Cotidiano
O isolamento e a prática de casamentos consanguíneos contribuíram para a disseminação de uma condição hereditária rara que impede a produção do hormônio do crescimento
Reportagens e documentários nacionais e internacionais, como o da CNN em 1993, contribuíram para projetar a cidade no mapa mundial / Reprodução/Youtube
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Com uma concentração singular de pessoas com nanismo, Itabaianinha, no interior de Sergipe, se tornou um símbolo de resiliência, identidade e superação. Conhecida mundialmente como a “Cidade dos Anões”, a cidade carrega uma história moldada por fatores genéticos, isolamento geográfico e força comunitária.
O ponto de partida dessa história está no povoado de Carretéis, zona rural de Itabaianinha. Ali, o isolamento e a prática de casamentos consanguíneos contribuíram para a disseminação da Deficiência Isolada do Hormônio do Crescimento (DIGH), uma condição hereditária rara causada por uma mutação que impede a produção do hormônio do crescimento.
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Ao contrário de outros tipos de nanismo, a DIGH resulta em estatura baixa com proporções corporais normais, geralmente entre 105 e 135 cm de altura.
Estudos apontam que a incidência da condição em Carretéis chegou a 1 em cada 32 habitantes, um número muito acima da média mundial.
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Ao longo de oito gerações, estima-se que mais de 130 pessoas tenham sido afetadas, tornando Itabaianinha um caso único na medicina e na demografia.
A singularidade genética e o modo de vida da população com nanismo chamaram atenção da mídia nas décadas de 1980 e 1990. Reportagens e documentários nacionais e internacionais, como o da CNN em 1993, contribuíram para projetar a cidade no mapa mundial.
O italiano Marco Sanvoisin, que visitou Itabaianinha, descreveu seus habitantes como “criaturas doces e diferentes, que parecem ter saído de um livro de fadas”. A fama também se refletiu na cultura popular, como na música “Sou de Itabaianinha”, da banda sergipana Siri Mania, que homenageia com orgulho os moradores da cidade.
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Apesar dos desafios, os moradores com nanismo sempre buscaram uma vida ativa e independente. Muitos atuam como professores, artesãos, feirantes e até competiram em eventos esportivos internacionais.
Um dos símbolos dessa superação é Dona Pureza, a primeira mulher com nanismo da cidade a se casar com um homem de estatura média. “Eu queria ter uma família, e graças a Deus consegui”, contou, em depoimento emocionado.
Nos últimos anos, porém, a “Cidade dos Anões” tem passado por transformações. O avanço de tratamentos com hormônio do crescimento, aliado a políticas de saúde, migração e mudanças culturais, reduziu significativamente o número de novos casos de nanismo.
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Crianças que antes herdariam a condição agora crescem com estatura dentro da média, graças ao diagnóstico precoce e ao acesso a terapias. A identidade visual da cidade muda, mas seu legado permanece.
Para evitar que a história dos “pequenos grandes cidadãos” de Itabaianinha se perca com o tempo, iniciativas têm surgido para preservar essa herança. Entre elas, o projeto de lei nº 02/2020, de autoria da vereadora Lêda Maria Dantas, busca reconhecer oficialmente a importância cultural e histórica da comunidade com nanismo. A monografia do pesquisador Cleiton dos Santos também contribui com uma análise profunda do tema.
“O passado precisa ser salvo para servir ao presente e ao futuro”, ressalta o estudo, citando o historiador Jacques Le Goff.
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Mesmo com o reconhecimento, moradores com nanismo ainda enfrentam barreiras. A falta de inclusão no mercado de trabalho, a acessibilidade precária em espaços públicos e a falta de políticas específicas seguem como entraves para uma vida plena.
“Nós deveríamos ser mais lembrados pelas autoridades, principalmente quando se trata de emprego”, afirma Clécio, morador da cidade.
A trajetória de Itabaianinha é inseparável da história de seus moradores com nanismo, que levaram o nome da cidade para o mundo, desafiando estigmas com coragem e dignidade. Mesmo com as transformações demográficas, o legado permanece, com um testemunho vivo de que grandeza não se mede em centímetros, mas em histórias de superação.
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Com uma concentração singular de pessoas com nanismo, Itabaianinha, no interior de Sergipe, se tornou um símbolo de resiliência, identidade e superação. Conhecida mundialmente como a “Cidade dos Anões”, a cidade carrega uma história moldada por fatores genéticos, isolamento geográfico e força comunitária.