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Cotidiano

Baixada Santista é palco de crianças ‘invisíveis’

O Diário do Litoral percorreu a região e descobriu um número crescente de locais e de crianças utilizando semáforos, estacionamentos públicos e entorno de supermercados em busca de alguns trocados e comida.

Carlos Ratton

Publicado em 07/01/2018 às 14:12

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É normal percorrer as ruas de toda a Baixada Santista e encontrar crianças nos semáforos. / Rodrigo Montaldi

Elas se mantém ‘invisíveis’ durante o ano inteiro, exceto no mês de dezembro quando o coração das pessoas está mais sensível por conta dos festejos de final de ano. Recentemente, o Diário do Litoral percorreu a região e descobriu um número crescente de locais e de crianças utilizando semáforos, estacionamentos públicos e entorno de supermercados em busca de alguns trocados e comida.

Em novembro do ano passado, a Escola do Legislativo de Guarujá, abrigou o I Encontro de Conselheiros Tutelares da Baixada Santista e do Litoral Norte. A Reportagem conversou com duas conselheiras e descobriu que a situação de rua é atrativa para a maioria dos meninos e meninas e ocorre por conta da junção de dois fatores: falta de estrutura familiar e de políticas públicas dos governos municipais.

A conselheira Michele de Sales e Silva Oliveira, que trabalha em Guarujá, disse que os conselheiros possuem um grupo no whatsapp para trocar informações. Todos, segundo ela, são unânimes em afirmar “É preciso atendimento adequado para as crianças e para suas famílias em estado de vulnerabilidade social. A maioria das prefeituras não possui equipamentos públicos adequados, principalmente nos bairros mais carentes, para receber as crianças, desenvolver atividades e proporcionar atendimento psicológico”, disse, alertando que é preciso aproximação do poder público com a famílias das crianças para descobrir como evitar que o semáforo seja mais atraente do que o lar.

“Falta tudo. Carros, recursos humanos e financeiros, formação continuada. O papel do conselheiro é cobrar estrutura. A abordagem tem que ser feita pelos operadores sociais das prefeituras, treinados e capacitados para assistir as crianças”, explica Michelle, enfatizando que muitas crianças ocupam as ruas por conta de pai e mãe desempregados, doentes ou com problemas psiquiátricos. Há também mães que ficam fora de casa em função do trabalho o dia inteiro e só voltam à noite, o que faz as crianças buscarem nas ruas o reforço econômico familiar.

A conselheira revela que, geralmente, as crianças escolhem os grandes centros comerciais para ficar. Uma criança chega a arrecadar R$ 100,00 por dia. “O maior problema é que as pessoas, por pena, dão dinheiro. As prefeituras precisam também fazer uma grande campanha de conscientização. Ainda tem crianças que chegam na Baixada por conta própria ou trazidas por caminhoneiros”, alerta, ratificando a ‘invisibilidade’ das crianças aos olhos da maioria da população. “As pessoas só as enxergam no final do ano”.

Outra conselheira tutelar consultada foi a responsável pela área central de Santos, Idalina Galdino Xavier (foto). Ela caracteriza a situação como trabalho infantil. “Os meninos que estão no trabalho infantil acabam na Fundação Casa porque a cidade não oferece alternativas. Os operadores sociais só abordam, pegam os dados, mas não têm nada concreto pra oferecer. Então, a rua se torna a única opção”, destaca, completando: “Santos não possui acolhimentos individualizados. Crianças, adolescentes em situação de risco e infratores ocupam o mesmo espaço. Programas ou políticas públicas para inserir adolescentes em situação de risco, alta vulnerabilidade ou trabalho infantil (malabares, exploração sexual) não existem. Muitos adolescentes ficam nas esquinas e nas biqueiras (pontos de venda de drogas) para ganhar dinheiro”, desabafa.

O que as prefeituras garantem oferecer

Em Guarujá, a Secretaria de Desenvolvimento e Assistente Social (Sedeas), por meio da Diretoria de Proteção Especial, informa que para o atendimento a crianças em situação de rua o serviço conta com um assistente social, um psicólogo e quatro educadores de rua, que se dividem em duas equipes, atuando das oito às 23 horas. A equipe possui um veículo para realizar o trabalho.

As crianças são encaminhadas para o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), que funciona das oito às 17 horas, de segunda à sexta-feira, e outras três casas de Acolhimento que funcionam 24 horas. No Creas, as crianças participam de oficinas lúdicas, recreação, reuniões, palestras e passeios monitorados. Já as famílias são encaminhadas para os programas sociais, onde participam de palestras voltadas para o fortalecimento de vínculos.

Santos

A Secretaria de Assistência Social de Santos confirma que não existe serviço de recolhimento de crianças ou adolescentes e que “a maioria maciça de crianças e adolescentes encontrados e identificados em situação de trabalho infantil nas ruas e logradouros públicos é oriunda de outros municípios da região, com destaque para os de São Vicente e de Guarujá”, garante o governo santista, que explica que toda e qualquer ação prevê apenas o serviço especializado de abordagem social.

No município, o referido serviço é composto mais de 30 profissionais, entre psicólogos, assistentes sociais e outros técnicos, que atuam de quarta-feira a domingo. Nos dias em que o serviço não é realizado por esta equipe, as demandas são atendidas pelas equipes de abordagem social da própria Secretaria, preenchendo, portanto, todos os dias da semana.

Bertioga

A Prefeitura de Bertioga, por meio da Secretaria de Desenvolvimento Social, Trabalho e Renda informa, que no Município não acontece esse tipo de ocorrência. Eventualmente quando acontecem essas situações, a prefeitura aciona o Conselho Tutelar, que leva a criança para Creas do Município, para que seja feita a investigação e os devidos encaminhamentos. Por isso, a cidade não possui equipe específica para combater a situação que, quando detectada, referem-se a crianças de outras cidades.

Itanhaém

Em Itanhaém, o Centro POP é o serviço da Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social que tem como objetivo realizar acompanhamento especializado para pessoas nesta situação. Atualmente, conta com uma equipe de Abordagem Social de Rua, composta por assistente social, psicóloga, assistentes e educadores sociais. O serviço atende de segunda a sexta-feira, das 8 às 17 horas, localizado atualmente na Rua Cunha Poran, 342, Nova Itanhaém. O telefone para contato é o (13) 3427-2082. A equipe atua de segunda a sábado e também aos domingos e feriados. A equipe de abordagem aciona o Conselho Tutelar, que faz a busca de familiares, que são encaminhados ao Creas ou Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV).

Mongaguá

Em Mongaguá, segundo a Prefeitura, dada a inexistência de semáforos no Município, não há registros do problema. No entanto, a Cidade possui o Cras de Agenor de Campos e Vila Atlântica e Creas do Centro, que funcionam em horário comercial, de segunda a sexta feira. A Diretoria de Assistência Social, gestora dos setores, dispõe de uma frota de veículos que atende as demandas.

São Vicente

A Secretaria de Assistência Social (Seas) de São Vicente informa que o serviço de abordagem social com crianças e adolescentes é realizado através do Instituto Camará Calunga, que executa suas atividades de segunda a sexta-feira, até as 23 horas. Além da equipe que realiza a abordagem nas ruas de forma direta, a Prefeitura atende essa demanda através dos Creas. Todos os dados levantados pelo serviço de abordagem são analisados e as famílias relacionadas passam a ser atendidas sistematicamente por psicólogos e assistentes sociais.

O Município também desenvolve, em parceria com o Governo Estadual e Federal, o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI). Este programa, por sua vez, conta com uma equipe técnica que atua de forma exclusiva junto às famílias que são identificadas com situações de trabalho infantil. Através do PETI são desenvolvidas diversas ações governamentais para retirar as crianças e os adolescentes do trabalho informal.

Cubatão

Segundo a Secretaria de Assistência Social, a Prefeitura conta com uma unidade de acolhimento com capacidade para atender a 24 crianças e adolescentes no total. A equipe é composta por 15 pessoas, que se revezam em turnos de 12 por 36 horas. Ou seja, o atendimento é ininterrupto. Da equipe, fazem parte cuidadores, psicólogos e assistentes sociais. Há atividades de lazer e lúdicas com crianças e adolescentes. Na casa, existem brinquedos e sala de jogos. Utilizam também a estrutura pública, como quadras, para prática de esportes. Um veículo específico é utilizado para o trabalho de recolhimento e visita a famílias.

Peruíbe

A Prefeitura não faz nenhum tipo de recolhimento de crianças que se encontram em situação de rua. É acionado o Conselho Tutelar que providencia o recambio ao município de origem ou encaminhar para um serviço de acolhimento. A equipe responsável pelo atendimento a esta demanda é a do Creas, composta por psicólogo e assistente social. As atividades variam entre reintegração familiar, inserção escolar, atendimento psicopedagógico, atendimento médico e outros. No caso das crianças e adolescentes que passam pelo acolhimento, é feito um trabalho de resgate dos vínculos familiares. Através de atendimentos individualizados e em grupo.

Praia Grande

O Serviço Especializado em Abordagem Social é ofertado pelo Município e constitui-se em processo de trabalho planejado de aproximação, escuta qualificada e construção de vínculo de confiança com pessoas e famílias em situação de risco pessoal e social nos espaços públicos para atender, acompanhar e mediar acesso à rede de proteção social. Nos períodos fora do horário de trabalho, o conselho tutelar procura identificar a criança ou adolescente, aciona a família e encaminha o grupo familiar para trabalho social no Creas, onde a família recebe atendimento pela equipe de Serviço de Proteção Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (PAEFI), composta de assistente social e psicólogo. Após estudo social, a criança é encaminhada para os serviços socioassistenciais e programas e projetos nas áreas social, cultural e educacional. O Serviço atua de segunda a sexta-feira nos períodos da manhã e da tarde (oito às 17 horas) e a equipe possui um veículo.

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