiores anunciantes de mídia do país.

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A Folha de S.Paulo mostrou que 15% da população brasileira diz apostar ou já ter apostado de forma online, com um gasto mensal, entre o total de pessoas que apostam, de R$ 263. O fenômeno é disseminado em todo o país, inclusive entre beneficiários do Bolsa Família, mas tem mais força entre os jovens e os homens.

Essa disseminação é acompanhada de um crescimento nas mais diversas mídias, com recordes em patrocínios a alguns dos maiores clubes do futebol brasileiro e cada vez mais espaços nas camisas.

Atualmente, 18 dos 20 times da Série A do Campeonato Brasileiro estampam em algum lugar do uniforme uma marca do setor, que vem galgando cada vez mais espaço na área mais nobre, a de patrocinador máster.

Só em janeiro deste ano, Flamengo e Corinthians, os dois clubes de maior torcida do país, trocaram seus parceiros principais por casas de aposta.

De 2023 para 2024, saltou de 11 para 14 o número de equipes que estampam casas de aposta no centro dos seus uniformes.

O principal ranking sobre o mercado publicitário, elaborado pelo portal Meio & Mensagem a partir de números apurados pela Kantar Ibope, também registra esse crescimento.

Em 2018, apenas uma casa de apostas figurava entre os 300 principais anunciantes do Brasil. Em 2022, já foram 12, inclusive com empresas entre os primeiros 50 colocados da lista.

A mais bem colocada era a Sportingbet, que investiu mais de R$ 200 milhões e ocupa o 49º lugar da lista geral.

Em 7 de janeiro deste ano, o Corinthians trocou a Hypera Pharma pela VaideBet, anunciada como o maior patrocínio máster do futebol brasileiro: R$ 370 milhões por três anos de contrato.

Já para o Flamengo, a Pixbet vai pagar até R$ 225 milhões em dois anos para ocupar o espaço nobre do uniforme e desbancar o BRB, banco que agora passará à região da omoplata.

O São Paulo já era patrocinado por uma casa de apostas, a Sportsbet.io, mas não quis esperar o contrato acabar e fechou um novo acordo, agora com a Superbet, que investirá R$ 156 milhões por três anos. A troca foi oficializada em 19 de dezembro.

A oferta de sites de apostas esportivas é liberada no Brasil desde 2018, após lei aprovada durante o governo Michel Temer (MDB), mas o tema não foi regulamentado pelo Executivo.

A partir disso, propagandas de bets passaram a dominar a grade da TV aberta, sobretudo em jogos de futebol. As redes sociais também foram inundadas de anúncios de jogos de apostas, viralizados pela atuação de influenciadores famosos.

O governo Jair Bolsonaro (PL) teve quatro anos para regulamentar o mercado, mas não o fez. Assim, o número de casas de apostas voltadas ao público brasileiro explodiu sem que houvesse regras claras para atuação nesse setor, tampouco órgãos fiscalizadores e controladores específicos para a atividade.

O governo Lula (PT) passou a trabalhar na regulamentação desde o ano passado. Já foi aprovada nova lei para definir taxação e funcionamento dessas empresas, que também deverão se credenciar para atuar no Brasil --atualmente, as empresas que oferecem apostas online no país têm sede no exterior.

A regulamentação total deve ser finalizada ainda no primeiro semestre. A partir daí, para funcionar no país, as empresas terão que cumprir exigências determinadas pelo Ministério da Fazenda, entre elas ter sede no Brasil, além de pagar uma outorga de até R$ 30 milhões.

Com isso, só poderão patrocinar clubes de futebol --ou realizar qualquer tipo de propaganda-- as que obtiverem a autorização do governo.

Médicos e especialistas ouvidos pela reportagem veem com preocupação a onipresença de propagandas de apostas nas TVs e redes sociais, com risco de aumento de casos de vício em jogos e de atração de menores.

O Programa Ambulatorial do Jogo Patológico do Instituto de Psiquiatria da USP (Universidade de São Paulo) tem recebido um público cada vez mais jovem em busca de tratamento. O perfil também mudou, com maior predominância de viciados em jogos online pelo celular.

Hermano Tavares, coordenador do programa, diz que há um risco de "epidemia de um transtorno psiquiátrico", o que é facilitado pela quantidade de anúncios e pelas facilidades para jogar. "Agora, o acesso é para todo o mundo que tem celular. E praticamente toda a população tem celular."

Em um instante de definição e regulamentação do mercado, o investimento das casas de aposta em publicidade e propaganda só cresce.

"Todas as casas querem chegar fortes nesse momento e com bases de usuários relevantes que possam depois ser trabalhadas. Isso explica a corrida pelas propriedades e valores sem precedentes", observa Ivan Martinho, professor de marketing esportivo pela ESPM.

Há quem questione, no entanto, o crescimento das cifras pagas pelas empresas e interprete o patamar atingido agora como um pico.

"Com a regulamentação, vão ser menos anunciantes de apostas no mercado, porque nem todos [que hoje atuam] vão comprar a licença", afirma Udo Seckelmann, do escritório Bichara e Motta Advogados. Ele acompanha o tema de perto desde 2019.

Na sua visão, a lei aprovada é a melhor versão do texto desde que ele entrou em debate no Brasil, há cerca de cinco anos. Ele projeta que agora o mercado deve se consolidar, mas pode também enxugar.

"No mercado regulado, talvez o valor para investimento em marketing seja mais enxuto. Talvez tenha uma estagnação ou redução dos valores exorbitantes de publicidade, até porque vai haver um regulador travando publicidade não regulamentada", completa.

CEO da Esporte da Sortes, Darwin Henrique da Silva Filho, empresa que atualmente patrocina três times da Série A, concorda em parte. Diz que, em um primeiro momento, a regulamentação deve impulsionar ainda mais os investimentos.

"Contudo, a maturidade de mercado fará a alocação de recursos ficar, a médio e longo prazo, mais eficiente e otimizada. Nessa conjuntura, enxergo que a valoração dessas mídias deve vir a decrescer em alguns anos", aposta.

Atualmente, as casas de apostas patrocinam não só os clubes mas também alguns dos maiores campeonatos do país, como a Copa do Brasil, que estampa a marca Betano.

Para Martinho, a tendência é que os investimentos também passem a se diversificar, em busca de novos públicos. "Além de esportes, nota-se que casas de apostas buscam a atenção do consumidor associando-se a criadores de conteúdo de grande engajamento, eventos de entretenimento como o Carnaval, além de mídia convencional", diz.

"Nesse aspecto, entende-se que o potencial apostador, além de esporte, também consome outros tipos de conteúdo. Logo, se não posso me comunicar com tal cliente através do seu time ou esporte do coração que talvez já esteja ocupado pelo concorrente, posso alcançá-lo por meio de outras propriedades que ele também consome."

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